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NICOLAU SAIÃO |
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AS CRÓNICAS EVENTUAIS
1. BREVE RELANCE SOBRE A MÚSICA
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A música, imagem da alma, como referiu
com propriedade Frederich Herzfeld, tem sido uma segura acompanhante do
Homem embora só tardiamente o tivesse sido da sociedade. Com efeito, se
nos lembrarmos que a primeira escola de música – ainda estabelecida em
termos muito artesanais – foi criada em mil e nove por Saint-Gall e que
o primeiro público musical (ou seja, reunido com o fito de ouvir a
música por si mesma) só começou a existir no ano de 1725, com a criação
por Philidor dos chamados “concertos espirituais”, começaremos a
perceber que, como uma âncora profundamente fixada no mar societário, a
música enquanto fenómeno ou, para dizer doutra maneira, a música
enquanto entidade criadora de acontecimentos partilhados por milhares ou
por milhões é um dado relativamente recente, tanto mais que os meios
técnicos de difusão só neste século se tornaram uma presença quase
absoluta.
Nos dias de hoje, em que vivemos rodeados
de sons e de timbres organizados de forma lógica (e relembro que foi
somente no séc. XVIII, com Mozart, que o timbre começou a ser utilizado
de modo significativo e criativo) é-nos difícil entender quanto a música
estava afastada das grandes massas populares como fruição habitual e
quotidiana. Como refere apropriadamente Konrad Riemann, para o geral da
população havia, nos dias de semana, as frases musicais ritmadas ao
jeito de pequenas canções que sublinhavam o trabalho feito ou a fazer;
no domingo era a canção entoada quando havia festas mas, acima de tudo,
a presença do canto religioso, frequentemente expresso mediante a
monódia gregoriana.
Antes disso – e a memória mais afastada
vai só até 40 mil anos, documentados no fresco de Ariège, na gruta dos
Três Irmãos em França – a música seria um sublinhar de fastos mágicos ou
ritos religiosos, pois era coisa de deuses e de alguns homens que se
haviam subtraído ao seu presumido controle.
A música era apanágio do mago, do
sacerdote ou do monarca, fracção espiritual que proporcionava um
contacto directo com as divindades e os seus áulicos.
Contudo, no nosso tempo a música
espalhou-se pelo imaginário, dando azo a muitas figurações sociais,
políticas e psicológicas. Goebbels, por exemplo, com a sua fina intuição
de patifório esclarecido, conhecia bem o peso que tem, ante os
basbaques, o desfilar dum cortejo precedido duma poderosa charanga e fez
disso um uso infernalmente manipulador. Também os nossos meios de
comunicação de massas manejam bem esta matéria: repare-se na forma
psicologicamente bem estudada com que nos bombardeiam os ouvidos,
repetindo até à saciedade temas de sucesso (as mais das vezes de pouca
qualidade) entoados por vedetas primárias que eles próprios criam.
Aliás, o consabido ambiente musical dito ligeiro dispensa-me de maiores
comentários.
Seja a música – como alguns pretendem –
uma variante da linguagem ou, como outros defendem, a abstracção da
linguagem levada às últimas consequências, a verdade é que constitui um
dado incontornável do nosso tempo. É, em suma, um dos componentes do
grande imaginário actual para além de ser, nos casos mais exemplares –
como por exemplo em Bach, Mozart ou Schubert – talvez um sinal com que a
“música das esferas” chega até nós para nos dar testemunho profundo do
rosto secreto da eternidade. |
2. IRENE, JOLMAR & COMPANHIA |
Têm-se tornado quase gente do meu lidar
estes e outros que, decerto pelos melhores motivos, procuram nobremente
beneficiar-me das mais diversas maneiras…
Neste tempo de movimentos caracoleantes
na “silly season” de fogos que nos perturbam ou empolgam e de outras
amenidades semelhantes, os nomes que cito – e que chegam até mim
interactivamente pela Net em e-mails não solicitados – divertem-me e até
me confortam, pois sou pessoa muito agradecida a este acervo de gente
que, não me conhecendo, busca contudo fazer de mim um homem de
quotidiano feliz e, presumo, de mais agradável perfil social.
Este Jolmar, que é certamente um médico
prodigioso, mediante sucessivas mensagens alerta-me para o facto de que
posso aumentar a tonelagem de certo órgão de que disponho para
diferentes utilizações anatómico-fisiológicas, qual delas a mais
agradável ou aliviante. E isto sem me ter observado in loco, o que diz
bem da sua competência profissional, maior no entanto que o seu grau de
previsão e conhecimento. Propõe-se também fornecer-me, por um preço
muito em conta, pequenos utensílios muito úteis em épocas de
superpovoamento. De passagem, caso não esteja interessado nesse
funcional produto, negociará comigo, em moldes extremamente vantajosos,
fotos de mui gratificante recorte confeccionadas nos entrepostos
adequados do multirracial Brasil.
Irene - por seu turno - que deve ser uma
jovem sincera e ternurenta a atender ao que reza na sua espevitada
publicidade - propõe-se ajudar-me a passar noites produtivas dum certo
ponto de vista em Copacabana e, se necessário, em Belo Horizonte – e sem
sequer precisar de sair do quarto e sem ter de estar a jogar primeiro à
bisca ou ao dominó.
Não é isto dum desvelo perfeitamente
comovedor?
