REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências


Nova Série | 2010 | Número 06

 

É uma sensação curiosamente estranha. O finito ficar ainda mais finito. Quando perdemos um Tom Jobim, quando se despede de nós um Carlos Drummond de Andrade, a gente fica com a sensação de precariedade ainda mais à flor da pele. O existir torna-se um sopro que... de um instante para o outro pode não mais acontecer. O existir torna-se precário em toda a sua totalidade. Olhamos ao redor e percebemos o precário da própria vida. E agora fico sabendo de José Saramago. Deixou de existir. Tornou-se radicalmente precário.

Pouco me importa se ele tinha 87 anos. Pouco me importa o estilo  ser assim ou assado. Saramago é singular. Tem coisa de homem raro nele. Tenho certeza que Saramago é daqueles escritores que leva junto com ele o homem José Saramago. E isso torna a perda ainda mais perda. Fica-se sem porquê. É uma despedida sem aviso, afinal tudo existe, julgamos nós tolamente, para sempre existir. É que a força de uma vida não pode ser medida. Logo, ilusoriamente ( ou seria necessariamente?) infinita. E uma despedida toda especial. Despedida (quem sabe?) de valores e ideais realmente importantes . A vida se empobrece e a gente olha em volta e não sabe nem com quem comentar a morte. Afinal, estamos em Copa do mundo 2010 e os olhos, numa espécie de cegueira pós-saramagueana, estão voltados à pequena esfera que passeia pela grama  e que se reproduz em todos os lares  deste planeta um dia já infinito...

DIREÇÃO

 
Maria Estela Guedes  
   
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LUÍS ESTRELA DE MATOS

 

José Saramago

  e a finitude indesejada

 
   
   
   
   
   
   
   
   
   
   
   

Qual é a perda, então? Parece que José Saramago  era uma resistência a essa grande corrente que só diz sim : sim à violência planetária, sim à destruição das culturas, sim ao enxugamento visível do espaço afetivo dentro das relações humanas e também do espaço afetivo com a gente mesmo. Sim à mercantilização de tudo e de todos, sim ao Deus dinheiro, à Deusa do Poder. Sim a tudo que seja fácil, tranqüilo, descartável e, de preferência, indolor. O prazer mais fútil e veloz no lugar de qualquer coisa ( ainda que minimamente pensada...). Alguma coisa estava fora do lugar (e continuará.. sempre?) e Saramago nos dizia isso através de seus livros... O não tem suas máscaras...

Enfim... O finito mais finito ainda. É como se o universo encurtasse-se um pouco mais e a gente não soubesse o que fazer do instante seguinte. É como se toda a labuta diária perdesse o sentido. Corre-se tanto, não é? A morte de Saramago é aquela paradinha, em  um dia de 24 horas  de fúria metropolitana , nos dizendo que as coisas não são bem assim. Talvez, pense algum possível leitor,  que eu esteja exagerando. Mas, complementando também, só posso falar a partir de mim. Este mim que ficou hoje, aos 18 de junho de 2010, bem mais finito do que gostaria. É assim mesmo. O gosto de finito na boca e a sensação de precariedade em todos os poros. É assim mesmo.

Será? 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Na foto: José Saramago
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Arditura
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Luis Estrela de Matos (Brasil)
Ensaísta, escritor e  professor universitário.
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