Quase não como
quase não durmo
ao instante segundo
escrevo muito
escrevo sempre
mesmo se não escrevo
com a dor crónica da coluna
há muito inflamada
quase não como
quase não durmo
ao instante segundo
cada vez mais
isolado do mundo
construo a própria
torre de babel
num quarto fechado
ainda
sem destino notável -
entre o dia e noite
o movimento da chama
escorre
na câmara-escura
e o pêndulo quase pára
cristalizado o sono
na dobra das esquinas
onde crianças de rua
se escondem
numa cama de estrelas
ao abrigo da doce sufocação da morte
quase não como
quase não durmo
ao instante segundo
se a luta me custar a vida
como um soldado ferido em combate
na trincheira
contra os frustrados
críticos de arte
que nada sentem
ou sabem daquilo que pensam e dizem
vou seguir o trilho do caminho
para lá do pequeno mundo
conhecido
mesmo que as palavras já gastas
se tornem escassas
na procura da razão crua que me alimenta a coragem
quase não como
quase não durmo
ao instante segundo
escrevo muito
escrevo sempre
mesmo se não escrevo
com o corpo em movimento suspenso
refugiado na cápsula do tempo
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