E que dizer dos potenciais fornecedores
de automóveis topo de gama ao preço da uva mijona, dos agentes de
fenomenais casinos onde tudo é possível, dos especialistas honrados que
me tratarão da contabilidade ou da potencial calvície com toda a
competência e mansuetude? E que até me vão ensinar, se eu quiser,
judo-savate ou karaté com maviosas aplicações?
E das experts de antigos países de Leste
(a atender aos nomes característicos) que poderão fazer de mim um
felicíssimo cavalheiro por toda a santa vida, caso eu aceda em dar-lhes
o sim num qualquer cartório notarial? E o excelente gentleman que me
propõe a aquisição de alguns portentos de raça cavalar? E o vendedor de
vinhos de boa casta? E o das pulseiras e colares? E aquela que... Mas
basta de publicidade gratuita, por ora!
Obrigado Irene, obrigado Jolmar! Obrigado
a todos quantos se preocupam assim com a minha estabilidade terrena, com
o meu equilíbrio psicológico e com o bem-estar do meu agregado
biológico!
Há só um pequeno senão. Que lhes estraga
desde logo o(s) interessante(s) negócio(s).
É que, por questões de cepticismo
incontrolável, sou um péssimo utilizador de gestos samaritanos de tão
poderoso quilate.
E, ainda por cima, o que é bem pior – que
raiva e que desgosto! - o meu erário pessoal é mais ou menos tão pouco
portentoso como o do nosso bíblico velho amigo Job... |
3. AMÉRICA DE LUZES E SOMBRAS |
Para nós, amantes da
Literatura Policial, a América tem sido o país das mil-e-uma-noites:
nela brotaram flores de mistério e de maravilhoso, de mágoa e de
tragédia através dos dias e dos anos, plantadas por escritores e
visionários como Edgar Alan Poe, H.P.Lovecraft, Dashiel Hammett, August
Derleth, Raymond Chandler, Charles Williams, William Faulkner, Melville
Davison Post e tantos outros.
A América atravessámo-la
nós com os vagabundos de Frank Gruber, com os “road runners” de
W.R.Burnett. Contemplámos as vertentes do Ohio e os arranha-céus de Nova
Iorque e Chicago até às montanhas do Colorado e aos desertos do Arizona
e do Novo Máxico com Bill Ballinger, Hammond Hines, Burt Spicer e Jim
Thompson. Excursionámos pelas vilórias e pelas pequenas cidades do
Midlle West com Ellery Queen e Ray Bradbury, perdêmo-nos nas alfurjas
dos portos e nos “fumoirs” de Chinatown e da Bowery com Craig Rice,
Thomas Burke e um certo chinês filósofo de bigode a quem chamavam
Charlie Chan e que estava ali de passagem vindo da sua ensolarada
Honolulu.
Numa certa noite de
neve, sob a lua da Carolina do Norte, ouvimos tiros na estrada deserta
por onde minutos antes haviam passado Bruce Robinson e Jonatham Latimer,
que nos esclareceram o enredo.
Amámos e padecemos em
quartos e em caves, de mãos atadas atrás das costas pelos “gangsters” de
serviço. E fomos salvos “in extremis”, com o fato rasgado e o nariz
deitado abaixo, por um tal Mickey Spillane e pelo seu amigo dilecto Mike
Hammer. A iluminação brotou-nos da mente num momento de sagacidade
perpetrada por um fulano que atendia pelo nome de Philip Marlowe. E foi
homem a homem que derrotámos o mafioso crápula pseudo político que nos
envinagrava o quotidiano, devido aos sábios ensinamentos dum tipo
chamado Continental Op, em escaramuça devastadora numa viela do Bronx.
De manhãzinha, com o
nosso elegante fato cinzento de discreta risca azulada, entrámos num
palacete onde um ancião atormentado pela nostalgia nos pediu auxílio
para encontrar o genro e fomos catrapiscados por uma “mulher fatal” que
nos lançou na senda da aventura. De outra vez, acompanhando um
sofisticado cavalheiro conhecedor de arte assíria e etrusca que nos
disse chamar-se Philo Vance, tivemos a dita de nos introduzirmos nos
ricos salões de Nova Inglaterra e de Manhattan e, em troca, de juntura
com um tal Humphrey Bogart, levámo-lo até aos confins do Colorado, até à
High Sierra, e aprendêmos a beber uns valentes “bourbons” sem ficarmos
caídos de caixão à cova.
Com um jurista
desembaraçado que nos disse apelidar-se Perry Mason, jornadeámos pelas
artérias de Los Angeles e pelos desertos da Califórnia em busca de
assassinos nefandos.
Ouvimos muitas vezes o
bramir dos ventos, sentimos na pele o negrume das noites e a chicotada
da chuva inclemente, enquanto – dissimulados a uma esquina, com a gola
da clássica gabardina levantada – esperávamos a chegada dum companheiro
empregado na mesma agência que se chamava Caution, Lemmy Caution e que
era pai dum tal James Bond.
Tudo isto sentímos nessa
América onde havia e há problemas e conflitos não resolvidos, mas onde
também sempre houve esperança e alegria devido a umas coisinhas
simples, mas espantosamente importantes, que dão pelo nome de liberdade
de palavra, de reunião, de pensamento e da sua divulgação não obrigada a
mote, como sucede hoje em muitos sítios supostamente civilizados.
