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JOSÉ EMÍLIO-NELSON


 José Emílio-Nelson é escritor e editor do CEJMS. Nasceu em  Espinho, 1948. Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade do Porto. Publicou poemas e ensaios em revistas literárias portuguesas e estrangeiras. Prepara a reunião da sua colaboração crítica em jornais e revistas literárias e ensaios sob o título: MAIS DO QUE LER.


Em que balança pesas o Belo?

Ergue-o, coaxa, pesa o coaxar, batráquio, fechado na Caverna, afina

A filigrana (em forma sentimental).

Sopra, unhas negras, atado,

E bate («se defeca, se bufa»),

Raspado nas têmporas.

No resto, cadáver imundo. Ou embandeira o

Belo verso,

A bela escolha, ascendente dádiva (que obsceno pêlo do cu, faz lágrimas na

leitora asseada, a «hieródula da Grécia»).

Severo, Belo mural,

A arrastar o interlocutor pelas orelhas, a salvá-lo da couraça do «corpóreo»,

Untando-o,

Os borrões de merda, ainda assim a untar as aduelas da faixa que o enlaça,

Lombadas, coiro gravado a oiro,

O Belo – ranho e saliva, doirado.

A fealdade, ferrugem dourada,

Estoura as goelas na contenda e dissolve todo o lastro

E as fraquezas e frustra com o riso, o seu lacre eterno, troça de marcar a rés

que esperneia, cão carlim, pestífera,

A amesquinhar a feieza, a vaiar um autómato que se funde na risadinha moral.

(O coro da embriaguez responde, exuberante,

Põe-se a sussurrar, «olhando para» [Platão].) Os orifícios.

Há sempre o perigo de escoar a alma.

 

O coro esfola-se pela Beleza, pesa-lhe as imundícies,

E branqueia o branco, embranquece o horror,

Quando chama para si e esconde toda a podridão da Ascese que enreda,

De nariz em correcção plastificada, silicone,

Dá a salvação, o invólucro imune, fraco, com cautela, a refinar o desodorizado.

É a profecia da vida que se desfaz de feiura vigorosa, a desabrochar,

A ensimesmar-se, em suspenso,

Ele suborna pela ironia.

Pesa-a, rumo aos

Orifícios, são da cera, dois outros do ranho, dos vómitos, dois da remela,

uns outros, silbo de los aires (quando doentes, baralham-se).

E há sempre o perigo de escoar a alma. [L.H.O.O.Q.]*

 

 

* Duchamp: “elle a chaud au cul”.


Revista Triplov

Setembro de 2024

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