41 - BAR DO CAMPO. INTERIOR. DIA.
Carioca e Preto continuam jogando sinuca. O bar já tem algumas mesas ocupadas. Os dois bêbados continuam junto do balcão.
BÊBADO 1
- Seu Jofre, bota mais uma.
Jofre, junto da caixa, faz de conta que não escuta.
BÊBADO 2
- Seu Jofre...
Corta para Carioca e Preto. Preto pára de jogar.
PRETO
- Ô! Num tá escutando, não?
CARIOCA
- Ô...
PRETO
- Ô, o cacete! (Gritando.) Atende a porra do freguês!
Corta para Jofre e os dois bêbados. Jofre enche os copos. O Bêbado 1 aproxima-se da mesa de sinuca com o copo na mão.
BÊBADO 1
- Brigado, viu, patrão?
Corta para Carioca e Preto. Bêbado 1 aproxima-se, pára junto de Preto e olha-o com atenção.
BÊBADO 1
- Eu lhe conheço?
PRETO
- Conhece, o quê, porra?!
CARIOCA (Ao Bêbado 1)
- Ô...
BÊBADO 1 (A Preto)
- Eu vou lá prás terras do Satanás...
Preto puxa o revólver e mete o cano na boca do Bêbado 1.
PRETO
- E vai, mesmo, caralho!
CARIOCA
- Ô, Preto, porra!
Preto guarda o revólver e Carioca dá um empurrão no Bêbado 1.
CARIOCA
- Vai! Vai!
O Bêbado 1 olha Preto com raiva e afasta-se, resmungando.
BÊBADO 1
- Satanás! Satanás!
VOZ DE SILVIANO
- Jofre, traz duas. Bem geladas!
Corta para Ulysses, Marcos e Silviano, sentados junto da porta. Ulysses acende um cigarro. Puxa uma tragada profunda e sopra o fumo com força. Marcos ri.
MARCOS
- Mas quer dizer que você largou aquele marzão todo e se mandou pra Congonhas, assim à toa, à toa?
Ulysses olha Marcos durante alguns instantes e encolhe os ombros.
ULYSSES
- É...
MARCOS
- E você teve coragem de largar aquelas cariocas bundudas, assim sem mais nem menos? Ah, Ulysses, tenha dó! (A Silviano.) Eu, se fosse ele, se tivesse aporrinhado, sabe o quê que eu fazia?
SILVIANO
- Chupava cana.
Jofre traz as cervejas, enche os copos e vai servir outra mesa.
MARCOS
- Ah, prá merda! Pegava três ou quatro daquelas, bem bundudas, sabe como?, e, ó, me trancava num hotel, num puta quarto, e jogava a chave na privada.
SILVIANO
- Isso, você, que só vê bundas na sua frente.
Ulysses bebe um gole, devagar, olhando a pracinha.
MARCOS
- E você, não?
SILVIANO
- Eu?
MARCOS
- Você não, porque a tua mulher te traz aqui, ó, pelo cabresto!
Silviano ri e levanta um braço. Jofre aproxima-se da mesa.
JOFRE
- Torresminho, Dr. Silviano?
Silviano acena com a cabeça e Jofre vai apanhar o torresmo, atrás do balcão
VOZ DE PRETO (Gritando)
- Ô!
Corta para Carioca e Preto. Preto aponta a garrafa de cerveja, na mesa ao lado do bilhar.
PRETO
- Ó.
Corta para Jofre. Jofre larga o prato do torresmo em cima do balcão e corre para pegar uma garrafa de cerveja.
VOZ DE MARCOS
- Volta quando?
Corta para Ulysses, Marcos e Silviano.
MARCOS
- Ulysses...
Ulysses não responde. Apenas encolhe os ombros. Neste momento, Darcília, acompanhada de dois filhos, passa do outro lado da rua. Marcos e Silviano não reparam, ainda olhando para Ulysses. Ulysses segue Darcília com os olhos e, quando deixa de a ver, levanta-se.
MARCOS
- Quê que foi, sô?! Deu formiga no seu rabo?
ULYSSES
- Vou dar uma volta.
MARCOS
- Mas quê que...
ULYSSES (Cortando)
- A gente se vê depois. Tchau.
Ulysses sai.
MARCOS
- Quê que deu nele, hem?
SILVIANO
- E eu sei?!
MARCOS
- Não tá esquisito, não?
Silviano não responde. Encolhe os ombros, pega o copo e bebe dois goles, devagar.
MARCOS (Fazendo o gesto característico)
- Ulysses só pode tar é, ó!
42 - LARGO DOS PASSOS DA VIA-SACRA. EXTERIOR. DIA.
Ulysses sobe o largo, cabisbaixo. Como se nada existisse à sua volta e ele nada encontrasse dentro de si mesmo. A câmera explora, com detalhes, a angústia estampada no seu rosto e nos seus gestos.
43 - ADRO DOS PROFETAS. EXTERIOR. DIA.
Ulysses entra no adro. Anda devagar e pára junto da estátua do Profeta Habacuc, sem perceber Antônio, sentado ao pé da estátua do Profeta Jonas. Ulysses debruça-se na mureta e fica imóvel, o olhar perdido no infinito. Antônio olha Ulysses durante alguns instantes e, depois, aproxima-se, sorridente.
ANTÔNIO
- Ora, veja só quem...
Ulysses, absorto, não responde.
ANTÔNIO
- Quer dizer que...
Ulysses continua imóvel, sem responder.
ANTÔNIO (Com força)
- O amigo não...
Ulysses permanece na mesma posição, como se não percebesse a presença de Antônio. Antônio olha Ulysses durante algum tempo, como que pensando no que deverá fazer, e, de repente, afasta-se, com passos bruscos.
ANTÔNIO
- Ora, onde já se viu! Não conhecer os amigos! |