E, agora que se tornou
moda ou característica pôr-se sistematicamente em equação essa América
(toda a América?!) como símbolo do mal e da desgraça - principalmente
para se sentir melhor a nostalgia dum Leste implodido e de novos
bárbaros a quem se santifica como mártires - lembremo-nos de todos os
mosaicos intemporais que ela criou através de membros humildes ou
repletos de cultura viva que, hoje por hoje e amanhã por amanhã, se
calhar só serão epigrafados e em altas vozes se, de novo, tiverem de dar
a vida como em 39-45 para continuarmos a disfrutar de um pouco de futuro
possível.
(Comunicação
aos encontros de literatura policial de Vilalba) |
4. EM TORNO DE JULHO |
Julho é o mês da sétima lunação. No céu
desafogado de Verão os planetas de mais larga translação quase se palpam
no azul sedento do crepúsculo ou ao entrar da noitinha. Há no ar sons
distantes de sinos, sons esparsos de aves e de animais enquanto os
minutos correm como ecos longínquos no arfar da ramaria, no silencio
fremente das casas.
Em Julho o campo e o mar são como um
grande segredo inolvidável.
Julho é um mês ardente e mágico,
palpitante e solitário que ainda guarda nas suas horas lentas o
prestígio dos tempos idos em que não se sobrepunha o signo à coisa
significada, os tempos quase inocentes em que a brutalidade e a manha
não eram apenas uma nótula ou um excerto assinalando sem estranheza que
este Mundo vai andando de cabeça e coração como se fossem objectos
postiços de cartão ou madeira negra. Noutro contexto civilizacional,
Julho era o mês em que os egípcios glorificavam Osíris e a sua corte de
divindades menores, em que os gregos mais visitavam a pitonisa de
Delfos, em que os dogons do Sudão se juntavam nos bosques à entrada da
noite soberana para falarem na sua linguagem secreta, tão misteriosa e
interdita que só aos iniciados e aos arcanos se podia dirigir. Era em
Julho que nos montes de Palenque os ferozes deuses mexicanos se
apaziguavam: virados para a constelação das Plêiades, coroados de penas
de condor e de flores zapotecas, os sacerdotes quíchuas soltavam o seu
intermitente grito de saudação misturado com o trilo das flautas.
Era em Julho que na Lusitânia, nas pedras
de granito talhado dos campos de carvalhos, nas arribanas e nos casais,
tudo se começava a preparar para receber depois a uva sangrenta geradora
de maravilhas.
Mas Julho é também, a par do calor que o fundamenta, um mês claro e
alegre, pleno de tranquilidade e gentilezas: a fruta é em Julho
sumarenta e refrescante, viva e generosa como a própria poesia da
natureza em volta. Há o figo e a melancia, o pêssego e o abrunho - que
são frutos amáveis e solidários: o seu mistério se dissipa nas tardes de
gula, posto que o mistério persista, porque no coração vegetal há sempre
um minuto filho da terra trabalhada por muitas mãos calejadas, regada
por muitos suores, cerzida por muitas linhas de cansaço e solidão. Mas
quem humanamente se detém no gosto de devorar um figo luminoso numa
fresca manhã campestre?
Em Julho a noite cresce como a
tranquilidade no coração dos justos. E talvez, também, como o remorso,
como o travo azedo duma acerba incomodidade no estômago dos que têm ou
terão contas a prestar ao mundo e à consciência dos homens.
Mas Julho é igualmente o mês dos sonhos
longos e dos amores mortos e renascidos: a própria memória das coisas é
como um bicho entontecido num bosque, olhando febrilmente a penumbra
rente ao mar e à montanha, correndo como uma raposa acossada nos
caminhos pela trompa dos senhores de casaca vermelha que, na “pérfida
Albion”, se dedicam a estes mansos desportos que felizmente entre nós
não existem.
Em Julho a alegria é azul e a tristeza
cinzenta. E às vezes mudam devido ao rumor persistente das recordações.
Diz-nos o "Almanaque do Pensamento
Astrológico-Literário" que em Julho os luminares estão a vinte e seis
graus de Cancer, na terceira casa, o que prenuncia período favorável
para a agricultura, os negócios (da China?) e as representações
nacionais no estrangeiro. Os trígonos de Neptuno e Saturno indicam, não
obstante os bons presságios anteriores, dissensão nos meios políticos e
administrativos e a conjunção de Marte com Jupiter augura aumento de
renda nas repartições arrecadadoras do Governo, bem como
desenvolvimentos peculiares nas autarquias, no comércio e na indústria
com benéficos reflexos no exterior...
E por tudo isto se vê que Julho é também
um mês cheio de senso de humor, de ironia astrológica e de mansuetude
literária. E de perspicaz anotação política...
Por isso, agora que ele vai iniciar a sua
corrida ascendente, louvemos com galhardia o mês de Baco e de
Quetzalcoatl, o mês límpido dos grandes calores e das altas esperanças
humanas e lusitanas - que quase nunca, infelizmente, se realizam. |
5. SOBRE TRAVANCA REGO, A UM LUSTRO DO SEU FALECIMENTO |
a. Encontrei-me com J.O.Travanca-Rego,
pela primeira vez, no decorrer da inauguração duma exposição colectiva
de obras de alguns pintores alentejanos – uns vivos, outros já falecidos
– que organizei em Portalegre com o apoio do sector cultural dessa época
do município desta cidade.
