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HELDER COSTA |
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A serpente bíblica |
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Muito se tem falado do Trump e das razões da sua
vitória graças ao sistema eleitoral dos Estados Unidos, o tal país da
verdadeira democracia. Onde a velha máxima "uma pessoa, um voto" não
conta. Porque depois há uns representantes dos vários Estados que decidem
quem vai ser Presidente... Recordo que depois do terramoto que foi a
campanha do Humberto Delgado em 1958, o nosso amável ditador decidiu que a
próxima campanha eleitoral seria travada (efectuada, mas também "travada")
na Assembleia Nacional do decadente Estado Novo. Enfim!, as boas ideias
sempre encontram terreno para frutificarem.
Voltando ao Trump e à
verdadeira vitória da Ku-Klux-Klan e dos Criacionistas que proibem o
ensino do Darwin e qualquer avanço científico, recordei possíveis
metáforas da Biblia. Em criancinhas ensinaram-nos que uma pérfida serpente
(talvez misógina), enganou a pobre Eva... e assim fomos condenados a viver
na Terra, trabalhando e sofrendo... Será que o Trump é a reencarnação
dessa serpente? Misógino, ladrão, mentiroso, astuto e charlatão, é. Ainda
por cima começou a desdizer algumas bravatas. Mudando de pele, como as
serpentes. Claro que já começaram a surgir análises e projectos de
brilhantes intelectuais afirmando que ele não vai ser nada mau, que até é
bom dar um abanão nisto tudo, que temos de ter calma e nada de protestos.
As serpentes foram muitas vezes acompanhadas pelos célebres
encantadores que tocavam maviosas melodias. Para o povo ficar de boca
aberta, acreditar em fantasias e milagres e continuar de algibeiras
vazias. |
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Hélder Costa (Grândola, 1939)
é um encenador, actor e dramaturgo português.
Foi um dos membros fundadores do grupo
A Barraca, onde é encenador e diretor
artístico. A companhia obteve o prémio UNESCO, em 1992.
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