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REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
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I
Tanto no Brasil como em Portugal a
República reinstalou a instabilidade política, depois de uma fase sem
golpes, quarteladas e outras formas de manifestação política fora dos
meios institucionais. Nos dois lados do Atlântico, caminhou-se em
direção a sistemas ditatoriais, ambos denominados da mesma forma: Estado
Novo. As semelhanças, porém, param por aí, como mostra o professor
Leonardo Prota, doutor em Filosofia pela Universidade Gama Filho (UGF),
do Rio de Janeiro, e diretor-executivo do Instituto de Humanidades, de
Londrina-PR, em seu ensaio “Estado Novo no Brasil e em Portugal –
características distintivas no processo de constituição”, apresentado
durante o VIII Colóquio Antero de Quental, cujas atas foram reunidas na
revista Estudos Filosóficos, do Departamento das Filosofias e Métodos da
Universidade Federal de São João del Rei (UFSJ)-MG, nº 3, julho/dezembro
2009. |
DIREÇÃO |
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Maria Estela Guedes |
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ADELTO GONÇALVES
Estado Novo
no Brasil
e em Portugal |
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Adelto Gonçalves |
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Em ambos os casos, ocorreram
soluções de força, mas os regimes assumiram feições diferentes. No
Brasil, superada a fase de insurreições armadas nos anos 20 e derrubada
a chamada República Velha, com a chegada ao poder de Getúlio Vargas
(1882-1954), um latifundiário e ex-ministro da Fazenda do governo
anterior, o sistema vitorioso seria o positivismo, agora chamado de
castilhismo, devido ao fato de que a personalidade política que o
implantou na província do Rio Grande do Sul chamava-se Júlio de
Castilhos (1860-1903). Prota lembra que a revolta militar de 1930 contra
a elite paulista – constituída basicamente por cafeicultores e
associados – partiu do Rio Grande do Sul, com a participação de menor
relevância de Minas Gerais e de alguns Estados do Nordeste.
Vargas ainda tentou levar adiante seu
projeto (ou falta de projeto) com um governo rotulado de provisório,
postergando por todos os meios o reordenamento institucional, nomeando
interventores militares nos Estados. Até que, em 1932, a elite paulista
conseguiu organizar um arremedo de resistência que, outra vez,
fracassou, ainda que tenha obrigado o governo golpista a admitir a
convocação de uma Assembléia Constituinte, que aprovou uma nova
Constituição, a de 1934.
Insuflado pelos ventos que vinham da
Europa em favor dos sistemas totalitários e o conseqüente encurralamento
do sistema democrático, Vargas aproveitou-se, em 1935, de uma ridícula e
estouvada tentativa de assalto ao poder pelos comunistas para decretar o
Estado de Guerra, ignorar as imunidades parlamentares e assumir de vez
seus pendores ditatoriais. Permitiu, porém, que, em 1937, houvesse
campanha eleitoral até que, em novembro daquele ano, deu um novo golpe
de Estado, fechando o Parlamento e proibindo os partidos políticos.
Estava implantado o Estado Novo brasileiro.
Em Portugal, como observa Prota, o regime
totalitário nasce também do fracasso do sistema representativo
democrático, considerado incapaz de resolver os conflitos sociais. Tendo
nascido de um golpe contra o sistema monárquico, a República portuguesa
viveu anos de instabilidade, inclusive com a participação de militares
na política. Até que em 1926 uma insurreição deu forma a um novo regime,
o Estado Novo, consagrado na Constituição de 1933.
No bojo desse movimento, o professor
António Oliveira Salazar (1889-1970), da Universidade de Coimbra, que
entrara no governo chefiado pelos militares como ministro das Finanças
em 1928, assume-se como a principal liderança para colocar em prática um
regime forte. O governo subordinava-se apenas ao presidente e sua
permanência não dependia da Assembléia. Os partidos políticos foram
abolidos e, em seu lugar, passou a funcionar uma organização chamada
União Nacional, com membros escolhidos por votação direta, à maneira
integralista. |
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II |
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Entre outros excelentes trabalhos apresentados durante o Colóquio, está
“O novo conceito de Era Vargas – sua fundamentação teórica”, do
professor Ricardo Vélez Rodríguez, do Núcleo de Estudos Ibéricos e
Ibero-Americanos da UFSJ, também doutor em Filosofia pela UGF, que
recupera a fase parlamentarista de Getúlio Vargas, mostrando-o como um
defensor intransigente do regime castilhista, que considerava legítimo,
“porquanto inspirado na verdadeira ciência social – o comtismo – e
democrático, porque fundamentado no voto proporcional, aberto a todas as
opiniões”, embora não deixasse de reconhecer que se tratava de um regime
de força.
No poder, porém, o caudilho Vargas
entraria em atrito com os caudilhos gaúchos Borges de Medeiros, Flores
da Cunha e outros. Mas acabaria por buscar soluções negociadas quando os
adversários eram de grande porte, sem condições de serem esmagados, como
fizera com a oposição comunista ou com vozes dissonantes entre os
letrados da classe média, de que o escritor Graciliano Ramos (1892-1953)
seria o melhor exemplo. Diz o filósofo que Vargas, em sua fase madura,
já no poder, projetou o positivismo, o darwinismo social e o
saint-simonismo de sua primeira formação.
