Para que a
sustentabilidade realmente ocorra, especialmente quando entra o
fator humano, capaz de intervir nos processos naturais, não basta
o funcionamento mecânico dos processos de interdependência e
inclusão. Faz-se mister uma outra realidade a se compor com a
sustentabilidade: o cuidado. Ele também funda um novo paradigma.
Antes de mais nada,
o cuidado constiui uma constante cosmológica. Se as energiais
originárias e os elementos primeiros não fossem regidos por um
sutilíssimo cuidado para que tudo mantivesse a sua devida proporção,
o universo não teria surgido e nós não estaríamos aqui escrevendo
sobre o cuidado. Nós mesmos, somos filhos e filhas do cuidado. Se
nossas mães não nos tivessem acolhido com infinito cuidado, não
teríamos como descer do berço e ir buscar o nosso alimento. O
cuidado é aquela condição prévia que permite um ser vir à
existência. É o orientador antecipado de nossas ações para que sejam
construitivas e não destrutivas.
Em tudo
o que fazemos, entra o cuidado. Cuidamos do que amamos. Amamos do
que cuidamos. Hoje pelos conhecimentos que possuimos acerca dos
riscos que pesam sobre a Terra e a vida, se não cuidarmos, surge a
ameaça de nosso desaparecimento como espécie, enquanto a Terra,
empobrecido, seguirá, pelos séculos afora, seu curso pelo cosmos.
Até, quem sabe, que surja um outro ser dotado de alta complexidade e
cuidado, capaz de suportar o espírito e a consciência.
Resumimos os vários significados de cuidado construídos
a partir de muitas fontes que não cabe aqui referir mas que vem da
mais alta antiguiadade, dos gregos, dos romanos, passando por Santo
Agostinho e culminando em Martin Heidegger que vêem no cuidado a
essência mesma do ser humano, no mundo, junto com os outros e
voltado ao futuro. Identificamos quatro grandes sentidos, todos
mutuamente implicados.
Primeiro:
Cuidado é uma atitude de relação amorosa, suave, amigável,
harmoniosa e protetora para com a realidade, pessoal, social e
ambiental.
Metaforicamente
podemos dizer que o cuidado é a mão aberta que se estende para a
carícia essencial, para o aperto das mãos, com os dedos que se
entrelaçam com outros dedos para formar uma aliança de cooperação e
a união de forças. Ele se opõe à mão fechada e ao punho cerrado para
submeter e dominar o outro.
Segundo: Cuidado
é todo
tipo de preocupação, inquietação, desassossego, incômodo, estresse,
temor e até medo face a pessoas e a realidades com as quais estamos
afetivamente envolvidos e por isso nos são preciosas.
Esse tipo de
cuidado, acompanha-nos em cada momento e em cada fase de nossa vida.
É o envolvimento com pessoas que nos são queridas ou com situações
que nos são caras. Elas nos trazem cuidados e nos fazem viver o
cuidado existencial.
Terceiro:
Cuidado é a vivência da relação entre a necessidade de sercuidado e
a vontade e a predisposição de cuidar, criando um conjunto de apoios
e proteções (holding) que torna posível esta relação indissociável,
em nivel pessoal, social e com todos os seres viventes.
O
cuidado-amoroso, o cuidado-preocupação e o cuidado-proteção-apoio
são existenciais, vale dizer, dados objetivos da estrutura de nosso
ser no tempo, no espaço e na história, como no-lo tem mostrado
Winnicott. São prévios a qualquer outro ato e subjazem a tudo o que
empreendermos. Por
isso pertence à essência do humano.
Quarto:
Cuidado-precaução e cuidado-prevenção constituem aquelas atitudes e
comportamentos que devem ser evitados por causa das consequências
danosas previsíveis (prevenção) e aquelas imprevisíveis pelo
insegurança dos dados científicos e pela imprevisibilidade dos
efeitos prejudicais ao sistema-vida e a sistema-Terra(precaução).
O cuidado-prevenção
e precaução nascem de nossa missão de cuidadores de todo o ser.
Somos seres éticos e responsáveis, quer dizer, nos damos conta das
consequências benéficas ou maléficas de nossos atos, atitudes e
comportamentos.
Como se
deduz, o cuidado está ligado a questões vitais que podem significar
a destruição de nosso futuro ou a manutenção de nossa vida sobre
esse pequeno e belo planeta. Só vivendo radicalmente o cuidado
garantiremos a sustentabilidade necessária à nossa Casa Comum e à
nossa vida. |