21
A comunicação é a permeabilidade das mensagens. Sabemos que existem corpos porque há permeabilidade ou resistência. A informação não processa as diferenças senão nos corpos. São os corpos que fazem e sexualizam as diferenças. A informação é assexuada.
22
A consciência organiza estéticamente o que lhe foi comunicado. A organização é já uma interpretação. A recepção, mesmo a mais ingénua, é uma estratégia decorativa. A guerra é ornamento.
23
O desejo de inventar, de ser creativo, não é um apetite humano, mas uma ansiedade latente na natureza. O homem é um instrumento lúbrico dessa propensão criativa.
24
O homem é no mínimo tricéfalo. Transformou a morte num acto de crédito. Os deuses são próteses burocráticas que garantem tais transações. A burocracia nasceu com o culto dos mortos.
25
O homem encena a sua autodestruição, assim como a da sua história, no culto da abstracção. A abstracção é o fetichismo da vacuídade: o mais puro inorgânico.
26
A simultaneidade de causas não evita determinadas propensões. A regularidade dá-nos a sensação de que somos prisioneiros de leis a que o bom senso aconselha. As irregularidades são menos perceptíveis porque não as queremos ver.
27
A insanidade é a irregularidade que não se ajusta à higiene do presente.
28
A insensibilidade é o limite da consciência, a sensibilidade o seu centro. A loucura é a transgressão do limite. A insensiblidade sublima e oculta a loucura.
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Penso para fingir que sou. Não sei bem se sou. Há uma intermitência que não é bem experiência. A consciência vagueia na selva neurológica.
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A mente é uma armadilha. Os neurónios vão à caça. Conseguimos discernir alguma coisa, mas mesmo embriegados não somos lúcidos. A lucidez é um limbo – fica à porta de uma realidade que não existe. Não existe nem a realidade, nem as interpretações (cinzas de interfaces), nem sequer fábulas.
30
As abstracções ainda são mais não-lineares do que a eventual experiência. É a linguagem comum que abre os carreiros por onde descortinamos algumas interacções. Sentimos que pode haver coisas fortes na linguagem que nos superam e a que chamamos simbolos, ou que há coisas vagas que nos levam para zonas mais abstractas e a que chamamos alegorias.
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