Como José Afonso, até 1977, escreveu poucos poemas sobre a cidade, escolheu o poema “Cidade” de Ary dos Santos, sobre a asfixia da vida na cidade e que é também uma alegoria de Portugal dos anos 60-70.
José Afonso canta sobretudo a mulher na cidade, nos bairros populares de Lisboa e de Lourenço Marques.
Em “As noivas de bilros” ( texto não musicado, Textos e Canções, pp. 158-159) apresenta com muito humor todo o trabalho artesanal de preparação para a festa de casamento, na manhã de Santo António, na Sé de Lisboa, para onde as noivas irão de burro.
“Vai, Maria, vai” (Contos Velhos Rumos Novos) mostra o reverso da escravatura em Moçambique, pois há uma criada que recusa fazer todo o trabalho para um patroa que não quer fazer nenhum trabalho, tentando em vão obrigar a criada a fazer tudo.
O tema da prostituição é desenvolvido, conciliando algo da estética neo-realista com a própria estética da palavra e da música de José Afonso, no poema “Avenida de Angola” (Traz outro amigo também) e num passo de “No Lago do Breu”. José Afonso mostra as contradições desta forma de vida, sem a julgar nem a desprezar.
Em “Avenida de Angola”, a impersonalidade das “meninas feitas da mesma maneira” contrasta com a escolha de nomes –“Ana, Serafina e Mariana mais pura”. O drama da possível perdição espiritual das prostitutas – “meninas perdidas” – opõe à possível inocência que lembra o tratamento que Fellini deu à protagonista de “Noites de Cabíria”. José Afonso metaforiza as prostitutas em “pombas” e “columbinas”, pela sua deambulação e por uma certa pureza de intenções que nelas possa existir.
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