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Herberto Helder
na Real República Palácio da Loucura
 

1. O Palácio Carbonário da Loucura
2. "História", de Herberto Helder
3. Interior
4. Outro poeta na mesma rua: Agostinho Neto

1. O PALÁCIO CARBONÁRIO DA LOUCURA

A Real República Palácio da Loucura, fundada em 1947, localiza-se hoje no número 21 da Rua Antero de Quental, em Coimbra. O poeta Rui Mendes, que deu à estampa um dos primeiros textos publicados de Herberto Helder, na revista Êxodo, em linha no TriploV (http://www.triplov.com/letras/exodo/index.htm ), tinha-me há meses sugerido que visitasse a Real República Palácio da Loucura para fotografar a parede de um quarto onde se conserva, protegido das pinturas e dos maus tratos, um poema do então jovem estudante, com o premonitório título "História".

Assim fiz, por ocasião do filo-café "Inês de Castro, no reportório galego-português", a 7 de Janeiro de 2006. Além de Rui Mendes, que, talvez já avisado, nos esperou na rua, acompanharam-me nesta missão duas escritoras, Risoleta Pedro e Maria Azenha, colaboradoras também do TriploV, tal como Rui Mendes.

Desejo agradecer a todos a oportunidade de enriquecer a minha bagagem pessoal com o conhecimento do que são as repúblicas, e aos estudantes que actualmente lá moram a autorização para divulgar algum conteúdo das suas paredes que decerto enriquecerá o património cultural dos cibernautas.

As repúblicas são casas de estudantes, governadas democraticamente por todos os moradores. Uma das suas principais características é a loucura, a transgressão juvenil, o ataque à ordem e às rotinas anti-criadoras da vidinha bem instalada. Foi assim que o estudante que nos recebeu começou por avisar que devíamos ter cuidado com o sítio onde púnhamos os pés, pois o cachorro, e segurava-o pela coleira, era ainda novito, não conhecia ainda as boas maneiras. Porém eram tão grandes e coloridos os cocós em exposição na entrada da nossa adorável República, que agora desconfio que foram lá depositados, e com algum esforço estético, para homenagear a cultura e muito em especial os meus objectivos poéticos. Muito obrigada, reitero do coração, valeu bem a pena esta entrada!

Eis o que se lê no site que a Universidade de Coimbra ( http://www.uc.pt/pag_uc/republicas.html ) dedica às repúblicas:

As suas origens remontam ao século XIV, quando D. Dinis, por diploma régio de 1309, promovia a construção de casas na zona de Almedina e que deveriam ser habitadas por estudantes, mediante pagamento de um aluguer, cujo montante seria fixado por uma comissão, expressamente nomeada pelo Rei, constituída por estudantes e por "homens bons" da cidade. É assim que a partir de um tipo de alojamento comum, permitindo minimizar os encargos financeiros, viriam a surgir, por evolução, as actuais Repúblicas. Ainda hoje as "casas" caracterizam-se pela exaltação de valores universais que unem o passado ao presente: a vida em comunidade, a soberania e a democraticidade. As decisões são geralmente tomadas por unanimidade e todos os membros responsabilizados na gestão da "casa".

A antiguidade das repúblicas remonta ao reinado de D. Dinis, mas não creio que se chamem assim por qualquer paixão platónica. Provavelmente, o requinte republicano da anarquia deve datar de finais do século XIX ou mesmo já do século XX, com o apoio dos estudantes ao derrube da monarquia e instauração da República Portuguesa. Sabendo-se que o motor da revolução foi a Maçonaria Florestal Carbonária, primeiramente a funcionar nas associações de estudantes, e especialmente no seio da Maçonaria Académica, resta concluir que a subversão subjacente a cocós de cão e a análogos procedimentos políticos da cultura tem cariz carbonário. Esse cariz aparece de forma bem concreta na prancha, o letreiro brasonado que encima a porta: repare-se no que aconteceu a certos sinais gráficos: parece terem sido deslocados do seu lugar na hierarquia dos elementos frásicos. Mas realmente não fazem falta: o nome "Palácio da Loucura", com o antecedente "Real República", não carece de vírgula, ponto de exclamação nem reticências, para não dizer que o triângulo (acento circunflexo) está em definitivo a mais no registo ortográfico, só se concebendo como redundância dos três pontos. Isto é, esses signos que parecem cabalísticos são um sinal de reconhecimento maçónico-carbonário. Nada de espantar então a minha visita, ela era inevitável.

Pela terceira e última vez agradeço, muito honrada e com afecto, a deferência com que me estenderam a passadeira vermelha, ornamentada com esses e outros naturalísticos sinais de um código visivelmente público e secreto.

Maria Estela Guedes
(StellaCarbono.'.)