MARIA AZENHA
Foto: M CÉU COSTA
TRIBUTO
Uma criança inocente dorme em meu leito
Com o nome do meu Amado.
Vem a cada manhã ressuscitar-me.
*
Dei-te a cheirar a flor alva dos séculos.
E tu descobriste o Mar Morto em meu sangue.
*
Uma vez disse-te: estou morta.
Mas nunca é isso o que alguém quer dizer.
*
É chegado o reino das crianças.
Toma-me em teus braços e escandaliza os homens.
In: Maria Azenha, Bosque Branco, São Paulo BR, Galiza ESP e Portugal . Editora Urutau, 2020.
presença total
Minha mão é o mar em movimento.
O puro movimento
Sem mar sem mão
Adere ao infinito como adere ao oiro
Ao hálito do sopro
Ao côncavo da respiração
Neste instante,
Suponho,
Há um deus que escreve na glande da minha mão.
o mar. novamente o mar.
O mar. Novamente o mar.
A sede
novamente
nos meus olhos.
Julguei
já não poder
tornar a chamar meu pai,
tão
longe,
tão longe
se deixara ficar,
lá na terra
da
idade,
para os sinos
do
Verão.
Mas
que águas
mo terão trazido,
hoje
de
volta,
hoje
pela manhã,
à
minha porta,
com luz a luz mordida a prumo
e a cintura
nos cabelos…
Julguei que não tornaria a vê-lo,
tão cedo,
tão
morta, nestas palavras
que
correm para o rio comigo
e
para a foz
das
vespas.
Ou talvez
não
assim.
Meu pai
fora-se embora,
hoje
em
segredo,
com as dunas
e
as aves marinhas
inquietas
e
o mar ainda mais azul.
O mar
O mar novamente
a bater-me nos olhos.
In: Maria Azenha, Pátria d’ água, Lisboa, Colecção O Lugar da Pirâmide , Editora Átrio, 1991. Esgotado.