REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências


Nova Série | 2010 | Número 06

   

 

Epigramme [pour E.]

 

J'ai le rêve impossible de faire de ma folie
une espèce de courage parfait et immobile
fragile, imperceptible et accroupi
qui puisse me parler sens cesse
de la longueur inavouable de la tentaculaire justesse

des routes

de l' oubli...

 

 
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Maria Estela Guedes  
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CARLOS M. ACABADO

 

Poemas para E.

Carlos M. Acabado.......

 
 
 
 
 
 
  La Rose/L' Éclat - poème sans nombre pour E.

 

Cette voix d' argent rapide et léger
ou ce regard de ciel rythmique et rouillé
ce feu absent ou ce soleil désemparé

[cette tendresse écarlate et enfantine
cette flamme nue, immobile et féminine]

ce vent fidèle, ces blés
ces bois ivres et répétés
ces villes ignorantes et abandonnés
ces souvenirs transparents
touts conjugués
cette obéissance toute bleue cet espace ouvert déraciné
cette nuit infecte et brusque, saccadée
cette nature isolée
ce soleil intérieur, violemment discipliné
cette bouche ou boue surprise et lourde
ligotée
cette âpre dignité
cette belle saison des cauchemars
annoncés
ce frisson couteau de l' aube écrasée
ce moi mis à l' épreuve, transformé

ce pauvre cœur éphémère vertigineux

et grésillé
ce pygmée creux ce sourire de femme aux oiseaux d' automne
évadés
ce colis un peu trop luisant
[ou géographique?] de la fumée
ces belles rides acides ciselés
cette blessure éternelle de la folie mi-dévorée
cet amour [si?] propre décrété
ces branches endormis de cet amour coupée
cette enfance hurlante et dévidée
où je vais me réveiller
cette jeunesse en plâtre et pluie
qui je vais déshabiller
cette mort seule solitaire dépouillée
cette femme double enceinte sacrifiée
cet herbe que rit aux éclats
de vert d'un vert dur ressuscité

[ce paysage disciple fidèle de l' absurde

[et] de la perfection
cette présence illusoire
de l'absence
ce rien éternel et fond
se présentant...]

cet aurore aux sanglots glaciales et pointés
cette poignée ou cette ivresse de vents
chavirés
ces mystérieuses paroles ignorées
ces cris si purs en acier
de monstrueuses villes fulminées
ces rêves fauves blancs dévastés
ce faux temps demi-mûr et renversé
ce jour lâche accroupi et abîmé
cet observance épuisée
ce moi persistent, nocturne et sombre
vidé
cet étrange hypothèse de rose ou de lys déshabillé
ce père violent et meurtrier
cette montagne distante échafaudage de l'été
ce bonheur pillé ce blanc faible
et a peu près divisé
cette rue blonde qui mûrit de plusieurs soifs accumulées
cette terre courbe et patiente presque étouffée
qui sommeille et bouillit étourdie et saccagée
ces herbes exactes et creusés
ces cris si jeunes brulés
cet enfant improbable comblé
cet habitude imperceptible de mourir
en langages inconnues y renfermé
cette voix souple réfugié
dans sa gorge de feux éparpillés
ce poids proche lourd et violé
cette rose étincelante multipliée

Ces jardins de cris ou ces soupirs spiralés
Cette cerisaie de jours cette bouffée de noms
de nouveaux nés

et puis la vie la terre
la nature qui ne s'a arrête toujours pas:
je parle de
cette métamorphose secrète,
totale et parfaite
de l' aurore en toi.

 

  La Rose/L'Éclat [Versão/Repoetização]

 

Esta voz de prata rápida---muito breve
---ou este olhar de céu rítmico oxidado
esta labareda ausente ou este sol meio derramado

[esta ternura escarlate e infirmada
esta chama nua, imóvel, feminina]

este vento tão festivo e tão assíduo estes trigos
estes bosques ébrios, repetidos
estas cidades imaginárias crespas,

estaladiças e desertas
esta memória transparente
declinada
esta obediência azul quase feroz
esta cor prestes a explodir
este espaço sem espaço e sem raízes
esta noite desviada e brusca
sacudida
esta natureza deserta, imolada
de partida
este sol interior ciciado
esta boca e esta lama surpresas, tão pesadas

[o manietado lodo absolutamente imóvel

no centro do outono

ou da memória]

esta áspera dignidade ou
esta bela estação de veneráveis pesadelos

[o trémulo aço da madrugada acabada de es/colher]

este eu a toda a prova transformado
este pigmeu esventrado este sorriso de mulher
esta voluta e esta solidão de ave recém-cortada

[o vulto geométrico da brisa crepitando na espuma das cabeças
áureas das searas]

estas soberbas rusgas de ácido cinzel
esta ferida sem fim da loucura até meio devorada
este amor [tão] próprio e tão claro,
estes ramos dormentes de um amor de cobre ou de cobra,

endurecido

[a chaga viva---a cutilada---desse amor]

esta infância que uiva de branco e de sono amputado
esta idade-solidão onde acordarei talvez de pó um dia
esta juventude de gesso e de água
que me apresto a desnudar
esta morte [ou estas mortes] a solitária morte despejada
esta mulher múltipla imolada
esta erva que cresce em grandes haustos verdes
de um verde túmido estranhamente adormecido.

[Esta paisagem discípula dócil do absurdo,
esta presença ilusória da ausência
este nada intacto onde me enleio,
táctil e fundo---e me resto
da aromática ciência o abraço desfeito e funesto]

Esta aurora de soluços, glaciais, pontiagudos
Esta mão-cheia de ventos naufragados
estes vermes súbitos dos olhos

limitados
estes secretos conciliábulos
ignorados
estes gritos de aço embaciados
das cidades fulgurantes de bairros amestrados
estes sonhos-fera brancos devassados
estes dias e noites cobardes ancorados
esta vigília exausta estes sonos suprimidos
emboscados
este eu persistente, nocturno e cego
esta tão insólita hipótese de flor
de lírio assente e cru
esta rua ruiva que matura no silêncio
de múltiplas sedes acumuladas
este pai violador este sangue imperfeito e nu
esta montanha andaime de estiagens concentradas
estes gritos jovens calcinados
este hábito imperceptível de morrer
em idiomas estrangeiros esventrados
esta voz este peso estes fogos ossificados
estes jardins que uivam este pomar de murmúrios sitiados
estes dias pela própria mão
da primavera estrangulados

esta noite que ronda e espreita a luz a toda a volta
a tarde feroz, a noite líquida a luz nas mãos a dor triunfal, gasosa


A aurora cedendo bruscamente o seu lugar à flor
a madrugada espessa e pálida abrindo triunfalmente seu peito à rosa!

 

 

Carlos Machado Acabado
Portugal, Lisboa, 12.02.45
Como ensaísta, colaborou em diversas publicações: "Seara Nova", "O Professor", "Jornal da Educação", "Diário" e outras. Está antologiado num dos volumes de "Homo Ludicus". Como artista plástico, expôs em Montemor-o-Novo e no Seixal (aqui com uma individual que intitulou "Um Não-Alexandre Onírico" em homenagem ao poeta Alexandre O'Neill). Esteve presente em diversas bienais consecutivas da Festa do "Avante".    
 CONTATO:
 c.acabado@gmail.com

 

 

© Maria Estela Guedes
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