FRANCISCO GARZÓN CÉSPEDES
Tributo
O CHAMÁN DO TRIPLOV
Maria Estela Guedes
Com este volume para o Inverno de 2019-2020, damos início a um novo formato da Revista Triplov: ele será dedicado na íntegra a um dos nossos autores, sob a etiqueta de “Tributo”. Homenagem aos que mais têm contribuído, pelo seu próprio mérito e estatuto artístico ou intelectual, para o sucesso e reconhecimento do Triplov. Assim, entre outros, estão pensados para os próximos tomos desta série, Ricardo Daunt e Floriano Martins (Brasil), Manuel A. Sousa, Nicolau Saião e Maria Azenha (Portugal).
Francisco Garzón Céspedes, um ibero-americano (dupla nacionalidade, cubana e espanhola) é um caso muito especial, se atendermos a que o seu contributo não é tanto o de colaborador, sim o de espectador e juiz. Através da instituição a que preside, a CIINOE – Cátedra Iberoamericana Itinerante de Narración Oral Escénica – quer o Triplov quer eu tivemos a honra de receber o Prémio Chamán, um dos vários que ela atribui anualmente. O Triplov recebeu o prémio em 2015, e eu este ano, 2019. Como é fácil de ver, um prémio, sobretudo vindo de uma instituição duplamente estrangeira, longe das afetividades nacionais, neste nosso tão pequenino Portugal, justifica plenamente o muito trabalho que temos desenvolvido nos vinte anos que o Triplov cumprirá em 2020, e enche-nos de orgulho e satisfação.
A Francisco Garzón Céspedes, o Triplov e eu temos muito a agradecer, e o segundo motivo de reconhecimento é justamente este tributo que lhe prestamos, para o qual ele ofereceu vários trabalhos inéditos, em diferentes áreas, artísticas e de pensamento, entre elas os livros Contraseñas de sabiduría, um ensaio filosófico constituído por aforismos, definições, máximas, ditados, e pensamentos do autor; El cuento es una conspiración, sobre oralidade, literatura e vida; Pequeña antología de poemas de amor; os poemas modulares, poesia visual: Cuando digo «amor», Quien pierde la lealtad pierde la vida ; a narrativa Mármoles en el laberinto e o livro de microficção Bla bla bla bla sobre el amor; o livro de contos Sobre la cuerda del equilibrista; finalmente, um caderno inconcluso, Realidades y cuentos.
É muito material inédito, o que nos chama à responsabilidade de o fazer perdurar o mais possível no ciberespaço, tal como, de resto, a todo o depósito de colaborações do Triplov, que se acumulou nestes vinte anos.
O nosso tributo a este homem é pequeno em dimensão, relativamente ao que ele representa, dado o imenso acervo de obras que publicou, dirigiu ou performou. Esperamos que documente pelo menos a sua multifacetada obra, em que assume maior ressonância a de contador de histórias. Ele tem teorizado a narração oral cénica, dirigido oficinas um pouco por toda a parte, na Europa e na América Latina, para o seu ensino, e sobretudo exercido a moderna função do antigo griot, jogral, bardo ou menestrel, enfim do contador de histórias que, em tempos atuais e muito antigos, exercia cumulativamente funções sociais e religiosas, donde o chamán. O chamán, aquele que cura por comunicar com os espíritos, tem igualmente por missão perpetuar as tradições do seu povo. Como os títulos das obras que mencionei amplamente documentam, Francisco Garzón Céspedes é um filósofo, ele transmite sabedoría , sobretudo comunicando com os outros, contando connosco as suas histórias, em vez de as contar para nós ou de no-las contar. Ora na raiz do termo siberiano de que provém a palavra xaman, chamán ou shaman, figura o termo «sha», saber. Chamán é aquele que sabe, o sage de outros tempos.
Infelizmente, a obra do narrador oral cénico é aquela que menos documentada está neste tributo, por se tratar de trabalho de palco. Ainda assim, no YouTube foi possível coligir alguns links que dão dão a conhecer o trabalho das oficinas de narração oral cénica, e sobretudo entremostram o encantamento em que nos fazem mergulhar os contos narrados por Francisco Garzón Céspedes. Com efeito, a sua capacidade de comunicação em cena, dos lados mais distintos tem recebido os maiores cumprimentos, prémios e elogios, entre eles o de mago. Mago é um sinónimo de chamán. Nesse sentido caminhou também o escritor argentino Julio Cortázar, ao asseverar que “Garzón, narrador oral maravilloso, entrega el prodigio de cada una de las palabras”.
O NARRADOR ORAL CÉNICO (YOUTUBE)
Narración Francisco Garzón Céspedes y José Víctor Martínez Gil
Último Cero
Taller de narración oral: los contadores de cuentos, por Francisco Garzón Céspedes
La narración oral escénica (1992)
REVISTA TRIPLOV