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Participamos. O que é o mesmo que dizer que comungamos na destruição. A comunhão cristã é menos a assimilação de um corpo do que a assimilação destrutiva que implica todo o acto de comer.
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O cerebro é apenas um mediador de impasses que se passam nos arredores perceptivos. Somos manipulados, não pelo ambiente, mas por eminentes emergências e tangenciais abortos.
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Classificamos para nos desclassificarmos.
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O sexo é uma coisa ritmica. Não há ritmos novos. A poliritmia é constante na natureza. A vibração neuronal deriva de outras vibrações. As microndas estendem-se como teias ritmicas sobre o universo.
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Parece que não há objectivos, mas trata-se de uma deliberada liberalidade. O homem extrai um certo prazer na desvalorização das suas competências e da sua personalidade. As pessoas existem porque a cada momento desistem. Se não tivermos mais nada sempre temos por companhia a ilusão.
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Os impulsos neuronais são uma incarnação brejeira da intoxicação amorosa. Todos os actos são variantes do prazer ou das suas formas mais degradadas. Todo a programação é uma consequência do caracter percursivo e repercursivo do prazer. O budismo circunscreve o prazer como ausência de prazer ou de dor. O Ser, o Absoluto, é prazer. Nós somos todos esses estereotipos.
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Do ponto de vista da ilusão não há cerebros. A quimica é uma combinatória de forças de atracção mais complexas e misteriosas. O lado duro da realidade é uma perversão do seu fluxo ligeiro. As transições entre opostos são demasiado compostas. Os acontecimentos fazem puré das nossas interpretações. Gostamos de encarar a nossa improbabilidade como uma responsabilidade e qualquer responsabilidade como o aperfeiçoamento de várias impossibilidades.
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Forjamos as nossas pastagens como uma memória que nos inclui. É o ambiente que nos interpreta ao interpretar as nossas cripticas interpretações. Somos terminais de descargas amorosas. Os astros continuam a informar-nos de acontecimentos demasiado distantes.
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Algo nos leva a acreditar que não há um ambiente, um envolvimento, mas um plural in-volvimento. As criaturas são baratas tontas. O cérebro recebe supositórios de ideias. Gosto de pensar a ideologia como um hábito supositório.
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Deus enquanto nome é um abuso de legitimação. Deus é a dissipação de todos os fundamentos e de todo o direito de nomeação. Qualquer acto em nome de qualquer Deus é uma heresia, seja em que religião for.
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