Já de há certo tempo nos carteávamos.
Quem nos pôs em contacto foi o José do Carmo Francisco, que aliás me
mandara poemas dele para um suplemento elvense que então orientava, o
“Miradouro” do defunto Notícias de Elvas.
Assim que lhe li os versos de imediato me
dei conta que não estava ali uma voz de vulgar amenidade. O mesmo que
senti quando pela vida fora tenho estado a contas com outros autores que
muito estimo: ele sabia o que dizia, quando o dizia e como o dizia. Não
era (não é) e creio que não será por muitos anos e bons, um autor de
lugares simétricos carreados por um talento urbano e suave. Em
Travanca-Rego há o espanto, a garra, o meditar de muitos mistérios que
na poesia e pela poesia se consubstanciam. E, no entanto, existe
paralelamente uma harmonia que nos seus momentos mais altos nos comunica
a certeza de que no seu discurso, na sua linguagem, tudo faz o
verdadeiro sentido e é dotado de um padrão interior votado à permanência
no tempo.
“A pena valerá que mais palavras/
suportem a voz nua a (des)dizer-se/ como selámos todos – enigmáticos - /
uma dúvida perante o indizível?” diz-nos ele nos versos iniciais de
“Comunicação”, o terceiro poema do seu “Sinais: 15 poemas de sideração e
saudade”.
Siderado e saudoso do que não sabe
definitivamente, me parece ter sido o tónus poético deste autor.
Interrogativo e em certos casos crepuscular, em Travanca-Rego há como em
muitos outros – mas nele com a acuidade dolorosa que o seu passamento
veio confirmar – uma amargura filha dum espanto e duma melancolia
abertos à procura, contudo, de novos ritmos e da maneira de dizer mais
exacta, mais real e adequada aos diversos momentos daquilo que se sente
e por isso se descreve. Descrição, comunicação… No fundo, doação de
descobertas, de universos que se encontram no percurso que mal ou bem o
poeta efectua quotidianamente a despeito das suas mágoas e das suas
alegrias, ou para dizer doutra forma: os poemas que encontram a sua
existência nessa escrita que se fornece a todos para que a leiam e assim
revelem o mundo - que em todos vive, mas que o poeta encarnou.
Diz ele em “Ilha”, arrolado em “Cinco
Incisões”: “Deixa-me contar o tempo/ pelos nós dos dedos. Nesta ilha,/
nem estrelas nem uma árvore!”. Mas o poeta efectua a religação mediante
os poemas, as palavras que articula ainda que algo o destroce ou,
melhor, tente destroçar-lhe o sentido do que cria. Travanca-Rego, sendo
um autor de clara vocação lunar, nocturna e aforística, não se compraz
nesse mergulho, não se recreia na convulsão: o que ele tenta é
efectivamente encontrar uma medida para que esse caos seja reordenado e
se extinga como tal, passando para o lado solar das propostas de vida
plenamente erguida: “Grão de trigo,/ feitio de um ventre:/ Um planeta/
te habita?”, pergunta ele na primeira quadra do pequeno texto “Intimidade(s)”
de “Extracto sensitivo”. Ou seja: o universo contido num pequeno
elemento da vida vegetal, o que está no alto tornando-se igual ao que
está em baixo como na Tábua alquímica da tradição e da sageza.
Travanca-Rego soube pesquisar o mistério,
assim tentou devassar o segredo da esfinge. Perplexo ante os enigmas
cumpriu contudo a sua íntima tarefa, se alguma tem o poeta.
Pôde, portanto, afirmar num trecho do seu
“Sentido sexto”: “Onde habitasse o desespero alheio,/ deveria ter
construído a minha casa!/ - Onde habitasse um pássaro sem asas/ pedindo
uma árvore ou um veleiro ou/ pedindo simplesmente/ a mão do vento que
sob o seu corpo/ - a afogar-se de mágoa -,/ transformasse em Espaço/ o
seu canto em mágoas prisioneiro!”
E não é este, para um autor, um profundo
projecto de vida que completamente nos reivindica de pé perante a morte?
b. Durante os sete dias que antecederam o seu falecimento, Travanca-Rêgo
fez-me três telefonemas.
No último contacto que comigo
estabeleceu, dois dias antes de partir, pareceu-me deprimido, com algo
indefinível a limitar-lhe a comunicabilidade. Vinha perguntar-me se
recebera a carta contendo um poema para a antologia sobre Abril,
organizada por um confrade a quem servi de intermediário. Mostrava-se um
pouco ansioso, como se temesse que os irregulares e frequentemente
desrespeitadores correios lusitanos lhe frustrassem o intento.
Quando lhe referi que sim senhor,
recebera o envelope, que gostaria de o ver e, para o dispor melhor, me
dispunha mesmo a ir buscá-lo a Vila Boim, para em Arronches ou
Portalegre degustarmos umas especialidades da região e conversarmos até
às tantas, senti que se comovera. Respondeu-me, com um travo ameno na
voz, que teria muito gosto nisso, mas andava a sentir-se mal. Eram
incómodos no corpo e no espírito. Insisti em que o meu propósito,
francamente lho confessava, era contribuir para as suas melhoras. Estava
ele disposto a entrar nessa jornada? - tornei eu.
