" A última imagem que retenho do 'Chico' António adulto é a de um homem forte e grande que copiou do pai o bigodinho estreito. Mas, ao fitar-lhe os olhos, é sempre o menino que me surge - o mesmo que, vai para quarenta e cinco anos, vi em Castelo de Vide, suspenso num pégaso de luz. O mesmo S. Francisco de Assis. Sem a aptidão prática de Francisco Bugalho (aquela que permite, a uma natureza invulgar, adaptar-se, sem grande sofrimento, ao ramerrão e às arestas da vida) Cristóvam Pavia herdou do pai toda a aptidão lírica - que viria a sublimar, mais tarde, marcado o espírito por aquela aceitação de tudo ( expressão insistente na sua poesia ) que só os eleitos são capaz de sentir profundamente e transmutar em beleza. ". Apesar de, como diz António Luís Moita, os poetas terem sido feitos para resistir, Cristóvam Pavia escolheu a "saída pelo fundo" (expressão de um poema seu).
Nicolau Saião é da opinião que Cristóvam Pavia optou pelo comboio como forma de abandonar a existência devido ao facto de, desde pequeno, se sentir fascinado por esta máquina, a qual diariamente observava da Quinta da sua infância e na qual se transportava de Lisboa a Castelo de Vide, ficando mesmo à sua porta. Simbolicamente, foi essa a viagem derradeira, mergulhando-o para sempre no mundo perdido. Realizou assim a buscada consubstanciação " com a criança morta que trazia em si e isso não o podia fazer sem caminhar definitivamente na morte até a encontrar e serem um só, na unidade derradeira e total.".
António Luís Moita, além de ter trabalhado numa empresa petrolífera, foi membro da direcção da Associação Portuguesa de Escritores e editou em 1985 o livro Cidade sem Tempo. Nele, além da interessante incursão pela temática alquímica, nomeadamente decorrente do contacto com o pensador Abel Teixeira, inclui um profundo e comovente poema dedicado aos amigos Francisco Bugalho e Cristóvam Pavia - Reencontro , de seu nome.
Em 1991, o poeta participou em Portalegre no programa de rádio Mapa de Viagens, realizado por Nicolau Saião (" Um Serão com Cristóvam Pavia "), meses depois de haver publicado uma evocação deste seu amigo num jornal de Castelo de Vide.
Como ele próprio disse, "mortos e vivos completam-se em transmissão permanente, um fio que, embora invisível, se escuta, para perdurar, aqui e além, em surdina".
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