BOCA VERMELHA, guerreiro das cordilheiras
cansado... Repousava adormecido sob o orvalho.
Abriram-lhe os olhos rubros raios solares,
aromas silvestres, canções da mata.
Era Cunhataí - trêmula - errante
das águas,
Envolta em folhagens, flores mas sem abrigo...
Cantou-lhe em voz alta e compassada,
uma canção de amor... Mas sem destino:
(porém ele nada dizia e tudo entendia)
- Desperta JURUPIRANGA !
Vem me ver que hoje acordei suada.
Benzo
com o sumo de minha rosa aberta, enamorada,
as manhãs de delírio, completamente cansada
Vem, que te sonhei a noite toda:
Puro, te revelando nas águas do Orenoco,
Sorrateiro, espreitando o massacre de Potosi
Vem, que te sonhei na noite pela PAZ
E teus dedos velozes, a guarânia, tocavam
as vitórias felizes do Império Inca.
Teu rosto estranhava a luz que me envolvia,
porque - recuperado - todo o estanho eu trazia.
Vem, que vou me pintar com urucum
Vou me encher de mil colares
pra te esperar pro ritual
Tenso
está meu corpo ofegante e
penso
no teu cheiro de homem,
no teu corpo de homem,
que me assanha e me esquenta.
Me senta a teu lado,
me toca c’oas mãos
poéticas, tão grandes e musicais
Me espera na hermosa Ponta Porã
E faz tua amante se sentir cunhã
Me roça
Me faz a palhoça
pra eu morar.
Me afoga em teus beijos,
teus quentes desejos
pra que eu veja
um pituã pra nos cantar
Me traz os teus cânticos
Me grita aos ouvidos
compõe a cantiga
que me faz tua AMIGA...
E te deitas em meu colo
que eu toda me enrolo
em teus cabelos românticos
Me aponta teus ventos brabos
de um país roubado,
de tanto sangue derramado,
chamando um xaxado
pro gozo de amar
Que vou bebendo
com muita cadência
o fogo que expele do teu olhar
E nesse momento teus beijos ardentes
explodem contentes
queimando meus lábios,
meus tão fartos lábios
que te fazem delirar
Ah!... Me traz teus quenachos
Pra que eu te dê meus penachos
Assim... Vou-te levando aos Tabajaras
Lá, dormiremos ao som das araras
testemunhando o amor, a oiticica sagrada.
E ungiremos com óleo todas as nossas feridas
Então, tomaremos o mel da manhã
pra que todos os antepassados renasçam
E olharemos pro céu do amanhã
pra que nossos filhos se elevem
e beberemos a água do carimã
pra suportar a dor da Nação acabada
E os POTIGUARAS, comedores de camarão
que HOJE - carentes
nos recomendarão a Tupã.
E te darão o anel do guerreiro - parceiro
E a mim?
Me darão a honra do Nome
A ESPERANÇA - meu homem!
De uma pátria sem fim
agora, chamego!
me cheira,
me faz um churrasco,
me dá chimarrão,
uma saia de chita,
mais um chocalho bonito
pra Zamacueca dos Andes
pro Toré do Sertão
Reparte essa carne-de-sol,
esse baião temperado
que eu tô danada assim...
de amor por esse diabo.
Me dá açaí geladinho
uma rede quentinha
pra nos sonhar agarrados
nas libertas Ilhas Galápagos
Mas Zanzo,
zonza,
ao som do zabumba
ao som das zampoñas,
sob o azul do Amazonas
Benzendo teu coração
Mas chora teu charango latino
tua lhama andina, pelos cantos da cidade,
pelas cidades sem flor
Chora meu ximango sofrido
Porque estou triste aqui.
E juntos, num só instante,
depois de tanto amor incessante
perceberemos INQUIETOS aqui,
o JURUPARIPINDÁ
a separar a todos os loucos Amantes. |
Eliane Potiguara
foi indicada em 2005 ao Projeto Internacional "Mil mulheres ao Prêmio
Nobel da Paz", é escritora, poeta, professora, formada em Letras (Português-Literatura)
e Educação, ascendência indígena Potiguara, brasileira, fundadora do
GRUMIN / Grupo Mulher-Educação Indígena. Membro do Inbrapi, Nearin,
Comitê Intertribal, Ashoka (empreendedores sociais), Associação pela
Paz, Cônsul de Poetas Del Mundo. Trabalhou pela Declaração Universal dos
Direitos Indígenas na ONU em Genebra. Seu último livro é “METADE CARA,
METADE MÁSCARA”, pela Global Editora. Ganhou o Prêmio do PEN CLUB da
Inglaterra e do Fundo Livre de Expressão, USA.
Site pessoal:
www.elianepotiguara.org.br
Institucional:
www.grumin.org.br
E-mail:
elianepotiguara@grumin.org.br |