ANTÓNIO JOSÉ DA SILVA |
SEGUNDA PARTE |
Cena VI |
(Entra Fagundes) |
Fagundes: Que mais me falta para fazer? Eu já fiz a cama a todos; já fiz a salada de ravos para cearmos; já temperei as gaitas para o galego; já assei o fricassé; já cozi um guardanapo; agora me falta deitar os arenques de molho, para ficar com as mãos lavadas. Ora sou uma tonta, esquecia-me o melhor, que é matar uma galinha para o doente, e mais trazia a faca na mão para isso. Semicúpio: Eu o estava dizendo; grande desgraça é ser um homem galinha, pois até de uma mulher tem medo. Fagundes: Mas confesso que não sou para ver sangue, que logo desmaio; porém eu fecho os olhos, e meto a faca, que alguma ficará espichada. Semicúpio: Oh, mulher! Deus te tire isso do pensamento. Fagundes: Qual! Eu sou muito melindrosa e pusilânime; não tenho valor para matar uma formiga. Ora lá vai a Deus, e à ventura. Semicúpio: Sem falência eu morro de morte galinhal: não há mais remédio que falar à velha; mas se lhe falo é capaz de acordar o cão do velho, que está dormindo, e encerra-me em parte mais apertada; não sei o que faça; pois tal estou, que se a velha me mata, não tenho no corpo pinga de sangue para deitar. Fagundes: Para que é cansar, eu são sou sanguinolenta. |