Só é divina a vida que se vai fazendo profanada.
Mais do que escorraçadas escarra-nos a Fortuna. A Fortuna desampara-nos de todos os confortos para nos devolver à riqueza que é o corpo na sua rigorosa carnalidade pouco franciscana.
É mais fácil passar sem a verdade do que sem a confiança, embora se possa e até deva perder esta para a renovar de um modo insensato. Voltamos a iludir-nos como se nascessemos de novo.
A beleza procura a sua injúria, já que esta é a prova de uma inveja. A estética do feio é um momento refutativo em que o belo é cultivado numa surpreendente forma de pudor.
Ao «Feio» não é alheia nem a prostituição nem o sublime – embora pareçam polos opostos estes conjugam-se num experiência de entrega e intensidade, por mais «falsos» ou «verdadeiros» que se possam parecer. A prostituição é a aparência mercantil e necessária do sublime.
A sagacidade, mais que um dote, é uma arma e um mote.
As equações amorosas são imperfeitas – nenhuma situação nos resolve de acordo com a plenitude que promete... a não ser que esta seja uma plenitude do sofrimento.
A reciprocidade desequilibrada entre os amantes faz surgir uma sensação grotesca de ingratidão – o que não deixa de ter graça.
O tigre coxo incita à compaixão porque há nele a possibilidade de maximizar a potência.
Tentas recolher-te na sombra porque esta te dá a sensação de que há uma elasticidade das substâncias.
A abundância tornou-se uma atribulação na gestão do sujeito – numa sociedade pequena e fechada poderiamos contentar-nos com os nossos limites porque desconheciamos a capacidade de variação. A vertigem da variedade subjectiva é uma permissa que deveria ser sociológica. Embora ainda sejamos inábeis para gerir tal abundância.
A fachada encerra a glória em superfícies inacessíveis – não há glória interior que mereça o aplauso da história.
O olhar procura outro olhar no qual possa diluir o apelo narcísico – e quem sabe encontrar uma felicidade, como quem encena a negação tricotada de um deus abscôndito.
|