DISCURSO DE CORVOPrevious | Home | Next |
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INSERT 2. Encontro de Jorge e José Júlio Rodrigues. Este leva uma máquina fotográfica a tiracolo e papéis na mão. Fotografa o anfiteatro como se fosse uma paisagem. Jorge leva uma mala de viagem. Jorge - José Júlio Rodrigues, é grande o prazer em vê-lo! O meu caro professor está tal e qual estava quando acabei o curso na Politécnica! José Júlio Rodrigues - Oh, Jorge, estimado amigo! Soube pelo conselheiro Acácio que partia para o Alentejo a explorar as minas... Jorge - Incumbências do Ministério... Eu realmente não tenho a menor ideia do que se possa fazer em Beja. Deve ser horroroso! José Júlio Rodrigues - É todavia a capital do distrito! O meu amigo há-de descobrir belas jazidas, bem precisados estamos do vil metal! Jorge - Então e como vai a nossa Politécnica? José Júlio Rodrigues - Acabei agora mesmo um relatório para apresentar aos colegas... Má, anda mazita a Politécnica... Veja o meu amigo que a dotação é magra, escasso o pessoal, por mais que eu tenha reclamado, as aulas práticas deixam muito a desejar, e depois... Oh, depois... O pior ainda é a falta de material para as demonstrações... Sem experiências, que cadeira pode com legitimidade chamar-se prática? Jorge - A quem o diz... No meu tempo, nem um cinzel de geólogo havia... (aponta os papéis). É esse o relatório? Que diz esta passagenzita? José Júlio Rodrigues - Por isso não admira que o laboratório da 6ª cadeira sinta há muito a falta de numerosos instrumentos de demonstração, estando sob este aspecto deficientíssimo; por isso lhe faltam todas as colecções que devera possuir, de quadros técnicos, amplos e exactos, em que o aluno encontre, desenhados e aguarelados ou coloridos, modelos e perspectivas de fábricas e de aparelhos, que lhe não é possível observar por outra forma; por isso lhe falta a maior parte dos meios com que, ferindo-se a imaginação do estudioso, se lhe grava no espírito o melhor de uma ciência, árida talvez à força de ser vasta, se lhe tirarem do ensino a índole, a um tempo teatral e grandiosa, das suas esplêndidas averiguações. Jorge - Teatral e grandiosa!... Esplêndidas averiguações!... Isto é de arrasar, José Júlio Rodrigues! Com isto vai conseguir dotação de vulto, porque isto é de arrasar qualquer ministério! |
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Andrade Corvo - Pelo ano de 1857, o ministro que teve a iniciativa na criação da Escola Politécnica, o ilustre marquês de Sá da Bandeira, propôs ao parlamento uma lei, com o fim de ampliar o ensino na Escola, criando duas cadeiras especiais: a de Química Orgânica e Análise Química, e a de Geometria Descritiva. Assim a Química já era naquela época considerada pelo conselho da Escola Politécnica, de acordo com o ilustre ministro, que era também um homem de ciência, de tal e tão transcendente importância, que o seu ensino foi ampliado com a criação de uma nova cadeira especial, compreendendo o curso eminentemente prático da análise. Não satisfeitos com isto ainda os intuitos do ministro e do conselho escolar, foi proposta ao parlamento a criação de um laboratório de investigações, para promover os progressos da ciência, dar instrução prática aos alunos, e para se ocupar em estudos de interesse para a administração pública. Mas, apesar das nossas diligências e da boa vontade dos governos, ainda está por organizar o ensino prático da Química. Os dois lentes de Química, os srs. Agostinho Vicente Lourenço e António Augusto de Aguiar, que por suas numerosas e importantes descobertas e obras científicas têm provado o seu distinto saber e consumada aptidão nos trabalhos de laboratório, dirigem com reconhecida distinção os dois cursos que actualmente se professam na Escola; vêem porém os dois dignos professores em grande parte perdido o fruto do seu trabalho, pela falta de ensino prático dado aos alunos no laboratório: e é tanto mais para lamentar este facto, quanto a ciência que eles