- Pois bem, meu senhores - disse o mais velho, que
parecia ter ascendente sobre os outros - Façamos então o ponto de
situação...o ponto em que estamos de momento. Pode começar você, Lestat...
- De momento, meu caro Vlad - disse repuxando a
boca bem desenhada o jovem louro e atlético - temos gente nossa bem
motivada em todas as cidades do globo. O discurso que lhes é comum insiste
num ponto: o nosso direito a dispormos dos nossos ritmos místicos, da
nossa… "ideologia" se assim me posso exprimir. É a tecla em que temos
batido sem desfalecimentos. A questão de sermos uma comunidade
perseguida...discriminada...ofendida. Creio que me faço entender!
- Bem visto! - ronronou Vlad Tepes com um luzir nos
olhos ardentes - E a nível de jornais, de gente que faz a diferença...como
páram as modas? Você, Sagramor, pode elucidar-nos?
- É p'ra já, meus amigos - preambulou o negro de
estatura elevada e de musculoso recorte na sua voz cantante e fascinadora
- Para já, os homens de negócios que estão à frente desse sector já se
juntaram em grande parte a nós. Intuiram que têm de ser compreensivos,
modernos, que tem de haver tolerância com o nosso…colectivo. E na classe
política e intelectual também existe um equilíbrio paralelo...Alguns dos
homens de topo e mesmo outros medianos já entenderam a razão dos nossos…
direitos. E são partidários do diálogo: já se começaram a desobstruir
reuniões… O próprio Jorge, o Rebelo, o próprio Soa…
- Não me venha com esses nomes! – cortou do lado a
mulher de estatura coleante, sensual, de cabelos e olhos negros retintos,
agitando a mão de unhas longas e pintadas de vermelho - Esses estão para
onde lhes dá a brisa, Sagramor!
- Não seja exagerada, Carmilla... - disse Vlad
Tepes censurando-a com algum vigor - Esse tipo de operadores sociais pode
ser bem útil à nossa causa. Os fala-baratos também têm lugar na nossa
demanda, não se esqueça. Tornam as massas maleáveis, compreendeu? E quanto
ao seu sector? Isso é que interessa, o resto...é fantasia!
- Bom - disse Carmilla von Karnstein - O elemento
feminino vai-se portando como se espera... Um pouco de moda, um pouco de
tratamento televisivo, um bocado de romantismo e de doçura para adequar as
meninges... Percebem?
O jovem Lestat riu com gosto, pondo à mostra os dentes brancos e fortes
como os de um lobo viril.
-
Certo, cara Carmilla, certo. Boa jogada! As senhoras também terão um
grande papel nesta opereta... A paz, a brandura de coração...O idealismo…
Também o usei com esmero lá nos lindos Estados do meu sul natal. Parece
que foi há três dias…e já lá vai uma eternidade!
- Porque bem vêem, meus amigos - disse Vlad Tepes
com discernimento - O importante é levar isto, por enquanto, com mansidão
e equilíbrio. O que se ganha com violências bruscas junto do grosso da
opinião pública? Isso devemos deixar, quando fizer falta, para as unidades
de combate...Elas sabem como agir. Quanto a nós é irmos pela diplomacia.
De contrário ainda nos aparece aí de novo esse metediço, esse violento do
Van Helsing e as suas exagerações. Não acham?
E na sala mergulhada em amena penumbra criada por pesados reposteiros de
veludo escarlate, em volta da magnífica mesa de carvalho escuro, as
cabeças dos confrades acenaram afirmativamente, como se fôssem uma só.
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Nicolau Saião –
Monforte do Alentejo (Portalegre) 1946. É poeta, publicista,
actor-declamador e artista plástico.
Participou em
mostras de Arte Postal em países como Espanha, França, Itália, Polónia,
Brasil, Canadá, Estados Unidos e Austrália, além de ter exposto
individual e colectivamente em lugares como Lisboa, Paris, Porto,
Badajoz, Cáceres, Estremoz, Figueira da Foz, Almada, Tiblissi, Sevilha,
etc.