Em vão. Não que não lhe fosse agradável
tal passeio mas...não se sentia nada bem.
À guisa de consolo, intuí, informou-me
que estava praticamente pronta a estruturação do bloco específico que
seria inteiramente preenchido com poemas meus - a dar a lume na Revista
de Elvas, de propriedade municipal e que coordenava com Fernando
Guerreiro.
Recomendou-me com alguma insistência que
procurássemos que o poema saísse, quando saísse, sem quaisquer gralhas.
“É um poema complexo...Tem aquelas recorrências... Veja lá isso, está
bem?”.
Nos dois anteriores telefonemas
preocupara-se com o andamento do “Fanal”, o suplemento de que era
colaborador e que saíu durante três anos no “Distrito de Portalegre” e
que posteriormente, por constrangimento da administração, foi suprimido.
Informou-se também sobre o caso em que tivera parte, um processo contra
três difamadores que nos haviam enxovalhado numa folha portalegrense.
Dê-lhe a informação que me pedia,
tentando pelo meio alguma ironia fraternal.
A sua morte, comunicada de supetão, foi
para mim uma dolorosa surpresa. Lá o fui acompanhar ao cemitério de Vila
Boim.
Estava um dia de calor atabafante. O
ambiente, para além da tristeza habitual em ocasiões assim, era soturno
– um ambiente de pequena vila do Alentejo profundo e sem horizontes.
Durante vários dias aquelas horas que
constituíram os funerais do poeta pesaram em mim como algo de irreal e
de absolutamente não desentranhável. |
6. UM LONGO CHORO NA NOITE |
Chorar é transformar em lágrimas a
angústia, a solidão, o pavor. Chora-se por medo e até por alegria,
chora-se ao ver partir alguém que amamos, chora-se porque se partiu uma
perna, um objecto, um sentimento.
Diz-se que um homem não chora, mas há os
que sustentam que quem não pode chorar é já um autómato, um vago pedaço
de matéria inerte. Há choros legítimos e há os choros por moleza ou
frouxidão.
Há os que choram por dinheiro, por um
cargo, por uma carga de pancada. Há, também, os choros coloridos das
madamas que não pensaram a tempo que as lágrimas - que pena! - lhes
estragariam a maquilhagem.
Há o choro dos doentes e o choro dos
fracos, o choro dos canalhas e dos falsos - que é choro de crocodilo ou
de hiena. E há o choro infinito dos que morrem pouco a pouco e já nem
chorar podem.
Há o choro fácil das crianças, mas há
também o choro dramático das crianças.
Há no mundo um imenso choro de mágoa e de
agonia. E há o choro por um cisco que entrou num olho e magoa. E há,
ainda, o choro do chato, do palerma, do espertalhaço perdido. Do mestre
de falsas mestranças.
Há, portanto, choro para todas as estações da vida. Há quem chore,
igualmente, porque perdeu um combóio, uma viagem, um enredo.
Mas sim, há o choro devastador das
crianças: devastador, insustentável. Amargo.
Ontem, numa rua citadina, através duma
janela entreaberta chegou até mim o choro duma criança. Porque choraria?
Por nalgada paternal, por brinquedo estraçalhado? Eu levava um jornal na
mão, um desses de usança nacional. E nesse periódico, em certa página,
saltava para os olhos do leitor itinerante que sou por vezes a
fotografia macerada, absurda, de alguns justiçados numa rua dum país do
Oriente. O sangue corria pelas pedras da calçada, nessa terra longínqua.
Contava a legenda que alguns dos justiçados não tinham morrido com a
necessária presteza e fôra preciso que umas almas caridosas lhes dessem
o tiro de misericórdia.
Em volta, populares assistiam ao
acontecimento. E, entre eles, várias crianças.
Conheceriam as vítimas? Seriam vizinhos
seus, gentinha de ver na rua? Nos rostos dos que assistiam lia-se o
ódio, algum temor, o espanto. Teria havido algumas lágrimas?
Para o leitor itinerante que eu era
naquele momento o choro da tal criança foi-se esbatendo no vaivém da
rua. Apagou-se pouco a pouco, como uma ária negativa ao longe.
E dei comigo a pensar se aquelas crianças
da fotografia iriam chorar um dia ao recordarem o espectáculo a que
tinham assistido, espectáculo de morte e de sangue da absurda condição a
que alguns chamam humana. Se chorariam um choro sentido pela violência
presenciada, como tempos atrás nesse país afastado tinha decerto chorado
de dor a criança a quem a polícia política do mandante precedente
cortara a mão direita para dar exemplo aos seus pais, que não choravam
lágrimas de petróleo ou de ouro mas de raiva, de miséria, de revolta. De
pobreza e de queixume.
Há um longo choro na noite dos tempos. Um
choro que por vezes paira sobre os nossos olhos cansados de não chorar
por uma esperança de justiça que tarda a assentar arraiais neste
minúsculo pedaço do Universo vulgarmente chamado Terra.
