Perguntas de Floriano
Martins
1.
Diante da escassez das relações culturais entre
Brasil e Portugal, o que tem falhado sistematicamente na efetivação de um
diálogo entre as nossas culturas?
Respostas de ns
Creio que o problema depende dos que controlam
e orientam os ritmos – e que velam ou desvelam, conforme os seus
interesses específicos, o denominado facto cultural ou, por outras
palavras se assim se quiser, o relacionamento cultural. Ou seja: os
Estados – não sejamos tolos ou, no mínimo, ingénuos – vêem o facto
cultural, a Cultura, como um assunto precisamente de Estado. E dessa
óptica, ou opção, ou posicionamento, decorre muito dum todo: a fabricação
de ensejos e de protagonistas que servem fundamentalmente para essa mesma
entidade (o Estado) tirar dividendos que, a seu ver, são muito legítimos e
naturais. Como, em geral, ele vê nessa área apenas a oportunidade de ir
existindo conforme à sua própria estrutura - tanto lhe faz, digamos
lucidamente, que os protagonistas sejam de alto gabarito como não, o que é
preciso é que façam parte da classe que põe e dispõe “culturalmente” e que
sejam operosos e mexidos - à medida que o tempo corre, o pelotão e os
sucessos vão-se desvanecendo e transformando naquilo que de facto
corresponde ao seu real rosto enquanto “verbo de encher” o panorama:
sombras voláteis que já animaram a festa, que já desempenharam o seu
papel...e podem pois desaparecer no horizonte... Enquanto o Estado não
fizer o que deve, isto é: dar o dinheiro e ir-se embora, pois que a sua
presença só estraga as ocasiões nobres e dignas – tudo continuará mal.
Por outro lado, pode dizer-se que é suficiente deixar-se o facto e o
relacionamento cultural entregue a particulares? Não me parece, por esta
razão: geralmente imersos num ambiente duvidoso, os ditos “operadores
culturais” são em grande parte não mais que utilizadores sem grandeza,
muitas vezes pequenos jogadores intelectuais (mesmo que medalhados em
corridas de fundo ou estafetas pelos consabidos intelectuais orgânicos)
sôfregos apenas de prebendas, notoriedades ou ocasiões dum
protagonismo…cavalar – o qual seria muito legítimo se decorrente da
verticalidade e da dignificação cultural, por outras palavras: da sageza,
da alta qualidade e não dos companheirismos pessoais ou políticos.
Creio que o ambiente é um pouco como se a civilização dos dois lados do
mar concebesse que está prestes a desaparecer e agisse desta forma: para
quê estarmos a chatear-nos com isso da cultura real e aprofundada se,
afinal, isto está de resto? Vamos mas é gozar o ar do dia e quem vier
atrás que feche a porta... Só assim se entende que sejam tão
desajeitados, tão inábeis (ou serão apenas cínicos?) no estabelecimento
dum são relacionamento inter-margens! |
Nicolau Saião –
Monforte do Alentejo (Portalegre) 1946. É poeta, publicista,
actor-declamador e artista plástico.
Participou em
mostras de Arte Postal em países como Espanha, França, Itália, Polónia,
Brasil, Canadá, Estados Unidos e Austrália, além de ter exposto
individual e colectivamente em lugares como Lisboa, Paris, Porto,
Badajoz, Cáceres, Estremoz, Figueira da Foz, Almada, Tiblissi, Sevilha,
etc.
Em 1992 a
Associação Portuguesa de Escritores atribuiu o prémio Revelação/Poesia
ao seu livro “Os objectos inquietantes”. Autor ainda de “Assembleia
geral” (1990), “Passagem de nível”, teatro (1992), “Flauta de Pan”
(1998), “Os olhares perdidos” (2001), “O desejo dança na poeira do
tempo”, “Escrita e o seu contrário” (a sair).
No Brasil foi
editada em finais de 2006 uma antologia da sua obra poética e plástica
(“Olhares perdidos”) organizada por Floriano Martins para a Ed.
Escrituras. Pela mão de António Cabrita saiu em Moçambique (2008), “O
armário de Midas”, estando para sair “Poemas dos quatro
cantos”(antologia).
Fez para a
“Black Sun Editores” a primeira tradução mundial integral de “Os fungos
de Yuggoth” de H.P.Lovecraft (2002), que anotou, prefaciou e ilustrou, o
mesmo se dando com o livro do poeta brasileiro Renato Suttana “Bichos”
(2005).
Organizou,
coordenou e prefaciou a antologia internacional “Poetas na surrealidade
em Estremoz” (2007) e co-organizou/prefaciou ”Na Liberdade – poemas
sobre o 25 de Abril”.
Tem colaborado
em espaços culturais de vários países: “DiVersos” (Bruxelas/Porto),
“Albatroz” (Paris), “Os arquivos de Renato Suttana”, “Agulha”, Cronópios,
“Jornal de Poesia”, “António Miranda” (Brasil), Mele (Honolulu),
“Bicicleta”, “Espacio/Espaço Escrito (Badajoz), “Bíblia”, “Saudade”, “Callipolle”,
“La Lupe”(Argentina) “A cidade”, “Petrínea”, “Sílex”, “Colóquio Letras”,
“Velocipédica Fundação”, “Jornal de Poetas e Trovadores”, “A Xanela” (Betanzos),
“Revista 365”, “Laboratório de poéticas”(Brasil), “Revista Decires”
(Argentina), “Botella del Náufrago”(Chile)...
Prefaciou os
livros “O pirata Zig-Zag” de Manuel de Almeida e Sousa, “Fora de portas”
de Carlos Garcia de Castro, “Mansões abandonadas” de José do Carmo
Francisco (Editorial Escrituras), “Estravagários” de Nuno Rebocho e
“Chão de Papel” de Maria Estela Guedes (Apenas Livros Editora).
Nos anos 90
orientou e dirigiu o suplemento literário “Miradouro”, saído no
“Notícias de Elvas”. Co-coordenou “Fanal”, suplemento cultural publicado
mensalmente no semanário alentejano ”O Distrito de Portalegre”, de Março
de 2000 a Julho de 2003.
Organizou, com
Mário Cesariny e C. Martins, a exposição “O Fantástico e o Maravilhoso”
(1984) e, com João Garção, a mostra de mail art “O futebol” (1995).
Concebeu,
realizou e apresentou o programa radiofónico “Mapa de Viagens”, na Rádio
Portalegre (36 emissões) e está representado em antologias de poesia e
pintura. O cantor espanhol Miguel Naharro incluiu-o no álbum “Canciones
lusitanas”.
Até se
aposentar em 2005, foi durante 14 anos o responsável pelo Centro de
Estudos José Régio, na dependência do município de Portalegre.
É membro
honorário da Confraria dos Vinhos de Felgueiras. Em 1992 o município da
sua terra natal atribuiu-lhe o galardão de Cidadão Honorário e, em 2001,
a cidade de Portalegre comemorou os seus 30 anos de actividade cívica e
cultural outorgando-lhe a medalha de prata de Mérito Municipal.
Blog : Ablogando, em:
http://ab-logando.blogspot.pt/ |