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*************Eugénia Vasques
O Papel do Poema «Correspondances»
no Teatro de Vanguarda dos Séculos XIX e XX

Colóquio Internacional "Baudelaire (1821-867) e as Posteridades do Moderno

INDEX

1. O Teatro de Baudelaire
2. Baudelaire e o conceito wagneriano de Gesamtkunstwerk
3. Gesamtkunstwerk e “Correspondências”
4. “Correspondências” e Sinestesias
5. “Correspondências” e As Vanguardas Teatrais

NOTAS

4. “Correspondências” e Sinestesias

Indo um pouco mais longe neste debate, a ensaísta italiana Marcella Lista, defende mesmo que os simbolistas, que designa por “geração simbolista”, terão até criado um autêntico contraponto ao conceito de Gesamtkunstwerk – ou união das artes (cf. Lista, p. 7) -- idealizado por Wagner em 1849. Esse contraponto basear-se-ia nas “correspondências” enunciadas por Baudelaire como “união dos sentidos” (p. 7) e radicaria especificamente nas sinestesias. Afirma a autora:

“[se] os sentidos correspondem uns aos outros na caixa de ressonância que é a experiência sensorial humana, cada arte, por si mesma, pode fazer apelo a esse diálogo interno da sensibilidade, a fim de despertar a humanidade integral das origens. Esta concepção é secundada e alimentada, na época do simbolismo, pela «descoberta» científica das sinestesias.” (p. 11; tradução minha).

Com efeito, o fenómeno das sinestesias, identificado pela ocorrência frequente de uma “audição colorida”, foi, realmente, muito estudado e explicado pela medicina do século XIX (10), inclusivamente como qualquer coisa com origem numa forma unitária da percepção sensível em latência no ser humano (cf. Lista, pp. 11-12). A sua popularidade nas artes experimentais (e nos movimentos ocultistas) é enorme como o comprovam os poetas Baudelaire, Rimbaud ou Hoffmann. Porém, o crescente positivismo científico dos finais do século XIX mostrar-se-à avesso a tais especulações “místicas”, o que não impediu que artistas simbolistas das gerações finisseculares, pertencentes a uma elite «à côtê», explorassem experiências cénicas com vista à contestação do realismo-naturalista com as armas do inefável.

Um dos casos mais conhecidos é o do muito jovem (dezoito anos) director de teatro Paul Fort que, no Théâtre d’Art (1891-1893), em Paris, faz uma das primeiras tentativa sistemáticas de sinestesia cénica. Sob a influência literal das “Correspondências” de Baudelaire, apresentou um espectáculo cinestésico criado a partir do Cântico dos Cânticos de Salomão, em forma de «Symphonie d’amour spirituel en huit devises mystiques et trois paraphrases, musiques de Flamen de Labrély» (Dusigne, p. 43). O espectáculo estruturava-se em torno de quatro elementos: palavra, música, cor e perfume. Os projectores de luz mudavam de cor a cada cena, tentando acompanhar o ritmo das paixões. Dos camarotes superiores, maquinistas de cena lançavam água-de-colónia perfumada e outros perfumes sobre a plateia por meio de vaporizadores! (cf. idem) A experiência foi um desastre e suscitou enorme polémica em torno da validade e honestidade destas experiências “dandistas” (cf. Lista, p. 14).

Porém, o que realmente estava no ar era a possibilidade de “uma nova arte do espectáculo, exclusivamente baseada em projecções cromáticas em movimento, associadas ou não com a música” (Lista, p. 15). Como se está a entender, essa arte será o cinema cujas primeiras realizações experimentais datam do início do século XX. (cf. Lista, p. 15)