DISCURSO DE CORVO

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INSERT 3. Encontro de Sebastião e Basílio. Abraçam-se. Basílio está de luvas, brincará com elas.

Sebastião - Basílio, então tu estás em Lisboa, menino?

Brasílio - Oh, Sebastião, Sebastião! Ó meu desejado Sebastiarrão!...

Sebastião - Já viste a tua prima, a Luísa, a nossa querida Luisinha?

Brasílio - A Luisinha, sim... Estive com ela ontem... Coitada, uma ponta de febre, não se sabe o que seja... Veja você, Sebastião, a medicina, a medicina pouco ajuda ou nada...

Sebastião - A medicina é uma meia ciência, e a fisiologia é outra meia ciência. São ciências conjecturais, porque nos escapa a base, conhecer o princípio da vida! Sim, que sabemos nós do princípio da vida?!

Brasílio - Você está desmoralizado pela doutrina vitalista, miserável! O vitalismo é contrário ao espírito científico, você não era tão vitalista assim quando andámos na Politécnica! Uma teoria que pretende que as leis que governam os corpos brutos não são as mesmas que governam os corpos vivos é uma heresia grotesca! E Bichat, que a proclama, é uma besta!

Sebastião - Tu desculpa, rico, mas só um alarve diria que Bichat é uma besta!

Brasílio - Mas que me importa a mim o princípio da vida? O princípio da vida é um segredo! A vida, a morte, as origens, os fins, tudo isto é mistério... Mistério, Sebastião, mistério... Menino, se você me dá licença, tenho um encontro marcado...

Sebastião - Ah!, e com quem vai encontrar-se o sr. Basílio de Brito?

Brasílio - Como o princípio da vida, é segredo... Um enorme segredo...

..

Andrade Corvo - Logo nos primeiros anos em que o museu foi incorporado na Escola Politécnica, Sua Majestade El-Rei o Senhor D. Luís dignou-se enriquecê-lo com uma valiosíssima colecção de aves e moluscos. Alguns estabelecimentos e sábios estrangeiros auxiliaram também com seus donativos o engrandecimento da secção zoológica do museu.

Tem hoje o museu, dirigido pelo dr. Barbosa du Bocage, quatro vastas salas, onde se encontram as seguintes colecções: quatro colecções gerais; uma de mamíferos, outra de aves, outra de répteis e outra de peixes. Além destas colecções já estudadas, tem ainda o museu outras colecções da maior importância, que carecem ainda ser cuidadosamente revistas e coordenadas.

De há muito era indicada e vivamente sentida a conveniência de se criar junto da Escola um jardim botânico, não só como complemento indispensável do ensino escolar, mas também como subsídio necessário aos estudos dos que em Lisboa cultivam a botânica, e como útil ornamento da capital. Essa justa aspiração acha-se hoje em parte realizada. Existe nos terrenos adjacentes ao edifício da Escola um jardim botânico, já em grande parte criado e enriquecido de numerosos exemplares, classificados e dispostos em conformidade com a ordem geralmente adoptada nas principais escolas botânicas.

A transferência do Jardim Botânico da Ajuda para o terreno que ora ocupa na Escola Politécnica felizmente coincidiu com o facto de estar regendo o curso de Botânica e dirigindo o Jardim o Sr. conde de Ficalho, cujo amor à ciência e proficiente saber tornou fácil a tarefa, que era de si cheia de dificuldades. O novo Jardim levantou-se como por encanto, e hoje mais de dez mil plantas florescem onde não há ainda quatro anos não vegetava um arbusto.

Depois de começada a plantação do novo Jardim Botânico, foi contratado o Sr. Edmund Goeze como primeiro jardineiro. Terminado o tempo do seu contrato, em seu lugar veio para tomar conta do jardim o Sr. Júlio Daveau, antigo chefe de serviço no Jardim das Plantas de Paris.

Existiam no jardim Botânico da Ajuda alguns herbários antigos. Entre estes havia um herbário geral, que parece haver pertencido a Vandelli; existia outro herbário, formado por Brotero; e finalmente encontrava-se também uma considerável colecção de plantas brasileiras, principalmente da região do Amazonas, coligida por Alexandre Rodrigues Fereira. Desses exemplares se formou o núcleo do que hoje é o herbário da Escola.