Em 1992 a
Associação Portuguesa de Escritores atribuiu o prémio Revelação/Poesia
ao seu livro “Os objectos inquietantes”. Autor ainda de “Assembleia
geral” (1990), “Passagem de nível”, teatro (1992), “Flauta de Pan”
(1998), “Os olhares perdidos” (2001), “O desejo dança na poeira do
tempo”, “Escrita e o seu contrário” (a sair).
No Brasil foi
editada em finais de 2006 uma antologia da sua obra poética e plástica
(“Olhares perdidos”) organizada por Floriano Martins para a Ed.
Escrituras. Pela mão de António Cabrita saiu em Moçambique (2008), “O
armário de Midas”, estando para sair “Poemas dos quatro
cantos”(antologia).
Fez para a
“Black Sun Editores” a primeira tradução mundial integral de “Os fungos
de Yuggoth” de H.P.Lovecraft (2002), que anotou, prefaciou e ilustrou, o
mesmo se dando com o livro do poeta brasileiro Renato Suttana “Bichos”
(2005).
Organizou,
coordenou e prefaciou a antologia internacional “Poetas na surrealidade
em Estremoz” (2007) e co-organizou/prefaciou ”Na Liberdade – poemas
sobre o 25 de Abril”.
Tem colaborado
em espaços culturais de vários países: “DiVersos” (Bruxelas/Porto),
“Albatroz” (Paris), “Os arquivos de Renato Suttana”, “Agulha”, Cronópios,
“Jornal de Poesia”, “António Miranda” (Brasil), Mele (Honolulu),
“Bicicleta”, “Espacio/Espaço Escrito (Badajoz), “Bíblia”, “Saudade”, “Callipolle”,
“La Lupe”(Argentina) “A cidade”, “Petrínea”, “Sílex”, “Colóquio Letras”,
“Velocipédica Fundação”, “Jornal de Poetas e Trovadores”, “A Xanela” (Betanzos),
“Revista 365”, “Laboratório de poéticas”(Brasil), “Revista Decires”
(Argentina), “Botella del Náufrago”(Chile)...
Prefaciou os
livros “O pirata Zig-Zag” de Manuel de Almeida e Sousa, “Fora de portas”
de Carlos Garcia de Castro, “Mansões abandonadas” de José do Carmo
Francisco (Editorial Escrituras), “Estravagários” de Nuno Rebocho e
“Chão de Papel” de Maria Estela Guedes (Apenas Livros Editora).
Nos anos 90
orientou e dirigiu o suplemento literário “Miradouro”, saído no
“Notícias de Elvas”. Co-coordenou “Fanal”, suplemento cultural publicado
mensalmente no semanário alentejano ”O Distrito de Portalegre”, de Março
de 2000 a Julho de 2003.
Organizou, com
Mário Cesariny e C. Martins, a exposição “O Fantástico e o Maravilhoso”
(1984) e, com João Garção, a mostra de mail art “O futebol” (1995).
Concebeu,
realizou e apresentou o programa radiofónico “Mapa de Viagens”, na Rádio
Portalegre (36 emissões) e está representado em antologias de poesia e
pintura. O cantor espanhol Miguel Naharro incluiu-o no álbum “Canciones
lusitanas”.
Até se
aposentar em 2005, foi durante 14 anos o responsável pelo Centro de
Estudos José Régio, na dependência do município de Portalegre.
É membro
honorário da Confraria dos Vinhos de Felgueiras. Em 1992 o município da
sua terra natal atribuiu-lhe o galardão de Cidadão Honorário e, em 2001,
a cidade de Portalegre comemorou os seus 30 anos de actividade cívica e
cultural outorgando-lhe a medalha de prata de Mérito Municipal.
Blog : Ablogando, em:
http://ab-logando.blogspot.pt/ |