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REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
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O artista, as letras e a gestão cultural
Antonio Miranda fala das artes e da sua recente demissão da
Biblioteca Nacional de Brasília, onde era diretor desde março de
2007
Antonio Miranda (Maranhão, 1940).
Poeta, ensaísta, promotor cultural. Professor e ex-coordenador do
Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação do Departamento de
Ciência da Informação e Documentação da Universidade de Brasília,
Brasil, ministra aulas e cursos por todo o Brasil e países
ibero-americanos. Também é consultor em planejamento e arquitetura de
Bibliotecas e Centros de Documentação. Foi colaborador de revistas e
suplementos literários de jornais como o Jornal do Brasil e o argentino
La Nación, assim como da revista Imagen, na Venezuela. Doutor em Ciência
da Comunicação (USP, 1987), com mestrado em Biblioteconomia na
Loughborough University of Technology (Inglaterra, 1975), sua formação
em Bibliotecologia é da Universidad Central de Venezuela (1970). Assumiu
a direção da Biblioteca Nacional de Brasília desde sua criação, em março
de 2007. Contra a sua vontade, e em um episódio que é vergonhoso para a
cultura do país como um todo, foi exonerado do cargo. Sobre este tema e
outros, tivemos uma breve conversa com Antonio Miranda. |
ANTONIO MIRANDA
Entrevista de Floriano Martins
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Especial para o Diário
de Cuiabá |
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EDITOR |
TRIPLOV |
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ISSN 2182-147X |
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Contacto: revista@triplov.com |
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Dir. Maria Estela Guedes |
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Floriano Martins: Uma vez mais regressas a Caracas para acompanhar
montagem de uma peça de teatro tua. Conta um pouco da trajetória dessa
peça e sua receptividade da parte do público venezuelano.
ANTONIO MIRANDA: Tu País está Feliz é um longo poema escrito no final da
década de 60 do século passado, com o clima transformador (evito o
chavão “revolucionário”) de 1968. Contou com as músicas de Xulio
Formoso, um venezuelano nascido na Galiza, Espanha, e com a genialidade
do diretor argentino Carlos Giménez, dando surgimento ao Grupo Rajatabla,
agora Fundación Teatral Rajatabla, que recentemente completou 40 anos.
Em seguida, foi montado pelo grupo CUATRO TABLAS, de Lima, Peru, que
também está completando 40 anos… O grupo venezuelano viajou por muitos
países das Américas e da Europa, ganhou prêmios, e vem remontando o
espetáculo poético-musical de tempos em tempos. Esta última versão é a
comemorativa do aniversário do grupo e pretende sair por cidades do país
e por outras partes, como sempre faz. Tu país está feliz é um fenômeno
mais que teatral, foi um movimento de renovação do teatro venezuelano,
virou bordão político, alguns textos foram para livros escolares, sítios
na web, ganhou prêmios, formou uma geração de atores. É fantástico, pois
a obra é mais conhecida que o autor do texto original, ou seja, é mesmo
uma obra coletiva, e de uma geração. |
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FM: O teatro foi a tua primeira paixão no universo das artes?
AM: Comecei com a poesia, andei pela poesia geometrizante do Concretismo
para levar o poema para o cartaz, a parede, a pintura, a escultura… Mas
logo achei que o teatro era o formato, calcado na tradição, para levar a
poesia ao público. Relacionei-me com Ziembinsky e outros diretores. Mas
fui-me embora do Rio de Janeiro para a Venezuela, para escapar da
ditadura militar, em 1966, e lá comecei a escrever em castelhano… Por
isto sou considerado um poeta venezuelano.
FM: Como incorporas em tua vida o gosto pela promoção cultural, aí
incluindo a veia do colecionador?
AM: Sempre fui um colecionador… sobretudo de cartões postais… Tenho mais
de 250 mil, muitos deles do Brasil, de 1880 a 2000. Agora coleciono
livros de poesia, mais de 5 mil… Mas tenho muitos outros livros sobre
tudo. Não sou um colecionador de livros raros ou de primeiras edições,
como os bibliófilos. Coleciono conteúdo, boas edições… Acabo de orientar
uma tese de doutorado sobre a Bibliofilia, na Universidade de Brasília…
Mas não coleciono para mim, quero compartilhar tudo… Por isto criei o
Portal de Poesia Iberoamericana (www.antoniomiranda.com.br), há 8 anos,
para levar poesia ao público e a coleção é o principal suporte. Era um
projeto aparentemente absurdo, mas já temos quase 1,5 milhões de visitas
por ano.
FM: Como surge em tua vida a Biblioteca Nacional de Brasília?
