Corsino Fortes e João Cabral de Melo Neto, alcançaram sem dúvida um lugar de destaque na literatura cabo-verdiana e Brasileira, respectivamente, sendo hoje dois grandes nomes da poesia em língua portuguesa. Mergulhar nas obras de Corsino Fortes e João Cabral, é uma tarefa difícil, mas, muito aliciante. Difícil porque trata-se de mergulhar nas “palavras” de dois poetas com o mais alto nível de rigor, no seu trabalho de linguagem poética, que exige de quem lê os seus poemas, uma atenção e um cuidado profundo. Aliciante porque ambos são dos “maiores” (incluir já Corsino Fortes, é apenas uma questão de justiça “poética”) poetas da língua portuguesa e a obra de ambos merece sempre uma leitura e releitura apaixonadas. Em ambos (naturalmente João Cabral, conduz a poesia a um limite quase inalcançável, nesse trabalho intenso de linguagem) temos uma poesia elaborada através de um trabalho de linguagem profundamente rigoroso, racional e/ou conceptual, poesia de “construção”, de um “pedreiro” e “engenheiro”, ambos inspirando-se na aridez geográfica e humana, de Cabo-Verde e Sertão respectivamente, e sempre na busca da justiça, quer seja social e/ou humana, quer seja a justiça sintáctica da palavra. Por isso, o “conceito” ainda defendido por alguns, de que os poetas são seres alienados, que a sua “infinita pureza” não pode ser “maculada” pela realidade social e histórica do mundo em que vivem, que a sua função é apenas celebrar as belezas da vida e a eternidade da arte, está definitivamente ultrapassado e, Corsino Fortes e João Cabral de Melo Neto, provam-no sem a mínima dúvida. Estes poetas falam de Cabo-Verde e do nordeste Brasileiro, da luta diária do homem pela independência e sobrevivência, e de poesia e sua função e/ou objectivo (essencialmente João Cabral) de forma contundente e absoluta. Afinal, eles souberam determinar o facto, de que para fazer a crítica da realidade, é preciso ao mesmo tempo, fazer a crítica do material com que se investiga essa mesma realidade, ou seja, a palavra, a linguagem. O poeta perante o mundo (ou o “seu mundo”), perante a palavra, perante o “poder da palavra”, sempre com um objectivo: FAZER! Sempre em permanente dialéctica com o simples mistério da vida. João Cabral diz-nos no poema “A árvore”:
(...)
A árvore da vida? A árvore
da lua? A maternidade simples
da fruta?
A árvore que vi numa cidade?
O melhor homem? O homem além
e sem palavras?
Ou a árvore que nos homens
adivinho? Em suas veias, sem cabelos
ao vento?
(...)
E Corsino Fortes, no fogo pedra dos pulmões, afirma convictamente:
h)
Por vezes o vulcão joga
............................o pião da ilha no chão da alma
Ó como rodopia
............................A árvore do dia no tambor da diáspora
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