Uma mulher entra no palco carregando nas costas uma mochila de viagem. Visivelmente cansada, pousa-a no chão e senta-se sobre ela. De uma das pequenas bolsas, desembrulha uma sanduíche e começa a comer. Aparece o Rapsodo, preocupado com a presença da intrusa.
Rapsodo : A senhora não pode estar aqui refastelada. O nosso palco não é parque de merendas.
Nória : ( Como se nada fosse com ela .) É servido? Olhe que isto não é pão de plástico. Fui de propósito comprá-lo a uma loja de produtos naturais.
Rapsodo : A senhora tem de ir lanchar pra outro sítio. Os actores estão prestes a entrar em cena.
Nória : Então o senhor não é actor?
Rapsodo : Sou...
Nória : Então vê... os actores já chegaram. Está você aqui e estou eu. ( Estendendo-lhe a sandes .) Vai uma dentadinha?
Rapsodo : Não seja insistente.
Nória : Eu quero falar com Prometeu. Vim de muito longe e não aceito recusas. Quero conhecer o pai do fogo. Não me importo de fazer uma cena com ele. O lugar dos mitos é no teatro... Também tenho direito ao meu número.
Rapsodo : Mas tem de esperar pla sua vez. ( Consulta uma lista .) Antes de si temos a Águia, o Zeus, a Cassandra, entre outros, e todos fizeram marcações com antecedência.
Nória : Ah! Mas eu sou mestra de improviso. Não preciso ensaiar com ele. Posso esperar o tempo que for necessário. Estou clandestina e não tenho horários a cumprir.
Rapsodo : Como é o seu nome?
Nória : Nória.
Rapsodo : Nunca ouvi falar de si. Veio de algum país de leste?
Nória : Digamos que sim. ( Indisposta ) Já estou habituada ao anonimato.
Rapsodo : Agora tem de se ir embora. Pode dar uma volta pla plateia. Chegou o professor Heraclito.
Nória : Esse não estava na sua lista.
Rapsodo : Estava sim, é nosso convidado. E não reclame porque senão não lhe apresento o Prometeu.
Nória : Ora que embirrante! ( Saem de cena .)
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