FINIS TERRAE
O não dito
e já ignorado
que se esconde
à margem
do sentido.
O esquecido
e logo reinventado
que some
entre os tons
da manhã
entretecido.
O que visto,
e logo descartado,
emerge imprevisto
em um grito.
O grafado
mas não compreendido
que se furta à deriva
do vivido.
A brisa
que não comunicada
passa sem querer
ser ouvida.
A paisagem
não litografada,
a enseada
que olhar nenhum revisa.
O olvido
do que sempre arquivado
não guarda mais
lastro dos vivos.
O presente
nunca registrado,
tempo inócuo
que a carne
não cicatriza.
Onda breve
dentre muitas consumada
que se arma
contra todo imperativo.
A fragrância
há muito evaporada,
ave rara
que no ar desfila
intangível.
Uma palavra
que, esquecida,
vive à larga
da folha
que a mantém
cativa.
O mundo
que nos lábios
se deflagra
e morre
em um murmúrio
não em um
estampido.
|
MAPA
Lampiões pendurados na noite
cortam as alamedas que se movem sobre um palco
movediço de sombras que se engastam
na moldura gasta de um retrato.
No meio do mundo a cidade afunda
dentro do vazio de um sono não habitado
por voz ou ressonância de gente
ou pelo ranger monótono de algum estrado
violando o silêncio e seus narcóticos
a cidade some sob meus olhos
que a buscam em vão no mapa.
Ainda hoje ouço o estalo de seus galhos.
MEMÓRIAS DE UM SÉCULO
Está cansado desse mundo antigo
cão com crânio cravado entre os dentes?
Sacode as ancas e a cabeça
e cospe de lado o despojo da civilização
a que um dia serviu servo sujo, humilde e paciente.
Jazem fêmures sob esse paraíso inaugural.
E com um estalo anunciam a nova idade
de homens de areia erguendo manifestos ao sol
e contemplando grandes máquinas,
aviões, automóveis e engrenagens que a ferrugem
come sem nenhum motivo ou finalidade
aparente.
|