E a que alguns, de olhos secos ou
húmidos, por vezes chamam vale de lágrimas... |
7. A PROPÓSITO DA CRÍTICA |
“A Crítica? Sim,
sei de quem se trata: é uma que
vai ali adiante, de vestido muito sujo e chapéu
às três pancadas”
John Buchan |
O assunto, mil vezes tratado de forma ora
desenfadada ora dramática, pode ser colocado sob que égide? A do apego à
decência, à verdade, à dignidade do que é viver, escrever, ser homem de
corpo inteiro e de cabeça bem levantada? Ou a do direito de informar e
ser informado de maneira cabal, verdadeira e não manipulatória, de
aceder à Cultura sem que os cínicos de sempre ponham imediatamente, ao
ouvirem tal palavra, o velho ar sofisticado de risota ou de fábula, como
os canalhas mediáticos usam fazer quando alguém cai na asneira, ou na
ingenuidade, de proferir a palavra honra?
Moderemos um pouco, digamos, a nossa
prosa ainda que nos excite alguma indignação. O assunto seria de facto
cómico se não fosse trágico. Ou antes: triste e equívoco. O problema é
que temos, talvez, a alma demasiado ardente, demasiado indagadora,
provavelmente mal adestrada para negócios escuros. Perdidos entre
esperanças e amores mortos - um deles a realidade, que já está mais que
apodrecida neste país - desejamos como que num desespero a alegria, a
verdade dos tempos recompostos, a beleza. Como aquele jovem e aquela
senhorita dos romances. Se calhar o problema é que de há muito o jogo,
le grand jeu, não é mais que uma imagem esfumada, um retrato
desaparecido, passos que se afastam na noite dura e adversa. A crítica?
Sim, sim, em geral uma excelente pendura...
No que me diz parte, estou de alma
branca: tenho tido razoáveis críticas, o que se chamam “boas críticas”
se não formos maliciosos, mal formados ou simplesmente difíceis de
contentar. Ou seja: na maior parte dos casos um bocadinho de açafrão, um
cheirinho de pimentão, um trago da “rija”. Resumindo: coisas que
fundamentam umas horas de prazer gastronómico. Não tenho pois de que me
queixar. O meu relativo desapego, a minha críptica olhadela é
inteiramente motivada por razões de mínima decência.
Vogamos em pleno oceano deserto. O da
poesia, o da escrita. As provisões começam a escassear, ao longe no
vasto mar não se distingue a brancura de uma vela, a nossa escuna
desapareceu e só dispomos deste pequeno bote. Nem se divisa o rasto de
um corsário de bons fígados, estamos entregues a nós mesmos. E no
entanto...
E no entanto, de súbito, como vinda dum
sonho, aparece uma linha de costa. Coragem, um esforço mais, chegámos a
terra firme. Eis-nos já na orla do bosque.
E então começam as realidades
inquestionáveis a deixar ver o seu perfil difuso, algo começa a
fermentar e sente-se que se juntaram sujeito e predicado em estranhos
conciliábulos, em frases de esquisitos recortes. Talvez não seja ainda o
“que horror!” de Margarita no livro de Bulgakov, mas é já decerto o “uns
belos trastes”, quiçá algo injusto, de Péret. Porque é difícil
divisar-lhe nos horizontes, a isso da crítica cá da nação, o sul e o
norte, a matéria provável e desejável de que seriam feitos os mais belos
sonhos de uma realidade não poluída.
A evidência, como se compreende, consiste
nisto: a crítica é, como dantes se dizia da tropa, o espelho do país. E
quase tudo daí decorre. E daí tudo parte: os críticos altissonantes e
vazios, mas palavrosos e espertalhões, iguais aos políticos e aos
filhos-de-algo vazios e altissonantes que nos arrasam a paciência com as
suas mentirolas e o seu arrazoado de vendedores de banha-da-cobra.. Os
que são competentes e modestos, como certos homens públicos sofredores e
esforçados, membros duma raça em vias de extinção na coisa quotidiana.
Há a crítica que se lê nos jornais.
Muitas vezes simples aparelho de aferição, mais ou menos galhardo ou
gaiteiro mas que podia ser - e nos melhores casos é - algo de
suscitador, de exaltante, de nobre e de digno que não envergonha quem a
lê e quem a escreve. Mas, em grande parte, trata-se de pequeninas traves
duma casa onde já se instalou o incêndio, cocabichices sobranceiras de
pequenos empafiados, ignorantes e patifórios nos casos limites. Em suma,
pedacinhos não inermes de alguma arrogância ou de seguro fingimento. A
sensação que se tem, frequentemente, é a de que se trata duma encenação
fraudulenta, duma espécie de jogatana para capangas dum milieu de bairro
de má fama revestido de ouropéis de pacotilha.
No entanto é amorável conseguirmos
distinguir nesse lume uma, ainda que transitória, iluminação. E por
vezes vê-se mesmo, distingue-se por detrás de algum constrangimento
(certas chefias têm um poder discricionário), traçado em dez ou vinte
linhas, o percurso justo e adequado do que uma obra é, do que
representa. Aqui e ali descortinam-se saberes e honestidades, o apego a
uma real descriptação duma caminhada, a adesão fremente a um futuro
verdadeiro e certo. Mas para estas pepitas, quanta ganga excrementícia,
quantos ademanes espúrios e quantas arlequinadas que nos fazem
enrubescer. E já não falo da pura ignorância, da pura desvergonha, da
pura falta de senso. Da pura – não tenhamos medo das palavras –
pesporrência e da simples e boa maldade.
