A cauda não mexe e parece uma batata porque deve ter ficado na boca de um gato enquanto o sardão fugia. E é um juvenil de sardão, Timon lepidus, como o herpetologista E.G. Crespo teve a gentileza de confirmar. Ex-Lacerta ocellata, ex-Lacerta lepida, ex- uma data de nomes que levantam suspeitas de misturas genéticas nesta espécie que devia ser estritamente europeia, mas que na literatura tem referências para África, para as ilhas da Macaronésia, da América, e sei lá mais o quê! Basta ler a ficha da espécie (1), no TriploV, para uma pessoa se erguer mentalmente à altitude de doze mil metros, pensar à velocidade de oitocentos quilómetros, olhar cá para baixo, para decidir, face à quadrícula orgulhosamente simétrica dos campos lavrados, que pouco território natural, verdadeiramenhte selvagem, subsiste na Terra. Ora, sendo agrícolas os campos, sendo campos trabalhados pelo Homem o revestimento da Terra, como poderiam ser naturais (selvagens), os seus habitantes?
Mas eu hoje não quero saber de diferenças entre natural e artificial em Ciências da Natureza - o cadáver foi coligido em situação perfeitamente cultural e doméstica, nas garras de um gatito - sim de rabos. Eu quero é falar de rabos de lagarto e de lagartixa, porque não são nada como os nossos, se um predador nos atacar, nós não podemos pensar com força: "Solta-te, rabo! Solta-te, rabo!", para a cauda se soltar e nós fugirmos entretanto, na certeza de que outra crescerá. Não tão bonita e perfeita como a primeira, e para azar até podem desenvolver-se duas, para não imaginar coisas piores, mas mais vale um rabo feio, e já sem préstimo para se segurar nos ramos de árvore, que nenhum.
E é isso mesmo o que fazem muitos répteis e anfíbios, chama-se a essa capacidade "autotomia da cauda". É assim que vão escapando aos predadores, mas este, coitadinho, só escapou à primeira. E o malvado do gato nem sequer o comeu, está tão habituado aos cozinhados da avó que já não sabe comportar-se como uma fera!