j) Sentido por fricção e difracção das partes



199. Não podemos deixar os nossos créditos por mãos alheias, sejam elas as de ]oana, santíssima! ]uana Ia Loca.

 

200. Ninguém se distrai do que faz no caminho fluente dos vocábulos. Apenas alargamos o campo da percepção. 

Concentro-me mais agudamente no meu espaço, difracto-me por maior quantidade de outros.

Concentro o mundo num raio X.. Pierre ao quadrado, a quadratura do círculo, água... mole... pedra... ou a circunferência de lugar nenhum. Pondero o vazio.
Crio. 
Dou atenção à mais ínfima partícula de matéria.

Sou um monstro incapaz de distracção. E tu só me encontras o olhar disperso nas cousas . 

O reino onde me concentro é inacessível como rochedo ecoante e íngreme.

 

201. As vozes que ouço e me batem à porta! As vozes que vejo e osso!

Deixá-las-ei entrar?

Se já dentro de si  stão!

Meus ossos firmes e providenciais, ó osso do meu osso! Sinto cada vez mais que tudo se apoia  neste esqueleto outoniço, de folhas caídas.

Sinto cada vez mais reumatismo.

 

202. O mundo inteiro padece de reumático.

 

203. É o endosqueleto, a estrutura central, o sistema sintáctico interno. Ou não sabiam que a Criação se rege pelas Réguas da Gramática?
Ela ensina que luz é um osso.
No Princípio era o Osso. E o Osso se cobriu de viandas e habitou entre nós.

 

204. Como era? Como era aquele palavrão que aprendeste hoje na Biblioteca Nacional?
Os ritos dionisíacos comportavam desmembramento e devoração de crianças. 

As mães despedaçam e comem os próprios filhos. Crus.
Diasparagmos e omofagia.

 

205. Despedaço, crio, como o Sol.
Depois, vomito.


206. Não consigo agarrar a criatura. Escapa ao meu domínio. Por mais que me arme de arco e flecha, foge-me este ser  lupino.
                   

207. Se já dentro de mim stão! E o som que elas trazem de tomado longe. ..

 

QUEM MOSTRA-BO ÊSS CAMINHO LONGE 
QUEM MOSTRA-BO ÊSS CAMINHO LONGE 
CAMINHO PRA SANTO MÉ! ...
SÔDADE !... SÔDADE!...


208. Ter o Universo inteiro dentro dos ossos! ]untá-los, pouco a pouco, até o Sol fulgir de novo na hóstia de Osíris! 

É um rio de ondas hertzianas que o devolve intacto e precioso !

 

209. Como se outra vontade lhe dirigisse a  voz, e mais não pudesse do que repetir um som alheio, uma sílaba final.
Deixar falar primeiro os outros, os mais velhos. Os  mais idóneos porque mais idosos, gente de muitos dias.

Atiram-Ihe um osso, e ela repete por vale e montanha, sem um queixume, sem um ganido:  ôss... ôss... ôss... 
Arre pôça, que grand'ôsso!
Ouço atrás de mim um rumor crescente de canção.
Será o trovão?

 

21O. Minhas asas de longe e teu sorriso d'ave. Cair na noiva da mais alta torre. Minhas asas brancas com que voava. Eram brancas brancas brancas como as do anjo que mas dera. Um dia deitei-lhes fogo, ficaram pretas e beras.
Minhas asas de longe e teu sorriso d'ave. Ah, nossos corpos vãos! Amigo de mim e pátria distante, indistinta. Esfíngica como um vulcão. Minha
alma distincta.
Com nosso amaro splendor na relva.

 

211. Resultamos simplesmente da síntese de hélio e carbono. Somos pessoas simples, energéticas, vitrais.

 

212. Sou feita igualmente de elementos PSI . Sou, ainda, um objecto voador mal-educado.

 

213. Que eu sou capaz de alterar por mutações violentas toda a tarefa molecular!

Ateio um incêndio na floresta e o ciclo das chuvas altera-se.

Levanto um megalito e o cenário altera-se.

Passo o disco negro sobre a face do Sol e tudo se altera.

Desloco o meu olhar sobre as paisagens vacuns e já não é o que era.

Fito em vós o meu radar e desaltero-me.


214. Mudo uma sílaba ao teu nome e a carta é a da minha alteridade.

Vós, porém, sois passageiros noutra cidade.