SACERDOTE
Senhor, voltou o homem de Keriot.
ANÁS
Quem traz com ele?
SACERDOTE
Ninguém, senhor. Vem só.
ANÁS
Tens novas do Nazareno?
SACERDOTE
Dizem que Pilatos relutou em aprovar a sentença do Sinédrio. Lavou as mãos.
ANÁS
Pilatos não quis comprometer-se? Teria Caifás desconfiado?
SACERDOTE
Não creio, senhor. Caifás julga-se por demais inteligente e poderoso, e jamais pensaria que o quiseste enganar.
ANÁS
Onde está o Nazareno?
SACERDOTE
Está no caminho do Monte da Caveira, para ser crucificado.
ANÁS
Teria falado alguma coisa?
SACERDOTE
Não. Se tivesse, Pilatos já teria mandado soldados a tua casa.
ANÁS
Manda entrar, então, esse homem. (O Sacerdote dirige-se para a porta) Não. Espera. E se ele próprio falou?
SACERDOTE
Queres que o prenda?
ANÁS
Pensando bem, não há necessidade. Que mal pode fazer o cão ao leão que reina nas montanhas? Pilatos há de cair, como Copônio também caiu, e, atrás dele, irá Caifás. Júlio César, que era o senhor do mundo, não caiu? Manda entrar esse homem. Mas, depois, sai. Não convém que ele pense que o temo. Mas fica atento. (O Sacerdote introduz Judas e sai) Por que voltaste? Não sabes que te posso entregar a Pilatos?
JUDAS
Sei. Mas não me entregarás.
ANÁS
Como podes estar tão certo de uma coisa que desconheces?
JUDAS
Se me entregares, quem responderá pelo valor do meu silêncio? Ou julgas que Pilatos não sabe quem tu és?
ANÁS
Posso entregar-te a Caifás. Ele sabe quem tu és.
JUDAS
Se Caifás me quisesse, podia ter mandado prender-me em sua casa. Comparado contigo, eu nada valho para Roma.
ANÁS
Que me queres, então?
JUDAS
Nada. De ti nada mais quero.
ANÁS
Então, vai-te.
JUDAS
Vim pagar o que te devo.
ANÁS
Nada me deves. Regressa a Keriot e dá-te por satisfeito, se lá chegares. Por mim, espero que Israel possa esquecer o teu Messias e espere , em paz, o Messias verdadeiro.
JUDAS
Só há uma natureza e o homem não pode mudar a sua condição. Mas eu pergunto: Se tu podes ser como um cão, por que é que um cão não pode ser como tu? O meu erro não foi dar-te o direito de duvidares de mim. O meu erro foi deixar que agisses como se eu estivesse errado. (Joga a bolsa aos pés de Anás) Toma. Essa é a bolsa que me mandaste. Com ela compraste a liberdade de Israel e com ela hás de pagar aos exterminadores da nossa raça. Maldito sejas!
ANÁS
Guardas!
Entra o Sacerdote, correndo, com Dois Guardas.
SACERDOTE
Que desejas, senhor? (Anás aponta Judas) Queres que o prenda?
ANÁS (Ao mesmo tempo)
Leva este homem e que nunca mais entre nesta casa.
JUDAS
Fica tranqüilo, eu não voltarei. Não será necessário. O nosso próximo encontro já está marcado no inferno.
Sai Judas, acompanhado pelo Sacerdote e pelos Guardas. Anás apanha a bolsa do chão.
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