(S. Sebastião acena a cabeça em
sinal de censura e começa a dançar, sozinho)
D. Sebastião -
É verdade, alcancei a vitória!
Mas que vulto me iluminou,
Descido numa nuvem de almíscar
Agora dispersa nas dunas do Sara?
O rosto lhe entrevi coberto
Por um véu
Sob o olhar de carvão em brasa...
D. Sebastião (Dançando com
Yukio Mishima) -
O almíscar da tua pele embriaga…
Terás sido tu salvador e justiceiro?
O cavalo branco de ouro ajaezado
A meu lado montaste - sombra do
Encoberto ou aroma de anjo.
Porém, mais do que tu me protegia
A figura esbelta sob um véu
Que passou por nós
Deixando um rasto de flor de laranjeira...
Yukio Mishima (Dançando com
S. Sebastião) -
Rezo-te todas as noites e manhãs,
E sempre me embebedas
Com esse corpo adolescente.
Tão amorosamente Guido Reni te pintou
Que certo dia, ao ver-te em estampa,
Sem bem saber o que a mão fazia
Tive o primeiro orgasmo
Ao contemplar-te, salpicando o livro
Com a tua imagem divina…
D. Sebastião (Dançando com
S. Sebastião) -
Também eu te bebo com os olhos
Também o meu corpo te respira
De encontro ao pau de que o teu é feito.
Porém nada disto é justo, meu santo
E meu amante, que na penumbra do
Oratório abraço, sem qualquer sinal
Que da salvação nos dê uma esperança…
Fui julgado pelos tempos
Elevaram-me à epopeia a condição.
Tu, por Cristo amares como eu a ti,
Foste à morte condenado.
Deixaram-te no chão, como fera
Por setas abatida. E no entanto
Vivias, Sebastião…
O mesmo vulto que a mim salvou
A ti ressuscitou das mortais feridas.
Yukio Mishima (Dança com D.
Sebastião) -
O perfume estala-me na cara
Neste areal de colcha marroquina.
Gloriosa com um astro e justa
Como Salomão, caminhando
Sem elmo e sem escudo,
Aproxima-se a divina salvação.
Sente o seu aroma de rosa matutina!
É a hora, é a hora!
Dancemos o tango, Sebastião!
(Música de Astor Piazzola. Dançam à vez, elegantíssimos,
o tango mais sensual possível. Continuam a
dançar depois de a música ter parado). |