Procurar textos
 
 

 

 

 







OS LIVROS DA WALKYRIA
JÚLIO VERNE
VINTE MIL LÉGUAS SUBMARINAS
CAPITULO XII:
A Eletricidade
 

- Estes aparelhos pendurados nas paredes de meu camarote são os que fazem o Nautilus navegar. Tenho-os sempre diante de meus olhos e me indicam exatamente minha posição e direção, em pleno oceano.

- Conheço muitos deles, capitão, por serem de uso comum em navegação; porém estou vendo outros que devem ser especiais para o Nautilus. Por exemplo, essa rosa-dos-ventos que está aí, não é um manômetro?

- De fato, professor. Um manômetro que, em comunicação com a água, me indica, por sua pressão externa, a profundidade em que se encontra meu navio.

- E essas sondas, são de um modelo novo?

- São sondas termoelétricas, que me indicam a temperatura das diversas camadas de água.

- E esses outros instrumentos?

- Com relação a eles, devo dar-lhe uma explicação prévia - respondeu o capitão Nemo. - Existe uma força poderosa que é senhora absoluta no meu navio. Graças a ela posso resolver todos os problemas. Essa força é a eletricidade.

- A eletricidade! - exclamei, sem esconder o meu espanto.

-Exatamente.

- Não entendo de que modo a energia elétrica tenha chegado a esse ponto. Até o momento ela tem sido muito pouco utilizada e quase não produziu energia.

- A minha eletricidade, sr. Aronnax - respondeu o capitão Nemo -, não é a que o senhor conhece, e isto é o que tratarei de explicar de modo resumido.

- Todavia, os elementos que precisa utilizar para obter essa força maravilhosa acabam logo. Como poderá substituí-los sem entrar em contato com a terra? Por exemplo, o zinco.

- O senhor se esquece de que nas profundezas do mar existem minas de zinco, ferro, prata e ouro, de fácil exploração? Porém, não lancei mão delas e apenas me limitei a extrair do mar os meios de produzir eletricidade.

- É assombroso!

- Nem tanto assim, professor. Lembre-se da composição da água do mar. Há cloreto de sódio em abundância. Com este sódio, extraído da água, obtenho a eletricidade.

- Com o sódio?

- Sim, senhor. O sódio misturado com o mercúrio forma um amalgama que produz os mesmos efeitos do zinco nos elementos de Bunsen. O mercúrio nunca termina; o sódio gasta-se, é verdade, porém o mar o fornece a vontade. Além disso, devo dizer-lhe que as pilhas de sódio são muito poderosas e sua força eletromotriz é muito maior que a de zinco, em igualdade de peso e volume.

- Entendo tudo o que está me dizendo, capitão; porém, o sódio tem que ser fabricado, extraído. Como o senhor o faz? Poderia utilizar as pilhas, porém imagino que o gasto ocasionado seria muito grande. Em síntese : não seria rentável. Estou errado?

- Não, professor. O senhor não se engana com tal suposição. Por esse motivo, não utilizo as pilhas, e sim o calor do carvão de pedra.

- Carvão de pedra? - questionei surpreso.

- Bem, pode chamar de carvão do mar, se quiser - respondeu o capitão.

- E o senhor pode explorar minas submarinas de hulha?

- Verá logo isso. Peço-lhe apenas um pouco de paciência, pois terá tempo para tudo. Lembre-se do que eu disse antes: devo tudo ao mar; o mar me proporciona eletricidade, que dá ao Nautilus calor, luz, movimento e vida.

- Mas e o ar para respirar?

- Quando me falta o ar, volto à superfície do mar e basta. De qualquer maneira, se a eletricidade não me fornece ar, ao menos faz funcionar bombas poderosas que o armazenam em depósitos. Graças a essa reserva, posso ficar, se me convier, mais tempo nas profundezas, sem sair à superfície.

- Estou admirado, capitão. Não há dúvida de que o senhor descobriu a verdadeira força dinâmica da eletricidade.

- De fato. E agora, o senhor quer acompanhar-me? Vou mostrar-lhe a proa do Nautilus. Segui o capitão Nemo através dos passadiços de comunicação até chegar ao centro do navio. Ali existia uma espécie de poço, aberto entre dois compartimentos estanques. Uma escada de ferro levava à parte superior. Perguntei, então :

- Para que serve esta escada? - Leva diretamente ao barco.

- É claro. É uma embarcação que pode ser usada para passear e pescar.

Saímos da plataforma e passamos diante de uma sala de dois metros de largura, conde Conselho e Ned alimentavam-se com voracidade. Passamos pela cozinha e a seguir visitamos os dormitórios da tripulação. No fundo havia a porta da sala das máquinas, a qual atravessamos. Nesse local, o capitão Nemo, hábil engenheiro, tinha instalado os aparelhos de locomoção. Examinei todas as máquinas com grande interesse.

- Como vê - disse o capitão -, uso elementos Bunsen e não Ruhmkorff. A prática ensinou-me que os Bunsen são mais potentes e resistentes. A eletricidade produzida é transportada até a popa por meio de eletroímãs de grande tamanho sobre um sistema de alavancas e engrenagens.que transmitem o movimento até o eixo da hélice. Esta tem um diâmetro de seis metros, e pode dar vinte voltas por segundo.

- Portanto, pode obter-se uma velocidade de...

- Cinqüenta milhas por horas, exatamente.

Fiquei maravilhado com a resposta do capitão, porém preferi ficar quieto. Tudo era novidade para mim  e me sentia como um escolar apanhado em alguma falta. Capitão Nemo percebeu meu constrangimento e disse:

- Vejo que está espantado com tudo, professor. Não me incomodarei se quiser que esclareça suas dúvidas.

- De fato, capitão, receio abusar de sua hospitalidade. Vi quando manobrou o Nautilus em frente à Abraham Lincoln e já conheço a sua velocidade. Porém isso não basta. Pode subir e descer, virar à esquerda ou à direita, para cima e para baixo. Mas como pode atingir tamanha profundidade? Receio ser indiscreto.

- Não professor. Já disse que pode perguntar-me....visto que não irá sair desse navio. Vamos ao meu gabinete de trabalho. Ali, saberá tudo sobre o Nautilus.