Tentou olhar em volta: a cadeira
contudo, tapava-lhe a visão perfeita
do que estaria na sala, pela porta
um pouco menos que escancarada. Assim
se decidem movimentos minúsculos. Pensou:
resolvi-me
a procurar vestígios de, por exemplo, antepassados
residentes entre folhagens e silêncios.
Exemplificando:
perto duma bomba de gasolina, ao rés da estrada
mais para Oeste, parar por um momento. Porque
em boa verdade, não há queimaduras na boca, isso
não passa
de frase encolhida de vate relho. Nessa altura
sentir a dor habitual, o perfeito saber de quem
sempre desconhecerá tetravôs, ignóbeis
sedimentações de poeira, ceras, polpas de frutos.
Arrastam-se, minha pequena, por sobre as coisas
voos de aves, sensações
do não habitual, do não desfeito: lembrar-te-ás de
mim
fígado contra fígado
nesse teu mapa de palavras, nessa
tua recordação despelada? Recordarás
este e aquele nome de cidades
o cheiro do café a ferver sobre um pulso
o instante repetindo-se sobre os meus pulmões?
Nunca fiz ou tentei
fazer um poema sobre Mozart. Lambo a pequena ferida
sobre o terceiro dedo, algo
provém de salas onde às vezes
se esquecem ora livros, ora peças de roupa: e essa
é a música feita na pleura e nos ossos
e alguém bate à porta
e um som de martelo vibra
e alguém procura provavelmente numa gaveta um
objecto
e é de novo o princípio da noite
mesmo no chão, mesmo ao pé dos muros altos. |