EVOÉ
 - Relatório de uma missão no Brasil /A pedra de cobre nativo da Cachoeira
Maria Estela Guedes

INDEX
I
O JARDIM DO ÉDEN
I - SENTIR O BRASIL
II - COLABORAÇOES E PERMUTAS
III - INVESTIGAÇÃO
IV - EXPEDIÇÃO À CACHOEIRA
PESOS E MEDIDAS - EQUIVALÊNCIAS
NATURA OU CULTURA?

SILVA DE DOCUMENTOS SOBRE A PEDRA DE COBRE

INSCRIÇÃO GRAVADA NO COBRE
DOMINGOS VANDELLI, 1797
GABRIEL SOARES DE SOUSA
LINK - ACCURSIO DAS NEVES
ESCHWEGE - E NOTAS DO TRADUTOR
MAWE - ROCHA POMBO

EVOÉ - O JARDIM DO ÉDEN

EVOÉ
ou
Relato de uma viagem de estudo ao Brasil
7-21 de Novembro de 1998 (1)

Cachoeira (Bahia, Brasil)

Três objectivos presidiram à viagem, implicados na exposição CulturaNatura: assegurar colaborações, fazer investigação para o livro acerca do bloco de cobre, e sentir o Brasil. Sentir, para a autora, é um instrumento de conhecimento, como para outros o é o microscópio ou uma análise ao sangue.

O JARDIM DO ÉDEN

No caso do bloco de cobre, é necessário saber que ele centra o debate em torno da inseparabilidade NaturaCultura: sendo o paradigma das Ciências o natural e o das Letras o humano ou cultural, de que meios dispõe cada um deles para à partida identificar o seu objecto de conhecimento como natura ou cultura?

Embora ao longo dos textos os naturalistas digam que o cobre é nativo, virgem ou criado da natureza, essa virgindade não é imediatamente apreensível pelos sentidos; não sabemos em que critérios científicos se apoiavam os naturalistas do século XVIII para afirmarem, na sequência da análise química, que a porção analisada não era produto de fusão; hoje, os cientistas declaram que para distinguir o cobre natural do artificial a análise química é irrelevante, só a análise estrutural fornece tais dados.

A autora reuniu uma série de textos (2), incluído o mais forte - a inscrição do bloco - de que agora só se mostra a parte que ainda não têm os que trabalham o tema, textos esses cuja estrutura, em termos de obra literária colectiva, chama a atenção para o facto de tudo o que lhe diz respeito ser falso. A máscara começaria então pelo estado do bloco, esparrado, como se diz numa das descrições. Sem parra, porque antes de esparrado a usava, perdida de há muito a virgindade, há muito cometido o pecado original.

Central também ao debate é a necessidade de o Homem sentir que no seu planeta há espaços radicalmente diversos para habitar, o sagrado/natural e o cultural/profano, o que levanta o problema de desvalorização da obra humana, e mesmo de recusa em aceitar que o Homem também é um criador. A Natureza continua a ser o sacrário de um Criador que nem Letras nem Ciências admitem que possa ter sofrido acção humana, sob pena de sacrilégio, o que leva a reconhecer que a condição do homem face à Natureza continua a ser a do expulso do Paraíso.

A ciência ainda não apresentou os resultados da análise estrutural do cobre; quando apresentar, pode ser que se verifique estar errada a análise literária, por o cobre ser 97% virgem, exceptuada apenas aquela parte que sofreu fusão superficial (3). Pode ser erro afirmar que ele passou pela Casa de Fundição, digo Moeda, quanto mais não seja naqueles 3% que usavam parra. O eixo do debate permanecerá correcto: nem Ciências nem Letras têm meios para à partida distinguirem a cultura da natura, o erro da fraude, a verdade da mentira, o falso do verdadeiro: a massa de cobre tem vindo, desde há duzentos anos, a ser identificada como cobre nativo, por um processo de crença, apenas porque tem uma inscrição a dizer Cuprum nativum minerae ferri mixtum. É por um processo de crença que, face às características do discurso científico, todos, excepto a autora, as consideram erros, de ortografia, tipográficos ou outros. Donde se conclui que pensamos segundo círculos fechados ideológicos, segundo religiões, ou nem sequer pensamos, limitamo-nos a seguir os ditames deste ou daquele consenso, o que nos protege dentro do círculo do poder instituído. Não somos livres para encarar sem preconceitos o objecto do nosso conhecimento, o conhecimento já de si só se concebe se assentar em qualquer pré-conceito.

NOTAS DESTA EDIÇÃO ONLINE

(1) Este texto é inédito, foi apenas distribuído como relatório, na altura, às instituições e pessoas envolvidas no projecto da exposição CulturaNatura, que me levou ao Brasil.

(2) Esses textos são a bibliografia do trabalho "Martinho de Mello e Castro e as riquezas naturais", em linha no TriploV (Alquimias, Pedra de Cobre). Publicado também em "Discursos e Práticas Alquímicas - II", Hugin Editores, Lisboa, 2002.

(3) A Ciência, contra o prometido, nunca chegou a apresentar esses resultados.

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