Eu nunca soube mentir
Eu só sei falar verdade
Eu já vi chover albardas
Quinze dias numa tarde
Quando a minha avó nasceu
Já meu pai engatinhava
À pedra acorria eu
Cada vez que a encontrava
Ela bastante me ralhava
E eu fartando-me de rir
Deitadinho a dormir
Esse tempo já passou
Batia no meu avô
Eu nunca soube mentir.
Quando o meu bisavô nasceu
Tinha eu catorze anos
Usava botas sem canos
Que o pai dele me ofereceu
Nesse tempo estava eu
Já avançado na idade
Tinha muita habilidade
Não sabia fazer nada
Comia sopas com uma enxada
Eu só sei falar verdade
Tenho sido um homem bom
Como eu não há segundo
Fui no princípio do Mundo
Chefe de uma repartição
Já estive dez anos num verão
Em fiscal das estradas
Eu vi seis pulgas ferradas
Com ferraduras de rompão
Numa casa debaixo do chão
Eu já vi chover albardas
Vi um picarete de sola
Vi um morro de manteiga
Vi lavrar com uma pega
Vi um mosquito jogar à bola
Vi um burro andar à escola
Com oitenta anos de idade
Vi na avenida da Liberdade
Duas pretas muito vermelhas
Já vi ordenhar ovelhas
Quinze dias numa tarde
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