REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências


Nova Série | 2011 | Número especial
Homenagem a Ana Luísa Janeira

 

Ana Luísa Janeira
Foto de José M. Rodrigues

VISEU

BERÇO DE AFONSO HENRIQUES

 

João Silva de Sousa

EDITOR | TRIPLOV  
ISSN 2182-147X  
DIREÇÃO  
Maria Estela Guedes  
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Almeida Fernandes (*) dizia, há 20 anos, que os fundamentos da sua investigação, sem os quais ela seria inexequível, assentavam em duas premissas: 

- Uma, o conhecimento da data suficientemente próxima do nascimento de D. Afonso Henriques;

- Outra, a da residência de D. Teresa quando Afonso viu as primeiras luzes do dia.                                                                       

A data também é possível apurá-la pelas informações da época: tendo D. Afonso dois para três anos quando morreu seu pai, o Conde D. Henrique, cujo falecimento se verificou nos inícios de Maio de 1112, os factos aduzidos apontam para meados do Verão de 1109, o ano de nascimento daquele que viria a ser o nosso primeiro rei.

 
 
 
   
   
   
   
   
   
   
 
 

Quanto ao local de estada da Infanta D. Teresa, provou Almeida Fernandes que fora a cidade de Viseu. E, mais precisamente, os Paço da cidadela, no qual haviam já permanecido os monarcas leoneses (Ordonho II e Ramiro II).

Afastada da sua tese a hipótese de ter sido Guimarães o berço de Afonso Henriques, à actual cidade cumpre, naturalmente, festejar, como o faz há séculos, o facto de ter sido vila-berço da Nacionalidade, atendendo a que, nas suas proximidades, tenha decorrido a batalha de S. Mamede, donde saiu vitorioso, em 24 de Junho de 1128, D. Afonso Henriques sobre sua mãe, D. Teresa e o conde Femão Peres de Trava.

Doados os condados de Portugal e de Coimbra ao Conde, pai do nosso futuro primeiro rei, há que ter em conta uma questão de segurança.

Portugal não oferecia posições contrárias aos Condes, mas Coimbra que nutria um forte antagonismo a Portucale, seria cidade inseguríssima, com a sua arriscadíssima situação face aos Sarracenos, funcionando como uma autêntica barreira, por diversas vezes atacada, o que não sucedia em relação a Viseu.

Almeida Fernandes apresenta como Provas Directas do Nascimento de D. Afonso Henriques no Paço visiense, os seguintes factos:

1.º Não há, em número, uma tão grande quantidade de documentos exarados por D. Henrique e D. Teresa em alguma região que se aproxime de Viseu, o que denuncia uma certa predilecção pela cidade.  

2.º São as cartas de foral (e de confirmação) a Mangualde, Tavares, Sátão, Cota, Alva, Ferreira e a Viseu; ainda uma certa profusão de cartas de doação de imóveis na cidade e nos seus termos, a nobres e a não-nobres; são as cartas vassaláticas ou feudatárias em Viseu, seu aro e sua "terra", feitas a numerosos cidadãos e lavradores, proprietários...

Perante estes e outros factos, como, por exemplo, a extrema fidelização a D. Teresa por parte de Viseu e de castelos ao redor, a seu favor, quando foi banida do governo, não nos é também difícil entender a sua anterior preferência por Viseu, onde tinha bens de raiz próprios e a vassalidade demonstrada aí pelo seu povo.  

Então recuemos:  

- D. Teresa, pelo Verão de 1109, nunca se ausentou de Viseu, por um número bastante de casos em que devesse normalmente fazê-lo: 

Estaremos perante um caso de impossibilidade fisiológica que a privaria de estar presente a actos tanto oficiais como particulares. Era a aproximação do nascimento do filho que, prudentemente a imobilizava.

Vejamos:

a) D. Teresa não sai de Viseu para assistir à morte do pai, em Toledo, onde se encontrava a família imperial e o conde D. Henrique, seu marido, embora tivesse este de abandonar a cidade, de súbito, dada uma rebelião em Sintra. Afonso VI vem a falecer a 1 de Julho de 1109.

b) O arcebispo de Toledo, findas as exéquias, vem a Portugal, avista-se com os Condes em Viseu, por motivações políticas. Sabedor desta circunstância, o arcebispo de Toledo aguarda na cidade visiense, junto de D. Teresa, o regresso do Conde D. Henrique, ficando com eles o bispo de Viseu e o bispo eleito de Coimbra.

c) D. Teresa e D. Henrique haviam prometido à Sé de Coimbra a maior doação de sempre: a do Mosteiro de Lorvão, possivelmente no intuito de obterem protecção divina para a expedição a Sintra. Estaria o arcebispo em Viseu, porque D. Teresa não poderia deslocar-se, pelas razões já enunciadas, àquela cidade. Ficando o arcebispo com os condes, em Viseu, coube ao arcediago da Sé conimbricense a cerimónia da entrega de Lorvão à Catedral, através de uma escritura, já preparada com as firmas ou sinais de marido e mulher. D. Henrique esteve presente, D. Teresa manteve-se em Viseu. Rui de Azevedo, autor da compilação de grande parte dos documentos em que Almeida Fernandes se baseou dizia "não saber explicar" e muito menos a presença da comitiva visiense em Coimbra. Entre esta, o bispo de Viseu, e o seu presbítero notável, D. Teotónio. O bispo eleito de Coimbra e o seu prior mantiveram-se em Viseu, porque aí se encontrava o Arcebispo de Toledo, junto de D. Teresa. De regresso, a maior parte dos presentes em Coimbra deslocaram-se a Viseu, a fim de assistirem à aposição do sinal de D. Teresa no documento, como confirmante, pois o não pudera fazer no local. O texto é o mesmo, mas datado de Viseu.

Estes e outros argumentos poderiam aqui ser aduzidos como a confirmação do foral de Mangualde. Deveriam ter ido o conde e a condessa, tomar o juramento da outorga do diploma. Também não foram. Desta vez, nenhum deles foi. E Mangualde é tão perto. A firma existe e a data é de 1109.

Também o Arcebispo de Toledo veio a manter-se junto a D. Teresa, naturalmente para baptizar o Infante, o que seria vulgar fazê-lo quatro a cinco dias após o nascimento da criança.

D. Afonso Henriques nasceu, tudo leva a crer, pelos inesperados factos trazidos a lume, em Agosto de 1109, na cidade de Viseu, mas todo o Portugal lhe deve a independência em relação aos reinos de Leão e Castela.

 

 

(*) Nota lida em Viseu, aquando das Comemorações dos 900 Anos do Nascimento de D. Afonso Henriques (Viseu, 2009).

Veja-se A. de Almeida Fernandes, Viseu, Agosto de 1109, Nasce D. Afonso Henriques, com Introd. de Maria Alegria Fernandes Marques, fixação do texto, índice analítico e bibliografia por João Silva de Sousa, Viseu, Câmara Municipal e Fundação D. Mariana Seixas (Ranhados, Viseu), 2007.

 

 

 

 João Silva de Sousa (Portugal)
Docente da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa Académico  Correspondente  da  Academia Portuguesa da História e  Sócio Correspondente da Associação Portuguesa de Genealogia

 

 

© Maria Estela Guedes
estela@triplov.com
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