O meu pai era lavrador
e por sua morte herdei eu
as asas duma caldeira
e a copa dum chapéu seu
Era um homem alumiado
que vivia naquela serra
tinha sete palmos de terra
onde foi sepultado
e tinha um rabenejo dum arado
que me deixou por favor
e tinha o aro de um tambor
tinha os canos duma meias
e nas herdades alheias
o meu pai era um lavrador
Tinha um monte que era um recreio
século a século é que o caiava
e todos os anos engordava
um porco de quilo e meio
vivia farto e cheio
e do que tinha nada comeu
tinha uma burra que morreu
que de velha não podia andar
e tinha umas dívidas por pagar
que por sua morte herdei eu
Tinha também uma colmeia
que dava mel que era um regalo
cada vez que ia crestá-lo
dava-lhe chemita e meia
tinha o gancho duma candeia
tinha o aro de uma passadeira
tinhas as travessas de uma cadeira
o meu pai quando morreu
e por sua morte herdei eu
as asas de uma caldeira
Deixou-me uma velha de idade
toda cheia de filhinhos
e deixou-me cá todos os caminhos
para eu passar à vontade
e deixou-me a liberdade
de mandar no que era meu
como ele enriqueceu
e eu espero ser rico
deixou-me as bordas dum penico
e a copa dum chapéu seu
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