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Helena Langrouva
JOSÉ AFONSO

JOSÉ AFONSO E A POESIA POPULAR PORTUGUESA CANTADA BREVE SÍNTESE TEMÁTICA
De 1964 a 1977

Introdução
O canto popular aprendido com o povo
Cantos de trabalho
Os cantos de festa
A poesia cantada de José Afonso
A mulher do povo
As heroínas populares
A VIDA QUOTIDIANA
A emigração
As conversas no campo
A vida quotidiana na cidade
Elegia e tomada de consciência de Portugal nos anos 60
A morte, a violência e a injustiça
A agonia, as trevas, a indiferença
A nostalgia, a ignorância de si próprio e a anquilose
A procura de libertação
A procura de intrepidez, de verdade, de não-violência
Os símbolos de purificação: a madrugada, a água, a brisa, o vento e o fogo: “Canto Moço”
O lugar santo (“locus sanctus”) da luz e da paz: “Tecto do mendigo”
E todo o resto que é imenso
BIBLIOGRAFIA - DISCOGRAFIA

A mulher do povo

José Afonso criou poemas cantados com a mais elevada expressão do seu lirismo que vivificam a mulher do povo e prestam homenagem às heroínas populares.

O poema “Maria” exprime a mulher na sua união com a terra. Maria é um ser que nasceu e vive na terra, conservando a frescura e espontaneidade que desperta no sujeito lírico o desejo de se unir à terra onde Maria foi criada. Este poema retoma não só a tradição milenar de união com a terra Mãe, através da beleza da mulher e do amor, mas também a tradição portuguesa, alentejana do amor à terra

Maria

nascida no monte

à beira da estrada

Maria

Bebida na fonte

Nas ervas criada…

 

Maria

Nascida no trevo

Criada no trigo

Quem me dera

Maria que o trevo

Casara comigo

As metáforas relativas à beleza de Maria têm ainda a ver com a paz, a pobreza, a cultura mediterrânica- “flor de tangerina”, “beiral do mendigo”.

“Cantiga do Monte” (Traz outro amigo também), um dos mais belos poemas cantados de José Afonso, escrito em quadras, exprime a beleza da mulher identificada com a beleza da natureza, numa sequência de metáforas que aglutinam o essencial da mais pura expressão lírica erudita e popular da beleza feminina, não esquecendo o uso de palavras de origem medieval (“louçã”, “o seu folgar”)

Fragrância morena

Portal de marfim

Ondina açucena

chamando por mim

Cada verso desta canção é uma síntese perfeita de beleza e força telúrica onde o poder incantatório e erotizante do canto da jovem se torna num elo de união entre a terra e o mar:

Ó rosto da terra

E abismo do mar

Ouvide o seu canto

De longe a arfar

Poderíamos dizer que José Afonso é o grande mestre da expressão desta união perfeita de elementos literários populares e eruditos, do poder incantatório da palavra unida à música e comunicada pela sua voz que parece brotar do interior da terra ou do mar e abrir-se para o infinito.