A aldeia é pequena, num alto soalheiro entre serras e o rio. Ladeando as casas, pinhais e terras de cultivo, misturam-se com pomares de laranjeiras e alguns jardins.
Logo em frente à casa, um carvalho enorme e secular. Nele, o dia de S. João tem um encanto especial, quando o cheiro a rosmaninho se confunde com o verde da folhagem. Lugar de secretos amores, de leituras refrescantes no pino do Verão, onde qualquer livro, terá com certeza um final feliz.
O padeiro passa bem cedo. Alice desperta com as bicadas dos pássaros na janela.
È como se não houvesse rua, lá fora.
Quando fecha a porta, caem-lhe no cabelo algumas pétalas de glicínia, que faz arco por cima da entrada.
Vai a pé para o emprego. O caminho, embora acabado de arranjar, continua adornado com silvas e flores silvestres e, algumas ovelhas espalhadas até ao ribeiro, lembram remendos em calças de gente pobre. Os campos, repletos de malmequeres, denunciam a ajuda de Deus, perante a negligência do homem.
Pelo latido dos cães, qualquer um descobrirá se Alice terá passado já o Penedo da Víbora, ou se andará ainda, perto da Poça Funda.
Quando chegar à escola, estará à sua espera uma fila de ternurentas crianças no esperado beijinho. Depois, a hora das novidades, do cãozinho que partiu a pata, do cabritinho que nasceu, do galo feito nas escadas da tia, um burburinho só aquietado, quando uma enorme bruxa com pozinhos de perlimpimpim e uma maçã envenenada aparecer, em busca da formosa Branca de Neve.
No regresso a casa, ainda o sol vai alto, Alice num pulo muda de roupa e veste a personagem de fim de tarde: amiga da terra. São conversas longas, íntimas, que vivem nela, nas árvores, nos vegetais, nas flores, na água do poço de pedra, na terra cheia de lama onde os pés se afundam, nas enxadas quando cortam um pé de hortelã junto do muro. São partilhas, debaixo da nogueira grande, que só lá está, porque dá sombra, e sem sombra as cerejas não saberiam tão bem, e a avó não lhe lembraria aquela menina que com um pente de oiro fino, seus belos cabelos penteava.
No cesto de vime forrado de tangerinas, virão à tardinha ramos de salsa, alfaces e as primeiras favas, que ainda em vagem, darão um óptimo esparregado, quase igual ao que a mãe fazia nos almoços de domingo.
A casa é pequena, tem lareira, um terraço florido e no ar uma rádio local emite música antiga.
Quando a noite cair, não se verá a Estrela, nem o Caramulo, mas um círculo enorme de estrelas com trezentos e sessenta graus de luz.
Alice anseia o fim do dia, os filhos a dormir, o sossego.
Corre para o computador.
Anda a tentar encontrar algo que a ponha feliz, num site da Internet.