Aliou a isso uma extraordinária
habilidade política, que só encontra paralelo hoje em Luiz Inácio Lula
da Silva. Em outras palavras: em vez de lutar contra os fatos e buscar
as reformas efetivas, sempre preferia contar com as exigências da
realidade. Para melhor exemplificar essa trajetória, Vélez Rodrigues
transcreve o princípio do darwinismo social exercitado por Vargas em seu
Diário (Rio de Janeiro, FGV, 1995, vol.1, p.486-487): “Vencer não é
esmagar ou abater pela força todos os obstáculos que encontramos—vencer
é adaptar-se (...); adaptar-se quer dizer tomar a coloração do ambiente
para melhor lutar”. Se se colocar nestas palavras alguma metáfora
futebolística, ninguém dirá que este pensamento não foi externado por
Lula da Silva. |
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III |
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Em outro trabalho que assinou com
Antônio Paim, do Instituto de Humanidades, “A sobrevivência do
liberalismo na cultura luso-brasileira”, Vélez Rodríguez faz uma análise
do Brasil de hoje, reconhecendo que as administrações petistas vêm
prejudicando o aperfeiçoamento da representação mediante práticas que
considera abusivas na negociação política. E defende que um governo
representativo se fortalece também com a melhoria da escolaridade,
observando que a baixa escolaridade está associada à sobrevivência do
patrimonialismo.
O que, aliás, reflete-se no baixo nível
cultural e educacional da maioria dos candidatos a cargos legislativos e
executivos. É de lembrar que a tragédia brasileira, hoje, é o chamado
ensino fundamental, que vem sendo negligenciado desde a Era Vargas, para
se dizer o mínimo. Isso fica provado na pesquisa feita por Alberto
Carlos de Almeida e comentada por Paim e Vélez Rodrigues, segundo a qual
quanto mais baixa a escolaridade mais as pessoas tendem a considerar
legítimo o uso de cargo público em benefício próprio. Ou ainda são
favoráveis à censura a programas de TV que façam críticas ao governo. É
de lamentar também que, levando-se em conta a baixa qualidade do ensino
no Brasil, o tempo de escolaridade já não significa muito, pois é fácil
encontrar jovens ou pessoas maduras semi-alfabetizadas que conseguem se
matricular em cursos superiores.
Na análise que faz das conclusões
fundamentais do Colóquio, o seu organizador, o professor José Maurício
de Carvalho, do Departamento de Filosofia da UFSJ, doutor em Filosofia
pela UGF, destaca a desconfiança no liberalismo como a razão da
implantação da República no Brasil e em Portugal, à qual se soma o
esgotamento do Segundo Reinado aqui e o desmoronamento das formas
partidárias de representação política e o messianismo do discurso
republicano, que apresentou o sistema como resposta ao sentimento de
decadência em terras lusas. Na análise das tradições socialistas,
Carvalho observa que em ambos os países os partidos socialistas se
aproximaram da democracia representativa, embora no Brasil reste certa
ambigüidade doutrinária no que se refere à adesão plena a tal sistema.
O Colóquio reuniu ainda trabalhos de
Alexandro Ferreira de Souza (Universidade Federal de Juiz de Fora-UFJF
), Marco Antonio Barroso (UFJF), Pedro Calafate (Universidade de
Lisboa), António Pedro Mesquita (Universidade de Lisboa), José Esteves
Pereira (Universidade Nova de Lisboa), Humberto Schubert Coelho (UFJF),
Bernardo Goytacazes de Araújo (UFJF), Arsênio Eduardo Corrêa (Instituto
de Humanidades), Manuel Felipe Canaveira (Instituto de Filosofia
Luso-Brasileira-Portugal), Tiago Adão Lara (UFJF), Paulo Ferreira da
Cunha (Universidade do Porto), Rafael César Pitt (UFJF), Ernesto Castro
Leal (Universidade de Lisboa) e Elizabeth Santos de Carvalho
(Universidade Federal do Rio de Janeiro). |
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ESTUDOS FILOSÓFICOS: ATAS DO VII COLÓQUIO ANTERO DE QUENTAL.
Revista do Departamento das Filosofias e Métodos (Defime) da
Universidade Federal de São João del Rei. São João del Rei-MG, , nº 3,
julho-dezembro 2009. E-mail:
dfime@ufsj.edu.br |
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Adelto
Gonçalves (Brasil)
Doutor em Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo e
autor de Gonzaga, um Poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova
Fronteira, 1999), Barcelona Brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999;
São Paulo, Publisher Brasil, 2002) e Bocage – o Perfil Perdido (Lisboa,
Caminho, 2003). E-mail: marilizadelto@uol.com.br |
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© Maria Estela Guedes
estela@triplov.com
Rua Direita, 131
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