CADERNOS DO ISTA, 7 - 1999

A PLURALIDADE
DOS MUNDOS DA CRENÇA

 

MOISÉS MARTINS
O REGIME DISCURSIVO DA CRENÇA

LINGUAGEM E CRENÇA
José Augusto Mourão
APOSTASIA: O CASO JULIANO
Abel Pena
 

EDITORIAL


O crer foi sempre, para o homem, a grande viagem ao desabrigo dos códigos e uma prática da diferença. É verdade que a crença incide sobre as "coisas jamais vistas pelo homem" (1 Cor, 2,9), mas é igualmente verdade que não veríamos nada se primeiro não acreditássemos. Sem a fé, não podemos ver; sem a vista, a fé é impossível. Só o possível se pode ver; é por isso que vemos utopias como realmente possíveis, num espaço coremático existencial (mesmo se, estritamente falando, não existem). A visão é a modalidade suprema da cognição, o que é confirmado pela intuição perfeita do Ser Supremo pelos místicos. As origens do crer relevam do auditivo, como lembra o Apóstolo: lides ex auditu (Rm 10, 17); contudo o acto modal do crer está ligado ao visual (Jacob Mey).

Permanentemente a crença oscila entre o seu momento instituinte (poético) e o seu momento instituído (pragmático, ideológico). Trata-se de definir, antes de mais, o espaço da crença, e disso trata Moisés Martins, ligando-se a crença à descrença e à fé (Bento Domingues). O que aproxima o crer do sacrifício - o lugar feito ao outro através do dom tem valor de convenção com o outro. Na ordem do reconhecimento, o crer seria o equivalente do que é o sacrifício na ordem das práticas. O crer funda as instituições e as linguagens, as contratualidades e os dogmas. "A crença e a razão estão empenhadas num corpo-a-corpo medonho - e fazem ferida" (M.G. Llansol). Como fazer face à eterna luta entre os "afectados" e os "indemnes", os ortodoxos e os heréticos? Abel Pena ilustra perfeitamente essa situação aplicada ao caso Juliano. O destino normal duma representação transmitida é transformar-se, não replicar-se (Sperber). Estudar a propagação duma representação mental privada como uma crença é estudar a circulação duma entidade que tem todos os traços duma ficção produzida para a interpretação. João Mário Grilo ensina-nos a ouvir o cinema, não como uma máquina de sonhos, mas como um acontecimento. "Cada crença tem necessidade de todo um mundo de outras crenças para ter um conteúdo e uma identidade" (Davidson). Uma crença tem uma estrutura holística. Ana Luísa Janeira introduz-nos no espaço em que a ciência e a crença partilham visões, decisões, estratégias. O textualismo (que é uma representação mental pública) é uma patologia da textualidade: como abordar uma ética da linguagem? J. A. Mourão demora-se na descrição daquilo que é a contratualidade e a violência da linguagem. As crenças partilham-se. Aqui tem o leitor a que reagir, a que responder. Na liberdade ecuménica da leitura.

fr. José Augusto Mourão.op
 


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