73 - RUA. EXTERIOR. NOITE.
Eduardo e Helena caminham pela rua, atrás da igreja do Senhor Bom Jesus. Eduardo usa a mesma roupa da seqüência 70.
HELENA
- Eduardo...
EDUARDO (Como se pensasse em voz alta)
- Se, ao menos, você fosse quem eu penso...
HELENA
- Deixa que eu seja.
EDUARDO (Continuando, mesmo tom)
- Mas você não é.
HELENA
- Como você sabe que eu não sou? Se você quiser, eu serei.
EDUARDO (Mesmo tom)
- Se eu quiser. (Com força.) E se eu quiser?! O que é que...
HELENA (Cortando)
- Se você quiser tudo mudará.
EDUARDO (Amargo)
- Mudará mesmo?
HELENA
- Mudará. Você (frisa a palavra você) mudará tudo.
Eduardo olha Helena, espantado.
HELENA (Suave, mas incisiva)
- Se eu mudasse, Eduardo, nada mudaria.
Eduardo pára e abraça Helena.
EDUARDO
- Eu te quero, Helena! Eu te quero!
Helena ri e solta-se, e continuam caminhando, Helena um pouco à frente. Eduardo pára e acende um cigarro. Passam Prisciliana e Geralda. Ao verem Eduardo parado, olham-no, desconfiadas, e andam mais depressa. E não parecem ver Helena.
HELENA
- Você diz que me quer...
EDUARDO (Aproximando-se, incisivo)
- Eu quero!
Helena pára, como a exigir uma definição.
HELENA
- Você diz que me quer, mas ainda diz que não sabe quem eu sou.
Estão na lateral da igreja. Eduardo pega na mão de Helena.
EDUARDO
- E se eu não quiser mais saber?
Helena não responde. Pega o cigarro de Eduardo e puxa uma tragada profunda. Solta o fumo devagar, como se estivesse analisando a atitude que vai tomar, joga o cigarro no chão e abraça Eduardo. Eduardo beija-a e Helena corresponde.
HELENA
- Agora, você sabe quem eu sou?
EDUARDO (Convicto)
- Agora, eu sei!
Abraçados, começam andando em direção ao Adro dos Profetas.
74 - ARREDORES DA CIDADE. EXTERIOR. NOITE.
Bosco está sentado junto de uma cachoeira. Ruídos noturnos característicos.
VOZ DE BOSCO
- Esta é a fórmula. As palavras são o que seriam, se fossem. Esta é a experiência. Quanto mais o universo aumentar, mais a minha imagem diminui.
Fábio aproxima-se. Bosco não percebe.
FÁBIO
- Eu sabia que você tava aqui. Mamãe disse...
Bosco olha Fábio em silêncio. Fábio senta-se ao lado dele.
FÁBIO
- Mamãe tá preocupada, Bosco. Tá mesmo. Diz que papai....
Bosco fecha os olhos.
VOZ DE BOSCO
- Será que Deus usa óculos ou lentes de contato?
FÁBIO
- Desse jeito, você não tem mais jeito, não, meu irmão.
Bosco continua de olhos fechados.
VOZ DE BOSCO
- Um conselho a todos. Cuidado, se pensar Deus escuta. Usa binóculos!
Fábio tira um baseado do bolso e acende-o. Dá uma lapada e passa-o a Bosco.
FÁBIO
- Por quê que você não faz uma força e dá um jeito, hem?
Num gesto brusco, Bosco levanta-se e sai correndo.
VOZ DE BOSCO (Como se fosse um eco)
- E alguém pergunta se eu quero?
75 - COLONIAL HOTEL. CORREDOR. INTERIOR. NOITE.
Joyce, uma das modelos da equipe fotográfica, bate na porta do apartamento de Maria Germana. Ninguém atende e ela continua batendo. Maria Germana aparece na porta do quarto de Ulysses.
MARIA GERMANA (Com espanto)
- Joyce?!
Joyce volta-se, rápida, e olha Maria Germana, espantada.
JOYCE
- Maria Germana?!
MARIA GERMANA
- Chiu! O que foi?
JOYCE
- Convidaram todo mundo pra uma festa.
MARIA GERMANA
- Festa? Quem convidou?
JOYCE
- Não sei. Você vai?
MARIA GERMANA
- Espera.
Maria Germana entra no quarto de Ulysses e volta logo depois, sorrindo
MARIA GERMANA
- Vou, sim. Você sabe onde é?
JOYCE
- Tem um pessoal aí que sabe.
Maria Germana abre a porta do apartamento dela e empurra a Joyce para dentro.
MARIA GERMANA
- Me espera aí.
76 - CASA COLONIAL. EXTERIOR. NOITE.
Panorâmica da casa. Nas janelas iluminadas perpassam, rapidamente, vultos femininos e masculinos. Junto do portão, carros estacionados. Ruídos noturnos característicos.
77 - CASA COLONIAL. SALA PRINCIPAL. INTERIOR. NOITE.
Diversas portas e janelas. Móveis e decoração coloniais. A festa já começou. Todo mundo bebendo, dançando, se agarrando. Maria Germana entra, acompanhada de Ulysses e de Joyce. Joyce, imediatamente, se junta a um grupo e se integra no ambiente. Corta para Ulysses e Maria Germana. Vê-se que Ulysses não se sente à vontade.
ULYSSES
- Você...
Maria Germana nota o embaraço de Ulysses e ri.
MARIA GERMANA
- Meu ex-marido odiava.
ULYSSES
- Eu também não...
MARIA GERMANA (Cortando, ainda rindo)
- Pois eu adoro!
Maria Germana afasta-se e integra-se, também, no ambiente. Ulysses fica parado, olhando para ela, num misto de constrangimento e de carência.
78 - RUA. EXTERIOR. NOITE.
Um carro pára atrás do corcel de Carioca e Preto, em frente ao Bar do Campo. Chicão sai, assobiando um samba de breque conhecido. Observa o carro velho, curioso, ao notar a placa do Rio de Janeiro. Mas não dá maior atenção e, sempre assobiando, entra no bar.
79 - CASA DE BOSCO. SALA. INTERIOR. NOITE.
Geralda está sentada e tem um rosário na mão. Mas não parece rezar. A porta abre e Fábio entra, puxando Bosco pela mão.
FÁBIO
- Mamãe...
Geralda levanta-se e abraça Bosco.
GERALDA
- Bosco!
FÁBIO
- Ele já tá bem, mamãe.
GERALDA
- Graças a Deus!
Geralda puxa uma cadeira e ajuda Bosco a sentar-se.
FÁBIO (Hesitante)
- Mamãe, eu...
Geralda não escuta e Fábio sai.
GERALDA
- Meu filho, você não pode fazer mais isso. Se continuar assim, seu pai...
VOZ DE BOSCO
- Meu pai morreu!
Bosco começa chorando, convulsivamente. |