um
frio que, associado à luz da manhã, se converte em símbolo de um límpido
e inaugural olhar sobre o mundo
I
o
percurso que conduz ao movimento, que leva o actor a compreender a
linguagem em jogo, produz-se pela via dos sentidos ao submeter-se
espontânea e cuidadosamente a estímulos diversos que lhe permitam
observar as reacções naturais do corpo - enquanto organismo - através de
um trabalho com ritmo, com materiais, com o som ou, com a cor.
e
para
que possa entender a dinâmica de um som ou uma cor determinada, é
elemento fundamental
a luz.
aquela luz que adquire formas num diálogo com o espaço, com o movimento
- a luz que sublinha a imagem que se quer transmitir ao espectador.
a luz
e a penumbra jogam.
permitem apontamentos que recriam o abismo, o precipício (onde o
movimento se perde nos limites do espaço) - apontamentos que confundem e
surpreendem o espectador.
e
é o
olhar do “artista” - enquanto operador do processo - que lhe dá dimensão.
as
regras podem ser subvertidas (alteradas) pela luz. a exploração dos
efeitos podem permitir verdadeiras esculturas luminosas, misturas de
tons…
de
uma forma geral utiliza-se a luz para iluminar objectos, actores…
poucas são as vezes em que se considera a luz em si.
daí
que não experimentemos, tomemos partido do seu real poder. aquele poder
que nos permite o entendimento da dinâmica de uma cor determinada ou dos
materiais utilizados na acção…
a luz
que nos ajuda a sentir
o
tempo
a
chuva
o
vento…
não a
luz enquanto mera experiência cientifica ou espiritual - falamos da luz
como contributo cultural (porque estético) que permite a viagem por
entre acções que implicam o drama em espaço físico dinâmico e liberto.
um
espaço que “exige seja ocupado e que permita uma linguagem própria e
concreta” como diria antonin artaud.
portanto, a luz é contributo incontestável para a concepção de um espaço
de diálogo, aberto aos sentidos. um espaço independente e livre de
qualquer imposição. aberto a toda e qualquer linguagem. aberto à
espontaneidade e á criatividade que irrompe do corpo (todo) do actor -
enquanto sacerdote do ritual. do drama.
II
deve-se,
pois, olhar a luz como algo que - como na aproximação dos faróis de um
carro que nos pode atropelar
nos
faz ficar imóveis e deslumbrados.
então
devolvemos ao espectador o que ele transporta consigo
devolvemos ao espectador uma obra que provoca um despertar
III
muitas experiências religiosas explicam-se utilizando um vocabulário de
vazios de luz - mas a arte pode e deve conduzir o homem ao espiritual -
não necessariamente religioso.
e
o
espiritual tem sido historicamente o objectivo e o território da arte.
as
religiões usam e abusam da arte para se aproximarem do terreno
e
a
arte deve fazer crescer o espectador ou pelo menos recordar coisas para
além do visual e do terreno.
e,
ao
mesmo tempo,
o
operador do processo sabe que os sentidos podem evocar a espiritualidade
mas não nos transportam necessariamente para aí.
IV
com a
luz as regras mudam - misturar os tons luminosos... não é um projecto
espiritual ou cientifico é educação, é cultura.
a luz
é embrionária - nos passados séculos não havia instrumentos musicais
sufisticados e foram possíveis grandes sinfonias. ter à disposição
instrumentos, não implica boa música… - obtemos melhor luz quando
dispomos de um bom olhar
e
material aceitável.
m.
almeida e sousa |