MANOEL TAVARES RODRIGUES-LEAL
Tributo
Org.: Luís de Barreiros Tavares
Manoel Tavares Rodrigues-Leal, Lírica Translúcida. Assinado com o pseudónimo de Manoel de Souza-Valente . Ed. de Autor.
Transcrição após algumas revisões a caneta feitas pelo autor num exemplar.
I
o rio flui. real.
límpido.
como se fora espelho.
onde me fite.
flui. sem engano. para a foz.
onde vai galgar
a água do mar.
ó ânfora de amor ausente
ó brilho que aflora a íris do olhar.
e colide com a brisa breve.
e atrai o anelo antigo.
e o rio flui sempre.
sem um instante cessar.
sobre seu leito intacto. o de
ser rio somente. e
fluir sempre.
como se fosse mera eternidade.
Lx. 27/06/2007
II
tão lúcida.
que transcende
a luz.
tecida há muito.
tão inconsútil.
que a luz cintila.
excessiva.
nas crinas da brisa. alada.
que eclode. e
flui como rio. e.
a ondulação do ser. então acende-se.
escorre porém.
a luz trespassa então a lucidez.
que não a do corpo.
que se dilui. no mar. e no verbo.
e já não se acende. como outrora.
Lx. 2/7/2007
III
trans. de trânsito de luz. de uma
luz dulcíssima.
leve. e breve.
que a palavra lavra. e além. a lucidez. de quem
canta.
uma alva canção. no
coração da lava.
Lx. 20/6/2007
IV
e o rio flui. fiel ao
seu destino.
que é o de correr moroso.
manso.
que fidelidade. magoada. então
nasce. ecoa.
que destino o abraça. e soa.
Lx. 26/6/2007
V
ó rio de luz. vertical.
que verte
o ocidental verão. estrénuo.
e suas. antigas . margens.
ladeiam o. vetusto. rio. e
a luz.
a ocidental luz.
que escorre.
então suas. breves. imagens
se malogram.
na geração do gume
do olhar.
que já imergira.
em as vísceras do mar.
Lx. 28/6/2007
VI
e o rio gora-se.
em a frustre imagem. do que
flui. ignorando-o.
baço barco. que se afundou.
e transportava leveza. dunas
nunca nomeadas. irradiando a feroz nudez.
e a imensa tangível. fragilidade do ser.
caos escasso.
Lx. 28/6/2007
VII
ah a leveza. aérea. do rio. que
desliza.
sem o saber. e a luz.
alvinitente.
que o tece. todos os dias
sem cessar.
é isso que vos oferece
eternidade.
que nunca se trai.
nunca se desnuda.
às coisas. em
estrita mutação.
Lx.30/6/2007
VIII
e é essa novidade perene.
límpida.
desenhada pela luz.
dourada.
que o cativa. e o
homem renasce.
subtilmente.
e as nuas coisas coexistem.
como brancuras irreais
vislumbradas.
oh luz. violenta e
veloz.
que irrompe
abrupta.
e és tu. luz
omnisciente
quem oferece beleza. cor
e esplendor aos dias
que nos bastem.
até errarem. irrespiráveis.
Lx. 27/6/2007
IX
veio o verão. fugaz.
e sua viveza fulge.
amor meu.
omitido nome de
nudez. que flui.
também como um rio.
e a voz cala.
a palavra mais vil e vã.
que ainda soa. ainda erra.
quando cingiu a flor
de um pranto.
escasso.
que. cedo. cessou o dia.
e o rio. qual rio murmuro.
passou. que passe.
célere. e o celebre.
Lx. 1//7/2007
X
e a luz late.
jamais letal.
e bate sobre
batel. que flutua.
à superfície do
rio. distância essa.
presa.
à leveza do rio. que
flui.
sem pressa.
como se fora
a flor flébil.
que afinal. eu fui.
Lx.22/6/2007
XI
e o luar. ao longe.
desponta.
à noite aflui.
ofusca
o dia perene.
e o luar. alto. também
flui.
trai luz.
que alui.
diferente. distraída.
que alui.
como se fora um rio irreal.
Lx. 1/7/2007
XII
e que o batel
singre.
o mar íngreme.
que a fortuna o faça
fender as águas.
e o batel. trivial.
vacila. oscila
não se segura.
imerge.
tal a fundura. fatal.
do mar.
naufraga.
lx.2/7/2007
XIII
e o mar. infinito.
reflui.
até ao rio escasso.
oh perfil de
deuses consentidos.
emergi.
da fundura do
mar.
oh renascei. no rio
ridente.
banhado pela luz térrea.
ou alta e etérea.
sucumbi. às simbioses da
beleza.
pagã. e.
da cisão do ser.
que são verazes. e vorazes.
os versos inscritos.
ver-se-á.
a res errante.
ou eros.
Lx. 30/6/2007
XIV
e o fogo flui.
ígneo.
esforço íngreme.
através das entranhas. estranhas. da
terra.
como se fosse
corola cálida.
irrompe.
nunca volátil.
desagua. ou
deflagra.
em pélago. ou em
nuvem vulnerável.
que afinal sou eu.
rio vastíssimo.
Lx. 24/6/2007
XV
e o rio
escoa-se. a terra firme. fere. fende.
e a praia esplende.
jamais espúria.
oh cintilação. áurea.
de uma seta de sol.
no coração do verão.
oh deuses supremos.
como eu supus
ora transeuntes. ora eternos.
reflecti somente os raios de.
um sol apolíneo.
que declina com a tarde.
que a turva treva tudo
invade.
e a lisura
dos lábios.
sábios. oscila. varonil.
porém não decai.
saboreia. busca. levai-a
de tão escassa.
para longe.
Lx.28/6/2007
XVI
o rumor.do
mar.
fere.
magoa.
e então esplende.
ou acende
brilhos múltiplos.
que perfeição
o habita.
e fulge.
oh pulcra mulher.
sempre emersa.
das águas subtis.
da memória.
conceptura. como nunca.
ora inocente. sem mácula.
retorna.
Lx.26/06/2007
XVII
a luz. láctea. tecida
e lenta.
lúcida. e langue.
de tão lúcida. se malogra.
e então a luz jorra.
pelas praias da
infância.
a visão idílica.
que foice. feroz.
ceifa agora.
os instantes mais subtis.
gorados.
por uma fuga. inocente.
e antiga.
mas nunca omnipotente.
amaldiçoada dicção.
e humílima.
Lx.2007/06/26
XVIII
olhai a orla.
do rio.
e também a usura da
obra.
que nasce. e
jorra.
olhai agora.
como outrora.
a orla do rio.
olhai o deus kronos.
que. como outrora.
flui.
e agora se comove.
uiva. se move.
ouvi e vede a obra.
sem o viço da mocidade.
agora.
e como ela se malogra.
olhai a orla
do cio
e sua escassa flora.
agora.
como outrora.
[olhai a orla.
do rio.
e sua floração. irreal.]
e como ela se malogra.
agora.
Lx.10/12/2009
MANOEL TAVARES RODRIGUES-LEAL