Já que mo perguntam, o que é um crítico,
ou antes: o que devia ser? Tenho para mim que um ente que acredite
mesmo, co’a figura inteira, na sua actividade de guia bem informado, um
ente de boa-fé realmente empenhado em saber e em dar a saber aos outros
o que há por ali - por aquela poesia, aquela música, aquela pintura,
aquela prosa - que constitua tesouro, fruto e mistério encantador. Assim
como uma espécie de missão tranquila e honesta? E porque não? Nisto não
cabe nenhuma espécie de moralismo e sim de uma ética. Acaso o cinismo
espertalhaço e lusitano já retirou do nosso vocabulário (dizem-me do
lado que talvez sim) palavras como decência, saber, imaginação e outras
mais que não recordo ou simulo não recordar – porque têm a ver com a
honra de se existir, de se viver acima da lama, de se andar de rosto
erguido entre réprobos ou malandrins?
Críticos por dever de ofício? Sim, se
tiverem o fulgor de um Sainte-Beuve, de um Silone ou dum Claude Roy. Mas
triste mester, vergonhosa tarefa a de acatitar eventuais jogos de
editoras, de grupos de pressão, de castas sedimentadas num país de
tartufos. Valer-lhes-á a pena semelhante trabalho?
E há também a crítica encorpada em
livros, em cartapácios. E que é um gosto ler quando severa e
argumentada, feita por homens de uma só cara. E há alguns que a
praticam, parece que com um impulso vindo das tripas e das meninges.
Mesmo que, aqui e ali, pontapeado e ferido pelo mal de vivre da
sociedade portuguesa, que é uma coisa repelente e sinistra, tenaz como
aquelas sujeiras que se nos colam aos fundilhos.
Poucos são os exemplos, muitos os fados,
imensos os desvigamentos que os rodeiam. É assim de estranhar que alguns
próceres entreguem os pontos e se rendam à mundanidade trombeteada por
altifalantes de potente recorte? É que não pode ser por estupidez, pela
santa estupidez que nos fulmina. Ninguém pode ser tão tolo assim.
Sigamos, como dizia o “Garganta Funda” da película de Oliver Stone, a
pista da massinha e deixemo-nos de filosofias...”. Aí se encontrarão
muitas descriptações tendenciais.
Por outro lado, esse encordoamento, essas
“calosidades morais” a que Fitzgerald aludia, serão devidas a um tom
hirto de escola ou de vezo universitário? De novo, do lado, me dizem que
talvez sim, mas daí não viria mal ao mundo se os exemplos fossem
entusiasmantes e consistentes. Mas em geral são taciturnos e duram pouco
mais que a hora clássica das rosas do lírico francês. Quem pode, por
exemplo, ler hoje as obras pretéritas de um conhecido figurão mediático
sem um riso de escárnio, essas obras cobertas de citações, de espertezas
saloias, de frases esgalhadas apenas para abater o presumível
adversário? Para colocar no pequeno Olimpo deste triste parque
dormitando à beira-mar determinados vates que não podemos, apesar de com
carradas de razão, apelidar de poetinhas – que é o que eles são – sem
ficarmos passíveis de cadafalso?
No fundo, a nossa voz – se a pudéssemos
soltar – seria não mais que a voz pobre contra as vozes que sem cessar
rolam nomes pelas quebradas, pelos largos e praças, pelas tabernas do
reino onde se fazem reputações. Porque o penoso é também isto: a crítica
servir para fazer reputações...
Vejo na crítica - quero eu dizer,
gostaria de ver na crítica - uma ajuda real, inteligente e
despreconceituosa para entrarmos melhor nos universos propostos pelos
autores, sem facciosismos nem atitudes de baixa política. Para jogarmos
a dois, digamos, a aventura do conhecimento e, mais tarde, das linhas de
sombra da sabedoria possível. Para compulsarmos, talvez, numa casa
solitária, ante o espelho onde o Eterno parece que irá aparecer um dia,
o nosso próprio rosto, a nossa própria figura. Uma luz ardente que nos
devastasse o rosto com súbitos clarões, para que pudéssemos um dia
surgir com a verdadeira figura a que o nosso ter vivido, o nosso ir
vivendo com a escrita nos concederia direito.
E, afinal, o que visam oferecer-nos na
melhor das hipóteses é apenas um lugar numa espécie de campeonato de
competências...
Gostaria de dizer, a finalizar, que vivo
- por decisão do destino - afastado dos grandes meios lusitanos, que
aliás quase nunca visito. Habito lugares entre as serras
alto-alentejanas e os desertos do sul de Espanha. Aí tenho as minhas
casas, que são casas de dentro e de fora. Falo a partir do que me chega
em ondas, em revoadas trazidas pela voz de um amigo, por uma que outra
revista oferecida ou por vagos periódicos, uma vez que quase só leio
jornais espanhóis. Creio por isso que não conheço exaustivamente, in
loco, os exactos meandros do assunto que busquei abordar. O meu trabalho
profissional, específico, permite-me ir vivendo magnificamente isolado.
Não vejo a chamada televisão, que detesto, embora veja inúmeros filmes a
partir dos programas por cabo. Não frequento a sociedade, que aliás não
desprezo nem odeio, com os seus ritmos calhordas e de uma videirice a
toda a prova – os meus amigos são os minerais, os vegetais e os animais
a que, com os familiares de sangue ou de ritmo vital, estou ligado e que
me sustentam. O que intuo, entretanto, para além do que vou sabendo
intermitentemente, não é contudo de molde a tranquilizar-me. E isto
porque detesto a falsidade – nomeadamente a de um certo universo da
crítica que tenho por aproximativa ou pesporrente nos seus considerandos
pouco desembaraçados.
