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BOLETIM DO NCH
Nº 15, 2006
Dedicado a Pedro da Silveira

Peregrinação e Memória
– uma abordagem à escrita de Pedro da Silveira

José António Garcia de Chaves

INDEX

Sumário
Summary
Introdução
O fastio da ilha
O poeta e os outros
A errância e o apelo do sangue
O entrosamento regional
O mundo dos ausentes
O tempo e o longe
Lembranças vagas dos mortos
O tempo e a efemeridade
Bibliografia

O mundo dos ausentes

“Que palavras, que sangue,/ que palavra de sangue,/ que sinal de sangue,/ mesmo quase indistinto,/ me prolonga, me inscreve/ (nos marca)/ o nome, a sombra/ sobre a relva/ da Morte?” ( S ilveira , 1962: 70-71).

Por seu turno, em Corografias (s.d.), o poeta volta a sublinhar a corporeidade do poema, a sua sanguinidade. O poema é o “canto” natural do “homem”, é “sangue habitado”, “pele” e “ossos”; é acto de recusa, assunção do “impuro” porque é a mesma humanidade e possibilidade de liberdade que habita em todas as palavras que leva o poeta a aceitá-las como “sementes” e “sangue”. Pelo menos a parte inicial do livro em análise é dedicada ao destino das coisas simples, à grandeza que reside na inteireza e no mistério inalcançável das mesmas. Estamos perante uma escrita mais subentendível, diluída, menos corpórea: sombras, flores, música, beijos, memória, sangue e morte concorrem para um texto que na sua lhaneza suaviza a “secura deste dia”. A busca do “cerne” dos “ausentes”, no fundo, a temática de uma ilha que o poeta descobre na deambulação pelo mundo – ilha que se inventa e que se perpetua nos “retratos de família” ( S ilveira , s.d.: 15) – e consequentemente o tema do amor derradeiro são outros tópicos poéticos encontrados. Deparamo-nos com impressões fugazes, olhares rápidos, diáfanos, próprios de uma poesia impressiva (cf. S ilveira , s.d.: 8), evocando o ausente – “eu não sei como ele sabia, mas também amo o indecifrável” ( S ilveira , s.d.: 19) –, o compromisso com o silêncio, com o sentido do frio, do beijo e do olhar que, de forma geral, constam dessa parte inicial, em consonância com uma postura céptica e cautelosa que nos faz lembrar Ricardo Reis e a sua infelicidade resultante da espera por uma manifestação fatal – “tudo como se no tempo/ só habitasse a morte;/ deixai-me – oh sombras! –/ e cumpra-se a alma/ como uma música que/ alegrando-nos dói/ até à última gota do sangue” ( S ilveira , s.d.: 10).

 

Palavras-chave : ilha, isolamento, emigração, tempo e memória, poesia açoriana, raízes, realismo. Key-words : island, isolation, emigration, time and memory, Azorean poetry, roots, realism.

José António Garcia de Chaves – jachaves@portugalmail.pt