Dirigi-me rapidamente até a plataforma.
De fato, estávamos em mar desimpedidos. Viam-se apenas alguns blocos de gelo esparsos, icebergs flutuando; ao longe, a vasta extensão do oceano; no ar, um bando de aves. Sob as águas, miríades de peixes que variavam, segundo a profundidade, do azul mais intenso até o verde azeitonado. O termômetro marcava três graus acima de zero. Equivalia a uma relativa primavera por trás desse mar de gelo, cujas massas longínquas se perfilavam no horizonte setentrional.
- Estamos no pólo? - perguntei ao capitão, com o coração batendo forte.
- Não sei - respondeu ele. - Ao meio-dia, determinaremos nossa posição.
- Mas será que o sol brilhará por detrás dessa névoa?
- Por pouco que clareie, já será o suficiente.
A dez milhas do navio, na direção sul, elevava-se uma ilhota isolada, a uma altura de duzentos metros. Dirigimo-nos até ela, embora com cautela, pois aquele mar poderia estar repleto de recifes.
Uma hora depois, chegamos à ilhota, e depois de mais duas horas nós a contornamos completamente. Teria de quatro a cinco milhas de circunferência.
Temendo ficar encalhados, paramos a uma distância de três cabos do areial, sobre o qual havia um amontoado de rochas. Eu e o capitão, e mais dois marinheiros carregando instrumentos gigantes, tomamos um barco.
Algumas remadas impulsionaram o barco até a praia, onde ficou encalhado. Conselho quis saltar em terra firme, porém eu o impedi. Dada a nossa situação no Nautilus, não devíamos nos arriscar.
- Capitão Nemo - disse - , ao senhor cabe a honra de ser o primeiro a pisar este solo.
- Pode crer, sr. Aronnax - respondeu o capitão - , que se não hesito em pisar esse solo é porque nenhum mortal já o fez antes.
Dizendo isso, saltou sobre a areia. Via-se que estava emocionado. Subiu a um pico que dominava uma pequena elevação, e aí, com os braços cruzados e os olhos brilhando, imutável e mudo, parecia tomar posse daquelas regiões austrais.
Chegou o meio-dia sem que houvesse brilhado uma única vez o astro do dia. A ausência do sol impedia que se pudesse tomar a posição, pois não tardou a cair uma intensa nevasca.
- Deixaremos isso para amanhã - limitou-se a dizer o capitão.
E voltamos para o Nautilus, envoltos numa ventania.
Às cinco da manhã do dia 21 de março, já me encontrava na plataforma. O capitão Nemo também estava lá, chegando antes de mim.
- O tempo tende a melhorar - disse ele. - Tenho grandes esperanças. Depois do almoço, iremos para a terra, a fim de escolher um ponto de observação.
Findo o almoço seguimos para a terra. Perdemos duas horas para atingir o pico da elevação, uma mescla de pórfiro e basalto. O capitão Nemo, ao chegar ao cume, calculou exatamente a sua altura, por meio do barômetro. Logo depois, com o auxílio de um binóculo com retícula, observou o sol, que se elevava o horizonte, descrevendo uma diagonal muito fechada. Eu estava com o cronômetro. Se o desaparecimento do sol coincidisse com as doze horas do relógio, era sinal de que estávamos no pólo.
- Doze horas - disse.
- O pólo Sul - exclamou o capitão em tom solene, entregando-me o binóculo, através do qual pude ver o sol cortado exatamente em duas metades pelo horizonte.
O capitão Nemo colocou sua mão em meu ombro e disse:
- Ninguém até agora chegou ao meridiano noventa, ou seja, ao pólo Sul. Pois bem : hoje, 21 de março de 1868, tomo posse dessa parte do mundo, equivalente à sexta parte dos continentes conhecidos.
- Em nome de quem, capitão?
- Em meu nome, professor - respondeu com orgulho mais que merecido.
E ao dizer isso, o capitão Nemo desfraldou uma bandeira negra com uma letra "N " bordada em ouro, em seu centro. A seguir, virando-se na direção do astro do dia, cujos últimos lampejos brilhavam no horizonte, exclamou:
- Adeus, sol! Desapareça, astro refulgente! Deixai envolto na sombra de uma noite de seis meses o meu novo domínio...!
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