NAHUI OLIN
(1893 – 1978 MÉXICO)
Tradução: FLORIANO MARTINS
[MINHA MENTE E MEU CORPO]
Minha mente e meu corpo têm sempre louca sede desses mundos novos mundos que vou criando sem cessar,
e das coisas,
e dos elementos,
e dos seres que têm sempre novas fases sob a influência do meu espírito,
e meu corpo,
que tem sempre louca sede,
inesgotável sede de inquietude criadora que brinca com novos mundos que vou criando sem cessar e com as coisas que são uma e são mil,
e com os elementos,
e om os seres que me dão insaciável sede e que não sei se têm um pouco de sangue,
um pouco de carne
ou algum espírito,
que servem de jogos intermitentes para a sensibilidade de minha matéria,
e o meu espírito tem sempre louca sede,
porém louca sede dele mesmo,
de criar,
possuir
e destruir com outra criação de maior magnitude do que aquela que destruiu
e meu espírito tem louca sede que nunca se extinguirá porque sua personalidade única não permite a comunhão ou possessão alguma de igual magnitude
e em vão,
nesses mundos novos que vou criando sem cessar nas coisas,
nos elementos,
nos seres lhes propaga voluptuosamente carícias de apreciação exterior,
as penetra,
apalpa em sua carnosidade e as morde até beber seu sangue sem conseguir mais do que uma grande loucura de insaciável sede
e dessa sede admirável nasce o poder criador,
e é fogo que meu corpo não suporta,
que em renovação contínua de juventude de carne
e de espírito
é único
e é mil,
pois é insaciável sede
e o meu espírito,
e o meu corpo têm sempre louca sede.
[O VERDE DE CAVIDADES OBLÍQUAS]
O verde de cavidades oblíquas
que é o todos vêem em um rosto
e aqueles que não veem não sabem por que se estranham,
e olham dentro apenas com o desejo de olhar,
e veem apenas,
e apenas sabem,
e creem somente que não verdes cavidades oblíquas
que são vistas sem olhar o rosto
e que recordam pedras verdes,
cores raras,
sem termo de comparação
não penetram a potência de expressão
a vibratória inquietude,
a constante rebeldia de um espírito,
de um cérebro em ação dotado de milhares de fibras microscópicas sensíveis ao tato de todo átomo vivente,
de toda sua matéria em toda sua essência
tal qual é o mesmo em sua substância,
e sobretudo,
e com maior interesse através de sua interpretação cerebral vivendo eternidades em segundos
e por suas profundas e oblíquas cavidades verdes tudo o que seu olhar abarca tudo o submerge em densidades verdes
e é o verde de olhos oblíquos mais incomensurável do que o verde olho da terra
do mar;
porque o mar é puramente um elemento físico
e o verde dessas cavidades oblíquas é o débil reflexo de um elemento superior
o espírito de um ser.
[FUI INDEPENDENTE]
Fui independente
para não me permitir apodrecer sem me renovar;
hoje independente, apodrecendo, me renovo para viver
os vermes não me darão fim
são os grotescos destrutivos de matérias sem seiva, e dão vida, ao devorar o que já está podre no último despojo de minha renovação
e a mãe Terra voltará a me parir e novamente nascerei
novamente agora para não morrer
da Ásis, da América, da África e da Europa será independente aquele que em sua fossa de morto viva
o que responda ao meu supremo chamamento para a última reunião dos independentes
o definitivo até amanhã para o encontro do viver
gravará em sua lápide essas palavras:
independente fui para não me permitir apodrecer sem me renovar;
hoje independente, apodrecendo, me renovo para viver.
revista triplov . série gótica . outono 2019
parceria tripLOVAGUlha
EDIÇÃO COMEMORATIVA | CENTENÁRIO DO SURREALISMO 1919-2019
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