As capas são os lugares mais óbvios da obra. Quando a citação neles ocorre, dá-se no título ou na imagem.
Começo por me ocupar da imagem.
Normalmente, as capas tomam na sua imagem a totalidade ou um fragmento de uma obra, em geral, alheia e pictórica (mas também fotográfica, escultórica, etc.), procurando captar a atenção e criar e orientar expectativas de leitura.
Vejamos o caso de Que sinos dobram por aqueles que morrem como gado? , de Rui Nunes (1). A gravura de Francis Bacon reproduzida na capa inscreve o literário em problemáticas que o excedem e que atravessam a modernidade estética:
. a figura humana e as suas sombras colocam a questão da reflexividade;
. a obsessão auto-retratista baconiana torna incontornável o problema do auto-retratismo e do auto-conhecimento;
. o desenho baconiano impõe a distorção compositiva.
A imagem promove, pois, as expectativas de leitura correspondentes: a reflexão (no duplo sentido do termo), o auto-retrato e a distorção.
A capa ostenta, assim, uma imagem que sinaliza, através da problemática da representação e da representação problemática, os domínios da estética e da epistemologia onde a escrita se informa, remetendo-nos para eles. |