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REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
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«A poesia não tem presente; ou é
esperança ou saudade». Estas palavras de Camilo Castelo Branco, que
também foi poeta embora mais conhecido como polemista irascível e
novelista apaixonado, aplicam-se ao livro de poemas que hoje nos cabe
apresentar. Margarida Gama de Oliveira sabe que todo o poema digno desse
nome aspira a ser a grande ponte entre dois mundos separados pelo tempo,
pela distância e pela morte.
O poema, tal como a oração, liga de
novo o que a erosão da vida se encarregou de separar. O poeta é o
sacerdote desta estranha liturgia celebrada numa folha branca de papel
(qual altar) com uma caneta, qual hissope com lágrimas no lugar da água
benta. |
DIREÇÃO |
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Maria Estela Guedes |
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JOSÉ
do
CARMO FRANCISCO
«Da cidade, do campo,
dos
sorrisos»
de Margarida Gama de Oliveira |
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José do Carmo Francisco |
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O ponto de partida deste livro é a
relação entre a Natureza e a Cultura. O seu primeiro poema é um
programa: Naquele vale / a casa onde nasci / A casa onde senti / que
havia sol / mãe / um mar de pão / um pai / a dor / leite e amor / água e
mel / e uma caneta preta para escrever a vida. O poema olhou à sua
volta e descobriu uma paisagem povoada pela chuva e pelos frutos
silvestres: Gosto da chuva / sentada / na cadeira da varanda / a
conversar comigo (…) Gosto de violetas roxas / perdidas nas
levadas (…)
Ao lado da paisagem vegetal o poema
registou, na sua particular cartografia, o povoamento humano, os ofícios
a desaparecer, como o do cesteiro ou do moleiro:
E aquela mó / para quem a eira /
as velas / o moleiro / e o trigo magoado / eram mesmo / só passado.
«Terra de Mel» é um poema que junta
de modo hábil a Natureza e a Cultura. O motivo repetido deste poema é a
ligação entre o mel (produto da terra) e o coração (produtor de
sentimentos). Partindo de uma aldeia na moldura da serra (o casario,
as ruas, o rio) o poema alcança a memória da Bíblia (a terra do
leite o do mel) sem esquecer o Novo Testamento quando refere a
triste traição de Judas.
No poema se registam duas
geografias; uma geral (Senti a Primavera desde a primeira hora) e
outra particular: Na minha pele / sinto o calor da eira / e a pereira
/ em flor.
Mas também se revelam viagens
dentro dos livros como no poema «Na sala sem lareira» - a autora viveu
em África como professora e regressou a África nas páginas de um livro.
Não por acaso essa ligação surge a seguir no poema «Amo-te África»:
Canto as tuas / mansidões / teus
jorros / de sangue quente / continente de poeiras / cor de nuvens. / Que
o teu viço de palmeira / aqueça o rosto frio da Europa.
No contraponto do registo mais
rural surge um poema citadino:
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Tomo o tom rosa das casas / e
caminho as praias de sol de Oeiras. / E as minhas beiras / brandos
beirais de andorinhas / trocam os casais / e as madressilvas / pelos
areais do mar / em que os olhos / mergulham confundidos / a chorar.
Na lucidez de quem descobre os
erros de ortografia do mundo o poema invoca os poetas do passado numa
espécie de memória justificativa do seu artesanato invisível:
Sem Catulo, sem Horácio, sem
Camões / Só tu Cesário me vais acalentar / Naquele teu jeito caloroso de
Verões / E em cidades, em ruas, em lugares / Eu vou de encontro a outros
corações / Perfumo-me de cores e sei cantar. |
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Nunca se fechando no «eu» embora
recorra ao «eu» como ponto de partida (mulher vivida, sofrida já de
tanto amar) o poema procura sempre o «nós», o olhar colectivo como
em «O meu país»: Capaz, capaz disso tudo és tu / que fazes do
horizonte o teu sacrário / das tuas mãos em concha o teu baú / e até
chamas destino ao teu calvário.
Só assim se justifica a revelação
pública de um trabalho pessoal. Neste livro revejo a feliz definição de
Maria Eulália de Macedo sobre o trabalho poético: «A poesia é estar
atento e aberto ao que somos e nos ultrapassa. É uma espécie de fugidio
sacramento, a exigente voz das coisas que são verdade – para além da
verdade das coisas». |
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JOSÉ DO CARMO FRANCISCO (Portugal,1951).
Prêmio Revelação da Associação Portuguesa de Escritores. Colaborou no
Dicionário Cronológico de Autores Portugueses do Instituto Português do
Livro. Poeta. Possui uma antologia da sua poesia publicada no Brasil.
Jornalista, colaborou entre outros em "A Bola", "Jornal do Sporting",
"Remate", "Atlantico Expresso"... Autor de "Universário", "Jogos
Olímpicos", "Iniciais", "Os guarda-redes morrem ao domingo", etc., bem
como de antologias como "O trabalho", "O desporto na poesia portuguesa e
"As palavras em jogo", entre outras. É secretário da Associação
Portuguesa de Críticos Literários.
Vive em Lisboa.
Contacto: jcfrancisco@mail.pt |
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© Maria Estela Guedes
estela@triplov.com
Rua Direita, 131
5100-344 Britiande
PORTUGAL |
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