O dr. Bernardino Gomes, além de colecções suas próprias que ofereceu à Escola, contribuiu para que as colecções do dr. Welwitsch, que existiam na Academia Real das Ciências, nos fossem entregues. Por morte do dr. Welwitsch, as preciosas colecções de plantas africanas que ele, por comissão e a expensas do governo português, coligira em Angola, foram-nos disputadas nos tribunais ingleses. Foi nessa ocasião que o dr. Bernardino Gomes provou mais uma vez o seu acrisolado patriotismo e o seu entranhado amor à ciência: conseguiu manter-nos na posse das famosas colecções, graças à sua actividade, e ao nobre e caloroso apoio que lhe prestou sempre o ilustre dr. Hooker.

Aos esfoços do antigo lente de Física, o Sr. Guilherme Pegado, se deve a criação do Observatório Meteorológico do Infante D. Luís, anexo desde a sua origem à Escola Politécnica. Foi modesta e totalmente desprovida de recursos próprios, a importante instituição na sua origem, e assim viveu por alguns anos, sustentada sempre pela corajosa iniciativa do ilustre sábio. Logo em princípio do seu feliz reinado, Sua Majestade El-Rei o Senhor D. Luís tomou sob sua protecção o observatório Meteorológico. Sua Majestade deu generosamente os meios necessários para se levantar esse edifício onde hoje o vemos estabelecido, e onde tem ido sempre crescendo a importância, e aperfeiçoando, em instrumentos e métodos, as suas variadas e úteis observações. Hoje o observatório Meteorológico ocupa e merece um lugar eminente. O seu Director, o Sr. João Capello, tem sabido alcançar um nome justamente estimado por todos os sábios que se ocupam do estudo dos fenómenos físicos da terra.

Não me será levado a mal, espero, que dê uma rápida notícia dos melhoramentos realizados ultimamente no observatório, não só pelo seu interesse real para a ciência, senão porque tenho de cumprir por esta ocasião um grato dever, qual é o de agradecer em nome da escola os generosos donativos com que foi auxiliado o observatório pelo Sr. duque de Palmela, e pelo o seu próprio director. Sem esse auxílios valiosos fora impossível realizar os melhoramentos, de que o estabelecimento ciêntifico urgentemete carecia.

Foi o antigo anemográfo, que havia vinte anos funcionava, substituído por outro, feito pelo hábil construtor o Sr. José Maurício Vieira, segundo os desenhos do Sr. Capello.

O observatório fez a aquisição do barógrafo Redier com registo mecânico.

O termómetro eléctrico de Becquerel é destinado a observações de temperatura a diversas profundidades. Possui o observatório já um desses aparelhos; e logo que se construa uma nova casa magnética no plano inferior do Jardim, longe de todas as influências perturbadoras a que a casa actual está sujeita, o termómetro de Becquerel será convenientemente colocado, para com ele se fazerem interessantes observações a que é destinado.

Possui também um electrógrafo de Mr. Bourbouse, modificação engenhosa do electrógrafo Thomson; um anemómetro do sistema inventado pelo dr. Prestel de Berlim, e que dá simultaneamente a direcção e a pressão do vento.

Ultimamente ainda, ao partirem para Angola e Moçambique as expedições de obras públicas - expedições sob todos os pontos de vista civilizadoras, e destinadas a promover e fecundar trabalho africano - os condutores de 1ª e 2ª classe receberam no Observatório instruções teóricas e práticas, para poderem dirigir naquelas remotas regiões alguns postos meteorológicos. A expedição de Angola levou quatro colecções de instrumentos comparados com os padrões do observatório, e quatro abrigos de termómetros. Um posto já se acha estabelecido em Luanda, e dele se receberam as primeiras observações, relativas ao mês de Agosto.

Em Moçambique vão organizar-se três postos meteorológicos; um em Moçambique, um em Quelimane e o terceiro em Lourenço Marques. Fácil é calcular a importância de tais estabelecimentos na África Oriental, e o alto apreço em que devem ser tidos pela ciência os seus resultados.

Busquei, quanto possível, abreviar a notícia do progresso e actual estado dos estabelecimentos incorporados na Escola
Politécnica. Receio contudo haver cansado a Sua Majestade El-Rei e à ilustre assembleia, que se dignou vir assistir à nossa sessão solene. Como todos reconhecemos e respeitamos no Augusto Chefe de Estado o dedicado protector das ciências, o promotor constante dos progressos científicos e sociais em Portugal; como, quantos honram hoje a Escola Politécnica com a sua presença, nesse facto mesmo dão prova de interessar-se pela prosperidade e engrandecimento deste instituto, ser-me-á lícito esperar da magnanimidade de El-Rei, e da vossa ilustrada benevolência, senhores, me seja revelada esta falta; se por tal pode ser tido o amor com que falo da Escola Politécnica, onde recebi a instrução, e a que se ligam as mais gratas recordações da minha já longa vida literária.