k) O computador também opera ao nível das simetrias | 215. Só na medida em que a máquina inalterável do Altíssimo era capaz de tais irracionalismos matemáticos ao engendrar o Universo. 216. E o Reverso, também. 217. No banco da memória revejo tudo o que escrevi. Um bit demente. Mais além, um resplendor por si. Mas crio a tanta velocidade que nem tempo tenho para um cigarro. Digo: não tenho tempo. Procurei-o na carteira e não no achei. Em que comboio da linha do ouro até à barca d'alva terei perdido o meu tempo? E num dia de tanta chuva, que arrelia! Que mo devolvem na central? Mas central é tudo isto, valha-o Deus! 218. Gostava de ser palhaço de circo, equilibrista! Cartomante ou domador de feras. Electricista. Se entanto vos jurasse que em mim luz desse talento, seria aprendiz de vigarista. Na realidade só tenho habilidade para o mal, foi o que sempre disse a família. 219. Oiço-me partir de longe mim volvesse. 220. Qualquer tentativa de descrição exaustiva da realidade cairá mais perto ou mais longe na abstracção total. Assim discorro e rabisco no meio da vinha, enquanto no caminho passa uma vaca de luto com um lenço. Leva uma réstia de vidas para a cozinha. 220. Cozinha, vinha, vizinha, pilinho, linho, passarinho, mezinho, purinho . Para si, que desgosta de diminutivos, com os meus cumprimentinhos. E azevinho, por ser dia de beijar o Meniño. AY FREMOSINHO SE GRADOEDES | LONGI DI VILA QUEM ATENDEDES? | 222. Pobrezitos! Só se entendem com aumetativozitos! Dá-se-lhes o melhor vinho da vinha e desprezam-no por pequenito. Falta-lhes o sal da língua. 223. Pedindo um cibinho de pan pela cidade por mor de Deus. 224. A grande diferença entre o Carlos e o Euzebiozinho é que o Carlos não dormia com a titi. E eu, que sempre tratei a mãezinha por senhora! Eu, que nunca soube o que é dizer paizinho! Benza-vos um despiciendo pachequim! 225. Como se para junto de mim viesse. Ao lado de um medo que abrange tudo. E o godo, e o vice-godo. O engodo não age sobre os mecanismos da sedução. Age apenas nos da tentação. E esta audácia abrange tudo. Abrange-me a mim, e abrange-a a ela. Vejo-a que se ergue à porta como um flamingo cor-de-rosa. Os meus nobres inimigos olham-me nos olhos, sem fraquezas. Tudo o mais é mijaria. Un flamant rose. Minha Alma em close-up. Fiel inimigo, na minha frente, o flamingo altivo. Trespassa-nos um recíproco olhar de admiração. Gosto de experimentar a resistência de adversários com a minha altura. A altura de uma alma de arribação. Como ela vem rouca e constipada! 226. E este Medo é alto e louro. Alma namora-o da janela. De todo o lado se fitam e eu cativa dos olhos dela! Em qual de vós me anule e adormeça? Adormeça, adormeça, para de longamente não saber mais nada: nem número de irmãos, nem saber ler nem nada. Estico a paz ao Sol numa tarde de Dezembro, o bloco nos joelhos friorentos. A laranjeira dobra-se ao peso do ouro. Eu esqueço-me de saber de nada. Que retrato mimoso, que cena rural! A amendoeira reduz-se a um esqueleto externo, duas rolinhas arrulham perto das coelheiras. As rolinhas, Ani! As rolinhas arrulham ao espírito santo. 227. Gosto das paisagens sólidas, opacas, que me dão a impressão de limite para os olhos. O limite tranquiliza-me, todo o conjunto fechado é fonte de serenidade para mim. Evita perguntas indiscretas? As casas detêm-me o olhar. Uma casa é uma casa e o Infinito não mora dentro dela, não ouve rádio, não vê televisão, não frita de maneira nenhuma os bolinhos de bacalhau. Bolinhos, Ani! Bolos é outra cousa em que se não usa meter bacalhau. Olha para o Altíssimo e sente como é diminutivo o teu nome, milagre infinitesimal. 228. Que tu és o Grande Rei desaparecido antes da aparição. Mais importante, porém, é a minha estima das grandezas. Em qual de vós me durma e desapareça? Infinitamente grande ou pequeno o nome de nossa alteza... baixeza... ou baixela de prata onde te sirvo a sobremesa? Vou de um lado ao outro sem obstáculos, sem lograr também a incerteza. Adormeça, adormeça, adormecidamente. 229. Vejo-vos aos dois, três ou mais, em contraluz de ráfia. Losangos múltiplos de lume dispostos serialmente em simetrias. E nem tempo tenho para um cigarro! Como se a alma se juntasse comigo sem pré-aviso e nunca mais se volatilizasse. Ou como se voara para não voltar. Minha alma passa. De perfil, à minha frente. 230. Dilemas! Entre Fernando Pessoa na TV e os Doors na rádio, que podia eu fazer? Vejo-o a ele, ouço-te a ti. 231. Esqueci-me de que entretanto me levantei do sofá para vir escrever o que escrevi. 15.1.82, 22h 30' 16", veneris dies. Hoje, terapia através da música: Doors, Doors, e mais Doors! Também não assentava mal um visitante de Krypton. 232. Minha alma passeia extravagante e crua. Minha alma posa soberanamente. Minha alma, sente-se! E ela senta-se junto de mim compondo a cabeleira. 233 . O mais estranho desta estranha história é estar eu aqui com ela. |