AM: Várias bibliotecas nacionais antes dela… Trabalhei na Biblioteca
Nacional da Venezuela, na década de 70, onde dirigi o Centro
Bibliográfico Venezolano. Fui assessor da Biblioteca Nacional do Rio de
Janeiro (ainda não era uma Fundação) nos anos 80… Colaborei com alguns
projetos na Biblioteca da Universidad de Puerto Rico, início da primeira
década deste século (finalmente…) que faz as vezes de biblioteca
nacional…, e fui convocado para montar a Biblioteca Nacional de
Brasília, em 2007. A instituição fora criada pelo Tancredo Neves, em
1962, mas construída recentemente. Prédio de Niemeyer na Esplanada dos
Ministérios, obra mal acabada… Mas conseguimos transformá-la numa
instituição do século 21, no modelo de “biblioteca híbrida”, entre
digital e física, com recursos do Ministério da Ciência e Tecnologia, e
apoio do Ministério da Educação e do Ministério da Cultura, além da
infraestrutura da Secretaria de Cultura do DF. |
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FM: E em que condições a Biblioteca Nacional de Brasília sai de tua
vida?
AM: Humilhado. O novo Secretário de Cultura, no governo do PT,
confirmou-me no cargo. Eu fora designado para a BNB pela UnB com apoio
interministerial, cumpria um programa discutido pela Comissão Especial
do Conjunto Cultural da República. Depois descobri que agora era um
“cargo de confiança” e deixei claro que tinha um plano para cumprir, e
começaram as divergências… Primeiro foi cancelado a II Bienal
Internacional de Poesia de Brasília, depois nomearam um grupo para
desenvolver um plano do livro e da leitura (uma de minhas
especialidades), mas fiquei marginalizado… Houve pressão e fui elevado
de Diretor da BNB a Subsecretário do Livro e da Leitura, à revelia.
Assumi exigindo que restabelecessem o cargo de Diretor da Biblioteca
Nacional de Brasília, uma instituição republicana. Pessoas sob minha
coordenação mandavam e se diziam com a autoridade da Secretaria…
Adiantei-me e consegui que fosse publicado o livro Biblioteca Nacional
de Brasília: pesquisa e inovação (Thesaurus, 2011) com a chancela da UnB
e da Universidad Complutense de Madri. Queria deixar registrado o que
havíamos conquistado, com resultados de pesquisas, projetos em
desenvolvimento, uma prestação de contas. Temíamos a “distritalização”
da instituição, entendendo que Brasília é Distrito Federal por ser a
Capital da República, além de dedicar-se à população local… Deve ter
sido a gota d’água… O Secretário me convocou e anunciou que estava me
exonerando para atender a um pedido meu!!! Ionesco não criaria uma cena
tão absurda!!! E saiu anunciando que lamentava a minha saída…
FM: É vergonhoso, porém é a cara do Brasil. Algumas poucas notas na
imprensa informam que a Biblioteca Nacional de Brasília não abriu ainda
seu acervo ao público por dois motivos: a falta de recursos financeiros
e o deslocamento de seu quadro funcional para atender a outras atividades. Este tem sido o ambiente real?
AM: De fato. O Ministério da Cultura repassou ao GDF 2,2 milhões para
completar a infraestrutura que permitiria a catalogação de grande parte
do acervo e sua disponibilização ao público, em 2011. Questões legais e
burocráticas obrigaram a devolver o dinheiro. O novo Secretário tem
criado dificuldades para reabrir o convênio com o MCT para termos os
recursos com os mesmos objetivos, por questões “territoriais”, espaços
de poder… E não injeta os recursos, e não é possível cumprir metas e
cronogramas. Em breve a imprensa vai fazer a cobrança e a população
prejudicada vai protestar. Por falta de condições para o processamento
técnico do acervo, baixou a produtividade e passa boa parte do tempo em
atividades burocráticas de um programa chamado FAC, que apoia atividades
culturais, muitas meritórias, outras por apadrinhamentos, como só
acontece nestas esferas do poder.
FM: Considerando impossibilidade de teu regresso, o que se pode imaginar
é que a Biblioteca Nacional tende a transformar-se em uma instituição
fantasma. Isto é possível?
AM: Virou uma repartição pública voltada para um público restrito, mas a
conta não vai fechar e vem uma crise. O Governador anunciou planos
ousados de inclusão digital, de transformação de Brasília em cidade
digital, com metas ambiciosas de inclusão digital e capacitação
informacional e a Biblioteca Nacional seria chave no processo. Não vai
ser com eventos promocionais que vão chegar lá. Estamos na era da
comunicação extensiva, das redes sociais, da criação coletiva e
solidária, do acesso aberto à informação, da multiculturalidade e da
multivocalidade e são necessárias mudanças de paradigmas: queimar
etapas, evitar desperdícios e apostar na pesquisa e na inovação.
FM: Quais os teus planos atuais?
AM: Voltei à universidade para pesquisar e orientar alunos de doutorado.
Vou ampliar e modernizar o Portal de Poesia Iberoamericana, iniciar a
editora POEXÍLIO de livros especiais e de arte, participar mais de
festivais internacionais de poesia, já que estou aposentado e recebo
muitos convites. A vida que eu pedi a Zeus. |
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Floriano
Martins (Ceará, 1957) é poeta, editor, ensaísta e tradutor. Dirige a
Agulha Revista de Cultura (www.revista.agulha.nom.br) e colabora
semanalmente com o DC Ilustrado com uma série de entrevistas que
futuramente reunirá em livro intitulado Invenção do Brasil. Contato:
arcflorianomartins@gmail.com.
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© Maria Estela Guedes
estela@triplov.com
PORTUGAL |
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