Aqui há dias, num periódico lido na casa
de um familiar, topei com a prosa de um fulano que dizia serem
“inanidades” os belos poemas de José Luís Puerto (que não conheço),
dados a lume na “Apeadeiro”. Comprovei ser este o estilo fuliginoso
usado em certos meios críticos. Que defesa haverá para uma opinião de
tal jaez? O vómito urbano desculpará ou explicará coisas assim?
No cartão onde cortêsmente me convidavam
a opinar, deram-me – como a todos – espaço até às trinta páginas. Nunca
poderia lá chegar. Tal como Marie Noel não sou uma árvore nem sequer,
talvez, uma planta útil. Estou sim ao lado da urze, do heléboro, do
serpão. Intelectualmente, não consigo viver em bosques tranquilos.
E, apesar de tudo, para minha alegria e
inquietação simultâneas o sol continua a brilhar sobre todas as coisas -
até sobre imundícies que alguns propagam. |
(Este texto foi a
resposta de NS ao inquérito temático formulado pela revista “Apeadeiro”)
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Nicolau Saião –
Monforte do Alentejo (Portalegre) 1946. É poeta, publicista,
actor-declamador e artista plástico.
Participou em
mostras de Arte Postal em países como Espanha, França, Itália,
Polónia, Brasil, Canadá, Estados Unidos e Austrália, além de ter
exposto individual e colectivamente em lugares como Lisboa, Paris,
Porto, Badajoz, Cáceres, Estremoz, Figueira da Foz, Almada, Tiblissi,
Sevilha, etc.
Em 1992 a
Associação Portuguesa de Escritores atribuiu o prémio
Revelação/Poesia ao seu livro “Os objectos inquietantes”. Autor
ainda de “Assembleia geral” (1990), “Passagem de nível”, teatro
(1992), “Flauta de Pan” (1998), “Os olhares perdidos” (2001), “O
desejo dança na poeira do tempo”, “Escrita e o seu contrário” (a
sair).
No Brasil foi
editada em finais de 2006 uma antologia da sua obra poética e
plástica (“Olhares perdidos”) organizada por Floriano Martins para a
Ed. Escrituras. Pela mão de António Cabrita saiu em Moçambique
(2008), “O armário de Midas”, estando para sair “Poemas dos quatro
cantos”(antologia).
Fez para a “Black Sun Editores” a primeira tradução mundial integral de “Os fungos de
Yuggoth” de H.P.Lovecraft (2002), que anotou, prefaciou e ilustrou,
o mesmo se dando com o livro do poeta brasileiro Renato Suttana
“Bichos” (2005).
Organizou,
coordenou e prefaciou a antologia internacional “Poetas na surrealidade em Estremoz” (2007) e co-organizou/prefaciou ”Na
Liberdade – poemas sobre o 25 de Abril”.
Tem colaborado em
espaços culturais de vários países: “DiVersos” (Bruxelas/Porto),
“Albatroz” (Paris), “Os arquivos de Renato Suttana”, “Agulha”,
Cronópios, “Jornal de Poesia”, “António Miranda” (Brasil), Mele (Honolulu),
“Bicicleta”, “Espacio/Espaço Escrito (Badajoz), “Bíblia”,
“Saudade”, “Callipolle”, “La Lupe”(Argentina) “A cidade”, “Petrínea”,
“Sílex”, “Colóquio Letras”, “Velocipédica Fundação”, “Jornal de
Poetas e Trovadores”, “A Xanela” (Betanzos), “Revista 365”,
“Laboratório de poéticas”(Brasil)...
Prefaciou os livros
“Fora de portas” de Carlos Garcia de Castro, “Mansões abandonadas”
de José do Carmo Francisco (Editorial Escrituras) e “Estravagários”
de Nuno Rebocho (Apenas Livros Editora).
Nos anos 90
orientou e dirigiu o suplemento literário “Miradouro”, saído no
“Notícias de Elvas”. Com João Garção e Ruy Ventura coordenou “Fanal”,
suplemento cultural publicado mensalmente no semanário alentejano ”O
Distrito de Portalegre”, de Março de 2000 a Julho de 2003.
Organizou, com
Mário Cesariny e C. Martins, a exposição “O Fantástico e o
Maravilhoso” (1984) e, com João Garção, a mostra de mail art
“O futebol” (1995).
Concebeu,
realizou e apresentou o programa radiofónico “Mapa de Viagens”, na
Rádio Portalegre (36 emissões) e está representado em antologias de
poesia e pintura. O cantor espanhol Miguel Naharro incluiu-o no
álbum “Canciones lusitanas”.
Até se aposentar
em 2005, foi durante 14 anos o responsável pelo Centro de Estudos
José Régio, na dependência do município de Portalegre.
É membro
honorário da Confraria dos Vinhos de Felgueiras. Em 1992 o município
da sua terra natal atribuiu-lhe o galardão de Cidadão Honorário e,
em 2001, a cidade de Portalegre comemorou os seus 30 anos de
actividade cívica e cultural outorgando-lhe a medalha de prata de
Mérito Municipal. |
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