professam é uma daquelas a que mais devem os progressos modernos, tanto científicos como industriais. Tem o laboratório condições para nele receberem os alunos instrução prática; não lhe faltam os instrumentos, aparelhos e produtos necessários apara os cursos; tem suficiente pessoal; nada pois impede que, mediante razoável subsídio do estado e a obrigação imposta aos alunos de seguirem os trabalhos de laboratório, se completem os cursos de Química pela pronta organização do ensino prático obrigatório. A incorporação na Escola Politécnica do núcleo de museu, deteriorado e pobre, que existia na Academia Real das Ciências, não foi só de grande utilidade para a instrução dos nossos alunos, mas de transcendente importância para os progressos das Ciências Naturais em Portugal. Era para a capital um desdouro, para a ciência um grave inconveniente, que não houvesse em Lisboa um museu, onde estivessem representados os produtos naturais do reino e das remotas e vastas possessões ultramarinas; onde, ao menos, os estudiosos pudessem encontrar, cientificamente dispostos e classificados, os tipos característicos das fundamentais divisões, em que a ciência tem grupado tanto os minerais como os seres organizados. Tem-se o Museu Nacional - que já hoje merece esse honroso nome - rapidamente desenvolvido, enriquecido e aperfeiçoado de ano para ano. Dividido naturalmente em duas secções, uma de mineralogia e geologia, outra de zoologia, cada uma delas dirigida pelos respectivos lentes das duas cadeiras, o museu tem tido incremento compatível com as circunstâncias, nem sempre favoráveis, em que cada uma das suas secções se tem encontrado; sendo certo que os resultados obtidos - podemos dizê-lo sem exagero - são em parte de maravilhar, dados os obstáculos que mais de uma vez têm impedido o aumento das suas colecções, e que permanentemente dificultam o seu arranjo metódico, e a sua boa e completa classificação. A secção mineralógica do museu, apesar da assiduidade e saber do seu director, está longe infelizmente de atingir o grau de desenvolvimento que seria para desejar, em proveito do estudo das ciências que ela deve auxiliar, facilitar e promover. O que mais é para sentir é a falta nessa secção do museu de minerais de Portugal, e de rochas e fósseis, que representem devidamente a geologia do reino. Dissidências, cujas causas não vem para aqui apreciar, levaram o lente de mineralogia, Sr. Francisco António Pereira da Costa, a separar-se da comissão a que fora incumbido o estudo da geologia do país. A comissão geológica prosseguiu zelosa e activamete nos seus estudos e explorações: hoje estão a ponto de ser trazidos à luz pública os resultados definitivos dos laboriosos e longos esforços da comissão; é tempo que nas salas do Museu Nacional esteja representada, em colecção largamente desenvolvida, a geologia de Portugal. Quiséramos também ver no nosso museu uma colecção de minerais e rochas das possessões ultramarinas, especialmente de África. A exploração, ou antes, o reconhecimento metódico daquelas regiões, onde tantas riquezas se acumulam, está sendo de urgente necessidade. Havia um distinto e enérgico geólogo alemão, o barão Barth, sido encarregado pelo governo português do estudo geológico de Angola; começara ele com mais zelo que prudência as suas explorações, quando a morte veio cortar-lhe as esperanças de glória que o haviam levado à África portuguesa, e privar-nos a nós de um dedicado e sábio explorador. Foi grande para nós a perda do barão Barth; mas tão deplorável sucesso não nos deve desviar do nobre empenho de prosseguir a exploração científica das nossas colónias. O dr. Welwitsch estudou a flora de Angola, e enriqueceu por essa forma a botânica com espécies novas, e interessantes e novos factos de geografia botânica. O heróico Anchieta - e não hesito em dar-lhe este epíteto - o heróico Anchieta está cada dia acrescentando com exemplares novos a já valiosíssima colecção zoológica de Angola, que dá realce às salas do nosso Museu. |